Coleção pessoal de monalisa_1
Cai a noite silenciosa. Quantos mistérios existem em seu silêncio? O sol se esconde e a noite escura nos convida à reflexão. O dia foi suportável, ainda que em alguns instantes lágrimas molharam meu rosto. A felicidade é frágil e dentro dela se escondem temores. Mas também é nela que se esconde a esperança. Já quase não me movo. Essa apatia vem carregada de densas culpas. Talvez o tempo esteja cobrando seu preço. Sou um ser frágil, enfrentando uma densa poeira, que machuca meu rosto. Nascer diferente com uma frágil esperança de futuro. Entretanto sigo minha sina. Choro quando não é possível conter no peito uma angústia ardilosa. E sorrio de esperança, porque apesar de tudo, a felicidade mora em mim. Queria saúde, queria amor, queria tantas coisas. E às vezes a solução é não querer. Espero um medicamento que me cure de mim. Eu não sou mais a mesma. Desconheço sorriso largos e como uma largarta vou rastejando nesse solo árido. Esperando que um dia enfim eu seja como uma borboleta, grande, colorida e leve. Espero o tempo que esse dia chegará. Até então, não vou descansar. Que venha a noite, escura e densa, meu peito suporta, forte como uma gaivota.
O sol surge lentamente, anunciando um novo dia. Renovação na ponta dos dedos. Dedos que surpreendem com suas palavras inesperadas. A noite povoada de sonhos. Duas dimensões no mesmo tempo, no mesmo espaço. Observo. Meus olhos estão povoados de imagens e o coração distingue suas cores, nuances e tonalidades. Dia silencioso, tranquilo. Talvez isso seja paz. Lembro de pessoas que passaram por minha vida. E me parece como personagens de um livro de ficção. Eu sou a protagonista da minha vida. Deus é o escritor. Dias tristes. Dias alegres. Caminhando na corda bamba do circo da vida. Pão e circo. Nem tanto pão, nem tanto circo. Equilíbrio. Minha alma questionadora não para. A vida é como é. As pessoas falam, dormem e acordam. A vida é isso. Queria eu ver a vida assim de modo tão simplista. Eu quero sempre mais. Mas hoje eu estou em paz. Quero um bom lugar para sentar. Quero simplesmente olhar. Hoje eu só quero que o dia passe suave. Até mais.
O mundo muda rapidamente e minha mente gira eletrizante. Perguntas sem resposta. Respostas sem pergunta. Inútil questionar quem sou eu. Talvez amanhã, quando cessar o turbilhão, eu entenda que nenhuma resposta é possível. Sou um ser orgânico, pleno de células. E meu cérebro cheio de neurônios, gerando sinapses. Mas isso diz pouco, quando me deito e não consigo dormir. Quando a angústia aperta e não sei se vou resistir. Andar, andar, andar. Sempre em frente. No fundo sei que sou como uma pedra dura de quebrar. E suporto uma, duas, dezenas e centenas de dias. Tudo poderia ser mais simples, mas o coração não conhece estrada. E nessas horas de perigo, sonho com sua voz dizendo que a vida vale a pena. E em um abraço eu sinto essa dor espairecer lentamente. Eu que tanto amei, no meu quarto vazio, sozinha, eu e minha consciência, busco um sentido mais forte para encarar o tempo e sentir que ele é meu companheiro inseparável. Era para eu ter morrido, mas eu não morri. Limpo um pincel e desenho retratos. Fragmentados. Longas horas pintando e pensando. Por que eu penso tanto? Seria mais fácil ser pragmática, mas reflito longamente sobre acontecimentos tão distantes. E se estou viva penso em Deus. Não tenho religião. Mas sei que há uma força superior. Assim vou mudando de assunto, vagando entre um pensamento e outro. O passado recheado de conquistas e arrependimentos. Deito a cabeça no travesseiro e sinto uma angústia pesada. Onde foi que eu errei? Eu só queria ser feliz. Hoje eu só quero ter paz. Que minha mente não me torture e que não me falte o ar de madrugada. Eu quero sentir prazer em compor um poema, em pintar um quadro, ou cantar. Mas uma apatia me impede de viver. Eu não sou uma vítima. Sou uma mulher forte. Uma mulher que escapou da morte. O futuro me parece obscuro, talvez eu suma e ninguém note. Daquele acidente ficou visões de carros vindo em minha direção. E sinto um sentimento amedrontador. Quando me madaram para o inferno, aquele homem alto e forte começou a me enforcar. Pensei que me mataria. Seria uma morte qualquer, em uma clínica qualquer. Mas eu não sou qualquer, sou uma pessoa única, que seria silenciada em um trágico dia. Sou uma sobrevivente. Não sou uma vítima, mas ainda sinto meu pescoço sendo enforcado. Como essas palavras ficaram tristes e pesadas. Assim é a realidade, dura demais para ser encarada. Pego minha trouxinha de dores e transformo em palavras. Esqueça. Eu sobrevivi e continuo aqui. Às vezes minha mente me dá um descanso e então sinto esperança. Essa semana foi meu aniversário. Que medo eu tenho de aniversários. Minha família veio, trouxe bolo. Eu fiquei feliz, mas quando foram embora, eu chorei. Toda alegria me traz tristeza, porque sei que toda alegria é passageira. A vida também é passageira, mas se demora além da hora. A vida passa arrastada, já sem objetivos. Sobreviver apenas. Morrer de tristeza e não macular o meu corpo. Talvez essa noite eu durma. E minha alma descanse.
Monalisa Ogliari