Coleção pessoal de EricJoLopes

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⁠A sina do palhaço
é deixar o sorriso no rosto
enquanto o mundo pega fogo

Fazer rir
mesmo que em seu mundo
tudo esteja se desmoronando

Deixar que pensem
que se apresenta em todos os picadeiros
enquanto na verdade
já se aposentou faz tempo

⁠Amor próprio
É gás em balão
É ar em bexiga
É asa de cera

Tem que dosar
Pra não se perder
Pra não estourar
Pra não derreter

Não precisa ter medo
Continue enchendo
Continue soprando
Continue batendo

E com atenção
Voar sem desatino
Alegrar os meninos
Pousar em seu destino

⁠E a raposa?
Que quando por ti cativada
Das outras cem mil é diferenciada
Torna-se única ao seu olhar

Campos de trigo?
Se enchem de magia
Lhes tiraram a monotonia
Pois de você a faz lembrar

Os meus passos?
Diferenciam-se dos caçadores
Já que esses não trazem dores
Só melodia a se seguir

Se vou as quatro?
Desde as três, felicidade
Sobra tempo na animosidade
Pra arrumar o coração

Não fica triste?
Se de súbito for embora
Mas o tempo que dedicaste até agora
Já faz dela única pra ti

Do que devo lembrar?
De olhar com o coração
Esquecer nossa visão
Pra enxergar o essencial

⁠Existem servidões que desejamos
Vitórias que não ganhamos
E sim, perdemos
Nos perdendo
Até achar
Outra alma capaz de nos redimir

⁠Por mais injusta
Que seja a justa
Se justa a causa for
Justifica-se a luta

Pois há glória no combate
E honra em quem bate
Em retirada
Como quem bate as asas
De um lugar que não vale a pena estar

⁠Orbitando em seu olhar
Fico sempre à vontade
Sem imaginar a gravidade
Enquanto vou perdendo o ar

Olho para todos os lados
Vejo planetas acorrentados
Satélites a muito apagados
Sem estrelas pra iluminar

Quem bagunçou tudo aqui dentro
Já não visita faz um tempo
Deu anéis sem cabimento
Fez Saturno se apertar

Peço então estrela cadente
Farei tudo diferente
Porei luz nesse ambiente
Só me deixe respirar

⁠Para onde você vai?
Disse o bobo apaixonado
Ela olhando para o lado
Apontou a direção

Mas eu vou pro lado oposto!
Disse o bobo encantado
Mas não tem nada de errado
Disse a moça a enrubescer

Mas por que não vem comigo?
Disse o bobo pensativo
Tem alguém a me esperar
Os olhos da moça a marejar

Então quer que eu desista?
Disse o bobo paralisado
Se já escolheu o seu lado
O que essa moça pode fazer?

Achei que também tinha escolhido
Disse o bobo arrependido
E a moça ao pé do ouvido
Se tiver coragem, vou contigo

Se afogando em liberdade
Vivia o bobo na verdade
E presa em sua própria realidade
Sorria a moça pra se consolar

⁠Trevos só trazem sorte com quatro folhas
O resto não passam de plantas
Verdes onde o meu sol aquece
Mortas onde o meu eu floresce

Há quem insista em procurá-los
E quem desistiu de encontrá-los
Mas, que permaneça a razão
Aceite os de quatro, os de três não!

⁠O PEQUENO POLEGAR

Havia um par de botas
Mas não um par comum
Serviam pra toda a gente
Cabiam em qualquer um

Não eram botas surradas
Nem tampouco elegantes
Enfeitiçadas pelas fadas
Guardadas pelos gigantes

Basta saber aonde ir
Essas botas não dão trégua
Botas rápidas feito o vento
As botas de sete léguas

Um grande bruxo as possuía
Até alguém dele roubar
O mais jovem de sete irmãos
O pequeno polegar

Abandonados pelos pais
Pois não tinham o que comer
Na floresta foram largados
Tinham mais chances de viver

Com as botas de sete léguas
Já não havia choro
Enganaram o velho bruxo
Levaram todo o seu ouro

Mas o bruxo era malvado
Se isso serve de consolo
Acharam o caminho de casa
Dividiram o seu tesouro

E não há quem não conheça
Aqui ou em qualquer lugar
Terror dos bruxos e dos gigantes
O pequeno polegar⁠!

DIÁRIO DE UM ALMIRANTE⁠

Da nostalgia do último sopro
vive as apagadas velas
dessa pobre embarcação
Veste luto na bandeira
e pelas águas que vagueia
traz pesar em seu timão
Por ironia do destino
viu a frota naufragar
Por que só os meu amigos
falta água nesse mar?
Não restaram dias de glória
navegando essa memória
até Netuno apagar

DEVANEIO ETÉREO

Domando dragões celestes
Viajo de planeta em planeta
Ouvindo cantos de sereias
Solitárias em suas pedras
Temendo qualquer balanço
Que a lua cheia ouse fazer
No seu imenso mar de solidão
Onde o sol navega apagado
Tendo a tristeza ao seu lado
Feliz pela morna companhia

FADA PLUMINHA

Por onde anda seu marido?
Já não tinha mais o que ver
Caminhou por uma linda estrada
partiu, cessou de viver

O homem, foi honrado
quando em vida, sempre humilde
Sua esposa não deixou só
a bruxa, viúva, Matilde

Era mãe de duas filhas
amor pra uma, pra outra nada
Assim vivia a filha Clotilde
e Florença, a enteada

Pra Florença, só trabalho
apesar de seu esforço
Pra legítima, preguiçosa
deseja um belo moço

A beira de um fonte
Florença sempre ia fiar
Após um súbito cansaço
na água o fuso foi parar

E agora, o que eu faço?
Pensou Florença assustada
Se eu volto sem o fuso
Matilde fica revoltada!

Se esforçou para pegar
mas na fonte ela caiu
Muita água, pouco ar
desmaiou de tanto frio

Em um jardim maravilhoso
a jovem moça despertou
Vou fazer um ramalhete
a primeira coisa que pensou

Ao andar pelo jardim
escutou com atenção
A voz vinha de um forno
quem falava era o pão

- Florença, me tire daqui e me coma
será uma satisfação!
- Se demorar mais um minuto
virarei um pobre carvão

A menina agiu rápido
comeu o pão, não deu bobeira
Eis que surge uma outra voz
dessa vez, a macieira

- Colha aqui minhas maçãs
sei que devo merecer
- Estão maduras e pesam muito
não prestarão se apodrecer

Sem se quer pestanejar
atendeu e nada mais
Colheu todas e comeu algumas
dividiu com os animais

Continuou a caminhar
e encontrou uma velhinha
Se tratava de uma fada
a velha, fada Pluminha

A fada sacudia os travesseiros
e caia neve de verdade
Mas a força pra sacudir
se perdia com a idade

Vendo o esforço da senhora
se ofereceu pra ajudar
E na casa da velha fada
por um período foi ficar

O tempo foi passando
Florença não precisava mais de explicação
Fazia todos os afazeres
no sorriso, satisfação

Abriu os travesseiros na janela
e na chegada do inverno profundo
Sacudiu os travesseiros
e fez nevar em todo o mundo

Veio então a primavera
mas era chagada a hora
Com a benção da velha fada
se aprontou e foi embora

- Espere minha querida
sei que parece clichê
-Eu achei isso no lago
acho que pertence a você

Agradecida pegou seu fuso
e voltou sem acreditar
Mas no meio do caminho
seu vestido sentiu pesar

Olhando para suas vestes
se deparou com um tesouro
Viu os trapos que vestia
se transformar em puro ouro

Chegando em sua casa
contou o que aconteceu
Sua irmã e sua madrasta
do coração quase morreu

Se o que dizes é verdade
também posso conseguir
E os passos da meia-irmã
Clotilde decidiu seguir

Foi na fonte, jogou o fuso
fingiu até se afogar
Acordou em um jardim
soube que era o lugar

Viu o pão pedir ajuda
deixou que virasse carvão
Disse a pobre macieira
- Seus frutos apodrecerão!

Entrou na casa da velha fada
mas nunca quis ajudar
E nesse ano o inverno
nem se quer ousou nevar

É chegada a primavera
a moça decidiu partir
Vou ganhar o meu vestido
pela porta vou sair

No caminho olhou pra roupa
estava da cor do azeviche
E pela sua ingratidão
recebeu todo aquele piche

Antes que Clotilde voltasse
com seu vestido divino
Florença saiu de casa
era dona do seu destino

O APRENDIZ DE FEITICEIRO

Devorador gentil
de livros embebidos em saber
Já não existe nesse casa
coisa nova para ler?

Procurou por um ofício
que sustentasse esse seu vício
E em uma loja de livros
decidiu trabalhar

- Pode me chamar de mestre
dizia o seu patrão
- E se já quer começar
então comece pelo chão!

- Posso ler o que quiser
se for rápido como um coelho?
- Pode ler o que quiser
menos o livro vermelho!

Aceitou sinceramente
ficar longe do livro carmesim
Mas quando o Mestre saiu
sabes que não foi bem assim

De pronto leu a capa
"Manual do feiticeiro"
- Vou conquistar a fama
fama pelo mundo inteiro!

- Aqui aprendo feitiços
feitiços de transformação
- Posso ser o que quiser
águia, cavalo, dragão!

Decidiu voltar pra casa
e testar o que na cabeça vinha
- Eu tenho o que não tinha
agora sou uma andorinha!

Entrou em casa pela janela
com o livro em desatino
- Adeus meu bico fino
agora sou um menino!

Mostrou o livro ao pai
e disse que tinha um plano
- Agora ficamos ricos
com a arte do engano!

- Vou virar um boi bem gordo
o senhor vende na feira
- Depois de um tempo eu volto
então deixe de besteira!

- Mas é preciso amarrar esse lacinho
tire sempre que me vender
- Assim eu volto a ser humano
e o senhor vai me reconhecer

- Na feira tudo deu certo
tirou laço e me vendeu
- Depois voltei a ser humano
o comprador nem percebeu

- Amanhã serei um cavalo
seguimos com nosso plano
- Não esqueça dessa fita
ainda quero ser humano

No dia seguinte
o cavalo estava lá
E na feira da cidade
o seu Mestre quis lhe comprar

Ofereceu muito dinheiro
pediu que deixasse o laço
Aceitando a condição
No cavalo deu um abraço

- Acho que mesmo com o laço
ele consegue se safar
Mas para a tristeza do pai
o garoto demorou a voltar

O mestre de tudo sabia
manteve o cavalo em sua estrebaria
Enquanto o menino aprisionado
pensava no que fazia

Por ironia do destino
um garotinho ali passou
Viu a fita no cavalo
e então desamarrou

Virou logo uma andorinha
cheia de satisfação
Mas o Mestre bem espertou
virou um grande gavião

Na fuga, por cima do jardim
avistou um princesa do dossel
- Chega de ave no céu
agora sou um anel!

Ao cair das alturas
no colo da princesa
O gavião agora era um príncipe
cheio de delicadeza

O príncipe reclamou o anel
esse foi o seu gatilho
- Sei que fui um mal filho
agora sou um grão de milho!

Caindo sobre a grama
se perdendo com um estralo
Mas o mestre bem esperto
a essa hora era um galo

O menino estava imóvel
como um mariposa
- Nem marido nem esposa
agora sou um raposa!

De súbito cresceu uma raposa
saiu do meio do capim
O galo nunca percebeu
como chegara o seu fim

O garoto agradeceu
contando então o seu segredo
Para a princesa que o salvara
colocando o anel no dedo

Mal agradecido com o mestre
e desonesto em suas escolhas
Decidiu queimar o livro
sem restar nenhuma folha

Perigosa era a magia
daquele livro vermelho
Decidiu parar por ai
o aprendiz de feiticeiro

PÉ DE VENTO

Meus pés de vendavais
Passeiam por ares desleais
Anunciando tempestades guturais
Olho com olhos de furacão
Arrebato instantes sem permissão
De tempos em temporais
Girando vertiginosamente
Até cair, aturdido
Nos braços de quem me devolva o ar

Estava preso
Durante um tempo
Amaldiçoado
Em um encantamento
Seu perfume
Ficava no ar
Seu toque
Nas águas do mar
Sua falta
Na escuridão da rua
Seu olhar
Na luz da lua
Seu calor
No raio de sol
Minha sina
Peixe e anzol
Hoje livre
Fugi disso tudo
Vou andando
Andar vagabundo
Sem destino
Achado e perdido
Onde passo
Vou sendo acolhido
Não cobro amor
Nao peço esmola
Passarinho
Livre de gaiola
Com migalhas
Só marco o caminho
Estou livre
Mas nunca sozinho

Queria tanto saber
O que você quer me dizer
Se você quer ou não me ver
Se é pra lembrar ou esquecer

Queria tanto saber
O que se passa aí dentro
Se é calmo ou turbulento
Se só ficou arrependimento

Queria tanto saber
O que você faz agora
Onde sua vontade mora
Se fico ou vou embora

Queria tanto saber
O que manda seu coração
Se isso é um sim ou se é um não
Se não passou de ilusão

Queria tanto saber
O que é realidade
Sua verdadeira identidade
Se no final é só saudade

E seu eu tivesse a sorte
Não soubesse o que é morte
Não seria assim tão forte
Não iria me importar
Com cada segundo que passa
Com seu braço que não me abraça
Com seu olhar que me transpassa
E mira um outro lugar
Mas na sorte do azarado
Vendo a morte andar ao lado
Entendo todo o significado
Que você possa significar

O vento sopra pra longe
Tudo o que eu acho que quero
Sendo assim, me desespero
E tento correr atrás
Mas nem tudo o que me satisfaz
Parece me fazer bem
Então penso que foi alguém
Que tentou me ajudar
Soprando tudo pra lá
Para que eu pudesse enxergar
E então decidir
Ir atrás do que faz bem pra mim
Mesmo que ele tenha soprado a ti

Intencionalmente
Seus olhos, meio vagos
Ocupados somente pela lua
Se perdem na noite escura
Distraidamente
Acendem a trilha dos que te seguem
Sem saberem que apesar do seu brilho
Seus caminhos são inseguros
Escuros
Escolhe iluminar com luz roubada
De um satélite farol
Escondendo seu resplendor
Sol
Por medo de queimar
Resistindo a quem possa suportar
A luz da estrela que guarda

E assim vamos nos separando
Uns dos outros, gradativamente
Por várias condições
Impostas, por sei lá quem!
Em um momento, sei lá qual!