Coleção pessoal de tamara_guglielmi
Versos de Mim
Se eu pudesse viver uma vida em um só dia,
eu viveria mil existências em cada amanhecer.
Sou o tudo e o nada.
A plenitude e o vazio.
Não habito o passado,
não espero promessas do porvir —
vivo o agora como quem beija o instante.
Sou tristeza em forma de silêncio,
sou alegria em forma de tempestade.
Sou cada emoção à flor da pele.
Não me basta ser o que sou —
sigo em busca do que ainda posso me tornar.
Sou estiagem quando o mundo exige pausa,
sou tormenta quando o peito transborda.
Minha alma não se acomoda em metades:
não aceito histórias incompletas,
finais morrentes,
sorrisos contidos.
Trabalhar pouco, dançar pouco, amar pouco...
isso não me cabe.
Eu sou intensidade —
e só sei viver em excesso.
Não creio em sucesso sem suor,
nem em fortuna sem caminho.
Conquistas, para mim, têm preço.
E eu pago — com coragem.
Sou extremos.
Sou mistério e revelação.
Criatura e criadora do caos e da calmaria.
Aos meus amigos, dou-me inteira.
A eles dedico o que há de mais puro:
meu amor leal, minha presença fiel,
minha alma em celebração ao afeto.
Desejo sua felicidade como extensão da minha.
E me alegro — de verdade —
por vê-los sorrir.
Quando amo, sou céu e abismo.
Sou milagre e tempestade.
Quem me ama, jamais me esquece:
meu amor não se aprende em livro —
ele se sente com o corpo inteiro.
Sou mar sereno,
mas basta um sopro de dor
e posso me tornar onda que arrasta o mundo.
Sou idealista —
prefiro morrer de pé por aquilo em que creio
do que viver ajoelhada diante do que não faz sentido.
Se me fosse dada a escolha,
seria mártir da minha verdade,
nunca cúmplice da covardia.
Não fui feita para o morno, para o meio,
para o quase.
Sou intensidade em estado bruto:
muito mais ou muito menos,
mas nunca menos do que sou.
E quando fujo de mim,
quando esqueço o que sou,
é a noite — com sua voz de vento —
quem me lembra:
"É no teu esquecimento de si
que mais profundamente te permites existir."
SETEMBRO DE 83
O inverno passou.
Finalmente setembro chegou
e o mundo parou apenas para ouvir a magia
ocasionada pela melodia de 83.
Eu me lembro que naquela manhã,
setembro, a primavera chegou sorrindo,
avistou, no despertar do dia,
o amor de uma mãe que concebia
aquele que seria a sua eterna melodia.
A primavera passou,
mas a melodia ficou
e encantou todas as demais estações,
provocou em todas elas as mais latentes emoções.
Depois de setembro de 1983
os pássaros já não mais se assustavam com os raios do sol,
com as tempestades de final da tarde
ocasionadas pelo fervor do verão,
apenas seguiam a canção.
Os pássaros já mais nada viam,
apenas voavam pelos céus encantados pela melodia,
pela sinfonia,
pela magia de setembro de 83.
As cores das flores no outono se modificaram
depois daquele setembro.
Os girasois refletiam pontos de sol no horizonte.
As Orquídeas brancas
pareciam pombas presas ao solo.
As rosas vermelhas eram como corações ardentes de paixão.
O verde das folhas tinha a mesma forma das gotas de orvalho.
O canteiro de Tulipas amarelas, vermelhas e liláses
formava um arco Iris fincado à terra.
O outono passou,
o inverno chegou,
mas a sinfonia de setembro ficou e aqueceu aquela mãe
que sorrindo alimentava a melodia
que para sempre seria o seu grande esplendor.
A primavera voltou,
setembro retornou com ela,
mas desta vez algo havia mudado,
sim havia,
ocorre que a melodia havia se apaixonado pela fantasia,
razão pela qual partiu e ninguém viu.
O mundo inteiro então se espantou
e em prantos se calou,
pois ninguém,
nem mesmo o vento cantou,
infelizmente a Melodia jamais voltou.
A primavera então ordenou que setembro
voltasse a reproduzir aquela canção,
mas o que a estação não sabia
é que nem mesmo o tempo,
quem derá setembro conseguiria reproduzir a melodia,
que nasceu daquela mãe, naquela manhã, no dia 01 de setembro .