Faxina na Alma Carlos Drumond de Andrade
Turno à Janela do Apartamento
Silencioso cubo de treva:
um salto, e seria a morte.
Mas é apenas, sob o vento,
a integração da noite.
Nenhum pensamento de infância,
nem saudade nem vão propósito.
Somente a contemplação
de um mundo enorme e parado.
A soma da vida é nula.
Mas a vida tem tal poder:
na escuridão absoluta,
como líquido, circula.
Suicídio, riqueza ciência...
A alma severa se interroga
e logo se cala. E não sabe
se é noite, mar ou distância.
Triste farol da ilha rosa.
Amor
Amar pela segunda vez o que foi nosso é
tão surpreendente que constitui outra primeira vez.
Se há dois testamentos, o antigo e o novo, conviria instituir
um terceiro, para acabar com as contradições entre eles.
( In: O Avesso das Coisas - 6º Edição, 2007.)
Arquitetura
A arquitetura diverte-se projetando construções
para esconder os homens uns dos outros.
Foi-se a Copa? Não faz mal.
Adeus chutes e sistemas.
A gente pode, afinal,
cuidar de nossos problemas.
Faltou inflação de pontos?
Perdura a inflação de fato.
Deixaremos de ser tontos
se chutarmos no alvo exato.
O povo, noutro torneio,
havendo tenacidade,
ganhará, rijo, e de cheio,
A Copa da Liberdade.
Meu amigo, vamos sofrer,
vamos beber, vamos ler jornal,
vamos dizer que a vida é ruim,
meu amigo, vamos sofrer.
Vamos fazer um poema
ou qualquer outra besteira.
Fitar por exemplo uma estrela
por muito tempo, muito tempo
e dar um suspiro fundo
ou qualquer outra besteira.
Vamos beber uísque, vamos
beber cerveja preta e barata,
beber, gritar e morrer,
ou, quem sabe? beber apenas.
É preciso regar as flores sobre o jazigo de amizades extintas.
Passagem do ano
Passagem
O último dia do ano
não é o último dia do tempo.
Outros dias virão
e novas coxas e ventres te comunicarão o calor da vida.
Beijarás bocas, rasgarás papéis,
farás viagens e tantas celebrações
de aniversário, formatura, promoção, glória, doce morte com sinfonia e coral,
que o tempo ficará repleto e não ouvirás o clamor,
os irreparáveis uivos
do lobo, na solidão.
O último dia do tempo
não é o último dia de tudo.
Fica sempre uma franja de vida
onde se sentam dois homens.
Um homem e seu contrário,
uma mulher e seu pé,
um corpo e sua memória,
um olho e seu brilho,
uma voz e seu eco,
e quem sabe até se Deus…
Recebe com simplicidade este presente do acaso.
Mereceste viver mais um ano.
Desejarias viver sempre e esgotar a borra dos séculos.
Teu pai morreu, teu avô também.
Em ti mesmo muita coisa já expirou, outras espreitam a morte,
mas estás vivo. Ainda uma vez estás vivo,
e de copo na mão
esperas amanhecer.
O recurso de se embriagar.
O recurso da dança e do grito,
o recurso da bola colorida,
o recurso de Kant e da poesia,
todos eles… e nenhum resolve.
Surge a manhã de um novo ano.
As coisas estão limpas, ordenadas.
O corpo gasto renova-se em espuma.
Todos os sentidos alerta funcionam.
A boca está comendo vida.
A boca está entupida de vida.
A vida escorre da boca,
lambuza as mãos, a calçada.
A vida é gorda, oleosa, mortal, sub-reptícia.
Às vezes somos possuídos por uma sensação de tristeza que não conseguimos controlar,
dizia ele. Percebemos que o instante mágico daquele dia passou, e nada fizemos. Então,
a vida esconde sua magia e a sua arte.
Existem muitas maneiras de se cometer suicídio. Os que tentam matar o corpo ofendem a lei de
Deus. Os que tentam matar a alma também ofendem a lei de Deus, embora seu crime seja menos
visível aos olhos do homem.
Aquele que é sábio, só é sábio porque ama. E aquele que é tolo, só é tolo porque pensa que pode entender
o amor
O amor é cheio de armadilhas. Quando quer se manifestar, mostra apenas a sua luz – e não nos permite ver as sombras
que esta luz provoca.
“Ridículo”, penso comigo mesma. “Não existe nada mais profundo que o amor. Nos contos infantis, as princesas beijam os sapos e eles se transformam em príncipes. Na vida real, as princesas beijam os príncipes e eles se
transformam em sapos.”
– Certas pessoas vivem brigadas com alguém, brigadas consigo mesmas,
brigadas com a vida. Então, elas começam a criar uma espécie de peça
de teatro na cabeça delas, e escrevem o roteiro de acordo com suas frustrações.
– Eu conheço muita gente assim. Sei do que está falando.
– O pior, porém, é que elas não podem representar esta peça de teatro
sozinhas – continua. – Então começam a convocar outros atores.
...
“A agressividade deste senhor era visível, foi fácil evitar que contracenássemos.
Outras pessoas, entretanto, nos ‘convocam’ quando começam a se comportar como vítimas, reclamando das injustiças da vida, pedindo para que a gente concorde, dê conselhos, participe.”
...
– Cuidado – disse. – Quando se entra neste jogo, sempre se sai perdendo.
E admiro a luta que está travando contra seu coração.
– Um sujeito encontra um velho amigo – que vive tentando acertar na vida, sem resultado. “Vou ter que dar uns trocados para ele”, pensa. Acontece que, naquela noite, descobre
que seu velho amigo está rico, e veio pagar todas as dívidas que havia contraído no decorrer dos anos.
Vão até um bar que costumavam freqüentar juntos, e ele paga a bebida de todos. Quando lhe indagam a razão de tanto êxito, responde que até dias atrás estava vivendo o Outro.
– O que é o Outro? – perguntam.
– O Outro é aquele que me ensinaram a ser, mas que não sou eu. O Outro acredita que a obrigação do homem é passar a vida inteira pensando em como juntar dinheiro para não morrer de fome quando ficar velho. Tanto pensa, e tanto faz planos, que só descobre que está vivo quando seus dias na Terra estão quase terminando. Mas aí é tarde demais.
– E você, quem é?
– Eu sou o que qualquer um de nós é, se escutar seu coração. Uma pessoa que se deslumbra diante do mistério da vida, que está aberta aos milagres, que sente alegria e entusiasmo pelo que faz. Só que o Outro, com medo de decepcionar-se, não me deixava agir.
– Mas existe sofrimento – dizem as pessoas no bar.
– Existem derrotas. Mas ninguém escapa delas. Por isso, é melhor perder alguns combates na luta por seus sonhos que ser derrotado sem sequer saber por que você está lutando.
– Só isto? – perguntam as pessoas no bar.
– Sim. Quando descobri isto, acordei decidido a ser o que realmente sempre desejei. O Outro ficou ali, no meu quarto, me olhando, mas não o deixei mais entrar – embora tenha procurado me assustar algumas vezes, me alertando para os riscos de não pensar no futuro.
“A partir do momento em que expulsei o Outro da minha vida, a energia Divina operou seus milagres.”
– Já amei antes.
Amar é como uma droga. No começo vem a sensação de euforia,
de total entrega. Depois, no dia seguinte, você quer mais.
Ainda não se viciou, mas gostou da sensação, e acha que
pode mantê-la sob controle. Pensa na pessoa amada durante
dois minutos e esquece por três horas.
“Mas aos poucos, você se acostuma com aquela pessoa, e passa a
depender completamente dela. Então pensa por três horas, e esquece
por dois minutos. Se ela não está perto, você experimenta as mesmas
sensações que os viciados têm quando não conseguem a droga. Neste momento,
assim como os viciados roubam e se humilham para conseguir o que precisam,
você está disposto a fazer qualquer coisa pelo amor.”
a Verdade sempre está onde existe a Fé.
“Se a dor tiver que vir, que venha rápido”, eu disse. “Porque tenho uma vida pela frente, e preciso usá-la da melhor maneira possível. Se ele tem que fazer alguma escolha, que faça logo. Então eu o espero. Ou o esqueço.
“Esperar dói. Esquecer dói. Mas não saber que decisão tomar é o pior dos sofrimentos.”
Durante anos eu lutara contra meu coração, porque tinha medo da tristeza,
do sofrimento, do abandono. Sempre soubera que o verdadeiro amor
estava acima de tudo isto, e que era melhor morrer do que deixar de amar.
Mas achava que apenas os outros tinham coragem.
E agora, neste momento, descobria que eu também era capaz.
Mesmo que significasse partida, solidão, tristeza,
o amor valia cada centavo do seu preço.
– Você acha que vai chegar o momento certo? – perguntou.
Eu sabia do que estava falando. Levantei, e fui sentar-me na beira de sua cama.
A brasa do cigarro iluminava seu rosto de vez em quando. Ele segurou minha mão, e estivemos assim por alguns instantes. Então acariciei seus cabelos.
– Você não devia perguntar – respondi.
– O amor não faz muitas perguntas, porque,
se começamos a pensar, começamos a ter medo.
É um medo inexplicável, nem adianta tentar traduzi-lo em palavras.
“Pode ser o medo de ser desprezada, de não ser aceita,
de quebrar o encanto. Parece ridículo, mas é assim. Por
isso não se pergunta – se faz. Como você mesmo já disse
tantas vezes, se correm os riscos.”
– Eu sei. Nunca perguntei antes.
– Você já tem meu coração – respondi, fingindo não haver
escutado suas palavras. – Amanhã pode partir, e lembraremos
sempre o milagre destes dias; o amor romântico, a possibilidade, o sonho.
“Mas eu acho que Deus, em sua Infinita sabedoria, escondeu o
Inferno no meio do Paraíso. Para que estivéssemos sempre atentos.
Para não nos deixar esquecer da coluna do Rigor enquanto vivemos a alegria da Misericórdia.
Eu estava surpresa com o que havia dito. Mas, se você aceita que sabe, termina realmente sabendo.
O amor sempre faz besteiras...
sonhos dao trabalho...
- Não preciso de dinheiro. Ele deixa as pessoas cautelosas.
- Por favor, Alex. É preciso ter alguma cautela. Esse seu livro é legal e tal, mas não dá para viver só de folhas e frutos silvestres.
- Não sei se você deve depender de muito mais do que isso.
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