Coleção pessoal de gabrieltarrao

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Eu andei só.
Andei com medo, no frio.
A garganta já dava um nó
E o coração, coitado, vazio.

Meus pés descalços sofriam
Minha boca, tão seca, rachava.
No meu pensamento, pessoas riam.
E eu ainda não sabia onde estava.

Restos humanos espalhavam-se pelo chão
Um sinal da quase unânime desistência.
E, em busca de evasão
Tentava ativar minha inteligência

Eu já não tinha mais controle
As pernas, esbanjavam teimosia
Tudo parecia desmoronar
Corpo e mente estavam fora de sintonia.

Perdi meus óculos, levados pelo vento
ESte que levou também parte da visão
E ali, ao relento,
procurava uma saída daquela imensidão

A lua brilhava com um ar sombrio
Era evidenciada no céu fechado
Refletia na nascente do rio,
Sujo, imprevisível, maltratado.

A fauna local era medonha
Pior que ela, só a flora.
De marcante, uma coruja tristonha
Encima de uma árvore senhora.

Eu continuava caminhando
A cada passo, menos esperança
A força ia, com rapidez, cessando
Na mente, sequer uma boa lembrança.

E eu, àquela altura,
Já não tinha família.
Andava só, numa realidade obscura
Sem pai, sem mãe, nem filha.

Após dois quilômetros, talvez três,
Encontrei uma caverna
E ali, encima de uma pedra
Havia uma pequena lanterna.

Era uma velha lamparina
bem resistente, por sinal.
Tudo parecia ser uma sina.
Uma sequência.
Início, meio e final.

Eu segui pela gruta
Quase para desistir.
Com o sentimento de luta
Mas, com o mundo a ruir.

De repente, algo inusitado.
Um espaço arejado abrigava um violão
Deixei minha lamparina de lado
E, com certa estranheza, sentei no chão.

Um acorde aqui, outro acolá
E eu me renovei
Senti que algo bom ia chegar.
Continuei...

Dali, uma voz me guiava
Uma voz rouca, marcante.
O sorriso, que se ausentava
Surgiu por um instante.

Eu já estava esgotado
As pernas destruídas
Imundo, pessimista, desolado.
O corpo cheio de feridas.

Até que, como mágica
Uma luz irradiou
Aquela história trágica
teve um fim, acabou.

Andei por mais uns cinco minutos
E cheguei a um parque natural
Era tudo muito lindo, perfeito.
Paraíso no meio de um arraial.

Tudo era cheio de vida
Do grão de areia à bela lagoa.
E a vida passada, já esquecida.
Foi trocada por uma sensação boa.

A felicidade finalmente apareceu
Como toda flor tende a brotar.
E todo aquele breu
Foi-se pra nunca mais voltar.

Eu consegui! Triunfei!
Estava risonho como uma criança
E tudo isso que conquistei
foi devido à fé e á esperança.

Pois, quem acredita, sempre alcança!

REGREDIU

Onze da noite, tudo escuro.
Pensamentos fluem com constância.
Consigo inalar o ar mais puro
Me vejo pensando na infância.

Não fui egoísta
Pensei no geral
Sobre como era vista
E seu declínio [a]normal.

Observando com calma
Vem muita coisa na mente
Lembro-me das brincadeiras
E do jeito puro, inocente.

Em tempos remotos
Vivíamos um sub-mundo
Tanto que nem existem fotos
Está tudo na cabeça, bem lá no fundo.

Não havia apego ao material
Nada de computador ou celular.
Brincávamos, quase sempre no meu quintal,
Que era arejado e ampliava o magnífico luar.

O cenário era uma pequena vila
"Vila Sol Nascente"
Onde a vida era tranquila
E só morava boa gente.

Fora da minha casa
Tínhamos um quartel general
Cheio de frutas e animais,
Era o misterioso Horto Florestal.

Meu canto era aquele ali
Naquele mato escuro
Onde, de verdade, vivi
Subindo em árvores e caindo de maduro.

Era o lugar pra onde fugia
Onde tirava manga, laranja, mamão.
Corria do vigia.
Brincava de polícia e ladrão.

E isso é só uma parte
De uma época fenomenal.
Em que podíamos estar em Marte
E, em um piscar de olhos, ir ao Nepal.

Era perfeito!

Mas, chegou uma tal de evolução
A quem dou o nome de retrocesso.
E tudo aquilo que era feito a mão
Passou a ser, por uma máquina, impresso.

Inocência virou maldade
O claro virou obscuro.
O horto, uma raridade,
Foi cercado por um grande muro.

O rio, de tão poluído, secou.
Perdeu toda sua essência, sua beleza.
O verde acabou.
Uma enorme agressão à bela natureza!

Foi uma enorme destruição,
Aquilo que o próprio homem fez.
Hoje, esbanjando diversão,
Somente duas crianças, talvez três.

As ruas, já asfaltadas,
Foram tomadas pela violência
E por pessoas, coitadas,
Sem um pingo de inteligência.

Era perfeito!
Hoje, não é mais.
E assim, desse jeito,
Todos buscam por paz.

Eu, mero pensador,
Continuo escrevendo
Falando dessa minha dor.
Desse retrocesso que eu estou vendo.

Peço que tudo volte a ser como era
Que acabe toda essa tristeza
Peço que a maldita fera.
Volte a ser princesa.

Lamento pelas novas crianças
Que se divertem com moderação.
mas, ainda guardo esperanças.
De que elas saiam dessa ilusão.
Chamada, erroneamente, de evolução.

MERA OBSERVAÇÃO

Era noite de sexta feira.
Uma noite bem fria, por sinal.
Falei com todos, puxei uma cadeira.
Me acomodei e comecei a conversar, nada anormal.

Comigo, os velhos companheiros de prosa
Um pouco de assunto e o som vindo da rua.
Ao centro uma mesa com uma flor, uma rosa.
Alguma bebida e um prato de carne meio crua.

Estávamos todos no interior d'um bar.
O típico boteco que de tudo tinha.
Da cachaça mais inusitada
Ao famoso frango à passarinha

Na vitrola, um bolero conhecido.
Ao lado, uma linda dama de perfume.
Na sinuca, um malandro bem sabido
E o papo fluía como de costume

Mas, tinha algo diferente
Algo estranho acontecia,
Era comigo.
E, meio que de repente,
Perplexo, eu me via.
com tudo eu estava entretido

Passei a enxergar tudo.
Enxergar não, ver.
Ver aquilo que estava no meu mundo.
Aquilo que eu insistia em esquecer.

Vi o grilo, que zoava no teto
Já me tachando de louco
Pois, dar importância a um inseto
pra loucura, faltava pouco.

O giro das hélices do ventilador,
que esfriava ainda mais o lugar
Era monótono e assustador
Tal como um velho que, solitário, estava por lá.

Um casal de gulosos
que sempre pediam o mesmo
Um prato cheio ovos
E uma porção de torresmo.

Do outro lado da rua
Residia Um mendigo
Vivia no mundo da lua
Abandonado, doente, encardido.

Me irritei com a porta do banheiro
Que fazia um som insuportável
Até que um garoto, um tanto ligeiro
Entrou lá e o resto é improvável.

Pensei na minha família
Que, feliz, me aguardava no lar
E quando, no bar, entraram mãe e filha
Queria, pro meu aconchego, voltar.

Até que, de supetão, tudo sumiu.
Abri meus olhos e me surpreendi.
A porta do quarto, autônoma, se abriu
E num piscar de olhos, uma tragédia percebi.

Fiquei mal, desolado
o rosto estava bem tristonho.
Tudo aquilo que havia presenciado.
Fazia parte de um sonho

Um sonho engraçado
De mera observação
Só que estava recheado, coitado,
De uma ingrata ILUSÃO.

ESPONTÂNEO

Esse sentimento sombrio que reside em mim.
parece importante, mas é muito ruim.
Algo que não sei como explicar.
Quase como um pássaro doente, que não pode voar.

Um sussuro que invade meus ouvidos.
Sonhos distantes,pensamentos perdidos.
Um cheiro forte, um gosto amargo.
Como inalar angústia tragando um péssimo cigarro.

É inexplicável!
É espontâneo!

Mas, tudo passa, ou quase tudo passa.
E a alegria, antes tão escassa, retorna.
E traz consigo a esperança de que, como uma criança, que sonha, sofre, sorri
Eu possa me renovar a cada dia.
Levar a vida, mesmo que de forma fria.
Pois, não dá pra controlar.

É inexplicável!
É espontâneo!

Essa vida minha,
dividida em ciclos sentimentais.
Antes tão estranhos, hoje normais.
São coisas distintas, que não são bem vindas
Mas, vêm e, sem nenhum porém, me confundem.

Não reclamo como antes
Já que, apesar de distantes, são naturais.
Que irritam até demais, porém não dá pra fugir, pois

É inexplicável!
É espontâneo!

Tão espontâneo e sem explicação
Que me enche de inspiração
Para que, em poesia ou canção
Eu mostre o que diz meu coração.
Deixando, por ora, a sábia razão.