Coleção pessoal de bia_pardini

21 - 40 do total de 47 pensamentos na coleção de bia_pardini

⁠Clemência

Pensamentos encarcerados
Solidão de desejos reprimidos
Pernas e corpo dilacerados
Capacidade e tempo deprimidos

Liberdade infernal, presidiária
Dependência, insatisfação
Coletividade imaginária
Circunstâncias sem emoção

Mundo contraditório
Pena pede clemência
Tudo é provisório

História que não seduz
Vida transitória
Trevas sem luz.

(Bia Pardini)

⁠Ciranda de emoções

A vida, senhores, é uma ciranda de emoções. Riem hoje, mas choram amanhã. Ninguém está imune a nada. Tudo muda todo dia, toda hora, a cada segundo. Enquanto um nasce outro morre, enquanto um dorme outro dança, enquanto um ora outro mata.

Da vida, senhoras, não levamos os sapatos altos, o encanto das saias, a marca do perfume, o prazer da sobrancelha feita, mas deixamos o exemplo, a marca do caráter, o caminho dos pés cansados do trabalho nem sempre reconhecido, a honestidade do dever cumprido.

A vida, senhores, não os poupa das malas surrupiadas, um dia elas aparecem em forma de matéria podre e suas cinzas serão poeira ao vento. Mas o amor que ensinam aos seus, a direção indicada pelo senso de justiça, a virtude da integridade, as canções que embalam os seus, senhores, serão o legado inesquecível.

Da vida, senhoras, levamos sim, na derradeira hora, a gratidão de poder deixar aos descendentes a doutrina da moral, dos bons costumes que não caem de moda.

A vida, senhoras e senhores, é uma ciranda de emoções.

(Bia Pardini)

⁠Chuva

Esperada, desejada, ela chegou calmamente, mansa, sem alarde, elegante, ela que tantas vezes destrói, mata, desta aquietou nossa alma, nossa respiração. Não fez barulho, não incomodou, a noite foi calma como música na folhagem. Renovou-nos em esperança como bênção do céu, como doce sabor de mel, pureza e amor. Ela, a chuva é sempre renovação.

(Bia Pardini)

⁠Casa da Felicidade

Teus sonhos te levarão sempre à Casa da Felicidade e ao alcançá-la farás dela a tua morada. O que importa é que a alcance, assim teus olhos aprenderão a ver beleza no que sonhastes. Teus sonhos te farão capaz, de em cada passo dado, encontrar equilíbrio para não tropeçar. Então deixe a tua alma leve, para encontrar serenidade e trazer para tua vida tudo aquilo que te proporciona paz, confiança, segurança e muita emoção. Este é o grande encontro com a Casa da Felicidade. Neste teu caminhar, não existirão esforços além do que és capaz de suportar. No teu coração caberão todos os teus amores, cada um com sua peculiaridade, cada um te levará a um êxtase diferente te completando e te proporcionando todas as emoções que te acordarão e te farão mais mulher, mais bela, mais jovem.

(Bia Pardini)

⁠Carnaval

O show vai começar.
Fogos de artifícios preparados a espera do apito do samba. Os corações pulsam no ritmo da bateria. Fantasias, confetes, serpentinas... ilusões. Atrás da máscara a tristeza esconde-se, mas a magia do momento desfila o enredo marcado pelo surdo. Tamborins, reco-recos, cuícas, caixas transbordando um som em explosão; alegorias enfeitam e exaltam foliões anônimos e celebridades, meninas ainda crianças num sonho de gente grande, senhoras balzaquianas num sonho de adolescente e assim a alegria toma conta do coração levando consigo toda uma perspectiva de no final sair feliz, completa e plenamente. Foliões levam adereços enfeitando os seus desejos, porta-estandartes giram no samba com “borogodó”. No balancê da roda viva o sentimento de liberdade, o sabor da felicidade, a chance da conquista que renova-se a cada ano. Uma bateria com inúmeros participantes a sincronizar um ritmo que embala desde os simples brincantes aos mais sérios e elegantes. Um trabalho de mestres que sem temer o resultado final confiam na sua equipe e fazem do seu trabalho uma bela resposta aos ouvidos mais afinados. Poetas desfilam seus sambas-enredos com toda grandeza de uma esplêndida apresentação, muito brilho, muita animação. E na quarta-feira retorna a rotina e de cinzas é chegada a realidade num imenso caldeirão de fantasias calcinadas e sonhos espargidos, somente restos.

(Bia Pardini)

⁠Banho

Enquanto banhava-me senti tua presença. Molhada, envolvida, enlaçada em teu corpo, senti tua sensualidade rondar meu sangue.

Tenho vivido no silêncio dos teus beijos querendo gritar teu nome até enrouquecer. Mas calo-me para que não ouçam minha respiração ofegante imaginando-me dentro do teu corpo.

Comprazer-me e dar-te prazer é mais do que uma conquista, é abrir a porta dos teus desejos, enquanto sou alguém que espera ser aberta por uma palavra.

(Bia Pardini)

⁠Autorretrato

a vida presenteou-lhe com mimos e harmonia de cores
o mundo que nasceu sobrevivia do silêncio da oração
o silêncio da emoção que bastava... e sem dores
cada pétala de cada flor pulsava-lhe o coração

no mundo que nasceu, ornado de ipês... um encanto!
encanto do poema que não sobreviveu ao escutar
a magia da poesia não revelada... nem sob o olhar
nem pelo sentimento mais nobre e sacrossanto

ela sentia um mundo onde o pulsar do coração
era muito mais que bater... era cadência,
mas ausência do ritmo da poesia sonhada
a fragrância dos ipês não bastava... silêncio

a vida presenteou-lhe com inspiração... calada
como solidão de poeta genuflexo em oração
a carência dos versos enfim brotou-lhe um dia
e com o regozijo da autonomia o parto da poesia.

(Bia Pardini)

⁠Asas

Meu coração tem pressa
acelera os momentos
o passo mais lento
peço um tempo

Meu coração tem pressa
rouba-me o ar
descompassado
faz-me silenciar

Meu coração tem pressa
aciona as asas
esperança finda e confessa
que não atrasa

Meu coração tem pressa.
o ritmo acelera
até tropeça
nem pondera

Meu coração tem pressa
um tempo é o que peço
sinto a ameaça
e me despeço.

(Bia Pardini)

⁠Amarguras

Se te enclausuras
em prantos de dores
tuas amarguras
de falta de amores
deixe que suem teus olhos
na tua alma vazia de versos
e salguem teu corpo
em queixas submerso.

(Bia Pardini)

⁠Almas Gêmeas

Numa história de amor estão os mistérios da vida. Duas almas se encontram, se acham no meio de tantas outras e se aproximam, pois algo de especial as une. Gêmeas? Elas se encontram depois de pensarem que suas vidas estão acomodadas. Mas não imaginam que os dois destinos estão fadados ao fracasso. Viajaram juntas até o ponto final com frequentes subidas e descidas. O mesmo destino que as uniu as distanciou em meio a tantas semelhanças marcantes que se tornaram diferenças relevantes.

Combustível e comburente, altamente inflamáveis incapazes de reverter uma reação que deu origem a um produto de gosto amargo, instável e que ao ser experimentado provocou efeitos adversos.

Uma que a vida ensinou a ser forte, outra solitária carregando um sentimento que machuca, fere, buscando encontrar um outro caminho.

Obstáculos exteriores e interiores, medo, culpa, preconceito levaram à desilusão da mentira, aos dramas rebuscados cheios de altos e baixos.

E então o desfecho: a morte da chance de provar não aos outros mas a si próprias que seria sim possível fazer brotar uma rosa no deserto.

Mas um novo desejo, uma nova experiência surgiu e ambas, as almas que se imaginavam gêmeas, sem despedidas se aportaram em outras plagas e um novo ciclo recomeçou.

DIVAgando sempre até onde suportar e ter que voltar ao ponto inicial, onde o Universo as projetou, onde raízes se fincaram e onde vão terminar os seus dias.

Infelizes almas, não são gêmeas, apenas tentam sair da solidão... DIVAgando...de-va-garinho... contornando... indo... voltando... até o ponto final.

(Bia Pardini)

⁠Algemas

Triste ecoa o pássaro veloz
enjaulado asas condenadas
no cárcere seu canto lamenta
coração silente regido por algoz
sonha com suas presas afiadas
rasgando nuvens sem tormenta.

Anúncio da presença de Deus
cativo a liberdade pressente
passivo espreita a hora do adeus.
A espera do impiedoso ausente
a voz do silêncio será ouvida
grita o pranto que nele habita.

Silêncio! Um pássaro cantará
se liberto num dia de felicidade
asas tem para seu vôo alçar
a voz de Deus o algoz tocará
num momento de sobriedade
liberto ecoa o mais belo cantar.

(Bia Pardini)

⁠DIVAgando
(a uma amiga que já se foi)

“Amigos não precisam estar, precisam ser.”

Embora ausente, fisicamente, você faz parte dos meus pensamentos todos os dias, dos meus sorrisos, das minhas lembranças boas. Uma amizade marcante: conselheira, generosa, confidente, nossos assuntos não tinham fim. Nossos encontros de todas as tardes estarão na minha memória para sempre. Nossas crianças, hoje homens e mulheres feitos, formados, casados, com filhos, ou não, mas adultos, que brincavam ali, aos nossos olhos, eram as preocupações e alegrias de momentos inesquecíveis. Tudo muda todo dia, a cada segundo, nossas vidas vão tomando outros rumos, cada uma com a emoção que mais se identificou, perpetuando, assim, nossos nomes. E hoje você se foi para junto do Pai, mas deixou um legado inesquecível de amor que ensinou aos seus, a direção indicada pelo senso de justiça, a virtude da integridade, a doutrina da moral e dos bons costumes, uma verdadeira ciranda de emoções. Quem sabe um dia voltamos a nos encontrar.

(Bia Pardini)

⁠A FORMA DA ÁGUA

Frenética demoníaca obscena
criatura presa secretamente
vida experimental aquática
descoberta por zeladora atenta
encanta-se em aventura fantástica.

Um corpo devasso pelo fogo clama
de animal em pecado então dormente
que solta do lábio misteriosa lama
macabro apraz donzela silente
o pelo na pele fêmea goteja regozijo.

Assassinada por revelar a criatura
pelo ser amado é revivida ao mar
e seguem na forma da água impura.

(Bia Pardini)

⁠(Des)esperas

A espera é sempre ameaçadora
e dominadora.
A espera da sentença
do tempo
de ouvir a desavença.
A espera do contratempo
do sentir
do falar e de calar.
A espera de ontem, de amanhã
o medo de esperar
nunca no divã.
Todos esperam por alguém
ou alguma coisa ao contrário
de hoje, sem horário.
Nunca a dor e sim a cura.
Por fora aspecto frágil
por dentro sem ternura
aos gritos.
Um naufrágio!
Com olhar longínquo
restrito
em silêncio sem atrito
nem delinquir.
Na chegada ou na partida
a espera do sair
na fila e no entrar
controvertida
ou de nunca mais voltar.
(Bia Pardini)

⁠Sonho final

Um dia, num sonho, ele caminhava tristonho, seguia o curso, ele que mal dormia, o percurso era uma oração. No seu confortável leito, em acomodação sempre desfeito, as dores eram trejeitos e incomodação.

O sono, cada vez mais raro, em abandono era-lhe caro quando chegava. Noites de insônia ele fazia poesia, sem cerimônia a lua o espiava e o inspirava. Dores, tremores, poemas com lema pessimista, mesmo assim um artista cujas lágrimas borravam as páginas, mas lavavam sua alma. E orava.

Na calma pedia aos santos que constavam da sua lista de protetores, anjos provedores, a conquista da salvação. Em vão!

Então, no seu monólogo da noite, mendigava perdão, lembrava dos tempos passados, ventos a favor, agora credor de diálogos atrasados.

Deus, como ele amava sua família, a vigília a amigos em perigos e tinha compaixão de irmãos que sofriam.

Mas a oração ouvida, sentida, não olvida, concedeu-lhe a compensação do prazer, ao seu fraco colo, no opaco solo, o nascer de sua continuidade e um final com dignidade.

(Bia Pardini)

⁠Chuva

Amanheceu cinzento, ela chega mansa
calma, recatada aquieta a alma, amável.

Elegante traz respiração que não cansa.

Em gotas suaves é música na folhagem
umedece os sonhos de mulher da lida
encharcada de esperança, fluída.

Desassossega a moça da vida
livre, solta, rebola entre os pingos
que de amor carente, mendiga.

Oh Chuva! Bênção do céu!.

(Bia Pardini)

⁠Aconchego

Existem pessoas que entram em nossa vida de leve, de mansinho, como uma semibreve, invadem e duram com carinho, não evadem e perduram.

As que cessam dores, medos, devolvem amores, logo cedo nos ressuscitam e suscitam sonhos como anjos e arcanjos num esbanjo de paz.
Incapazes de despertarem fantasmas para aportarem em nosso coração escolhem ser doação e nos aceitam com todas as imperfeições.

Aquelas com sintonia, como sinfonia, soam acordes e nunca discordam do nosso tom ao som do indesejado dando sua melhor voz no canto do mais veloz encanto.

Como passarinhos na flor escolhem fazer ninho e ficar, acalentar a dor e fecham as asas como em água rasa, privam da liberdade e permitem-se dar felicidade.

(Bia Pardini)

⁠Abstração

Era uma noite escura e velas resistiam aos ventos intensos violentos da memória. Nas gavetas as sensações da imaginação criavam um passado que sucumbiu na tempestade da perturbação intempestiva e inoportuna.

O que haveria do outro lado do absoluto esquecimento de cenas, agora vazias de vida, vítima de versos talvez revoltos, escrotos ou singelos, quem sabe, esculpidos e tingidos de paz, pureza, leveza?

Cenas criadas, concebidas, fantasiadas remeteram a uma multiplicidade de sentidos, imagens, talvez geradas e abortadas de um juízo errôneo, irrefletido.

Qual deus, qual nada, qual tudo lhe suprimiu, subtraiu a memória como um larápio poderoso que sublimou, apropriou-se daquele passado na gaveta vazia.

E a lágrima perdeu-se no curso natural, devastada pela letargia do tempo olvido, pela tempestade profunda e prolongada da memória enlutada do esquecimento. Lágrima a deriva, nem verso, nem rima, nem nada.

(Bia Pardini)

⁠A aventura de viver mais de 100 anos
(Dedicado ao meu tio Monsenhor Hilário Pardini)
*06/09/1917 +13/04/2020

Chegar aos 102 anos é empreender uma travessia pelo mundo lá fora e dentro de si. O tempo e o envelhecer conduzem a perdas e sabedorias que se encontram com o passar dos anos. A lucidez também envelhece, mas fica na lembrança o caminhar com a história longeva. Chegar aos 100 anos ou ir além é atravessar o mundo de fora vencendo os altos e baixos do mundo de dentro. Envelhecer é atingir uma ‘sustentável leveza’ de si próprio apesar das dores da matéria e a compensação disso é estar mais próximo das mãos de Deus. E é aí que acontece a plenitude, o encontro com a total sabedoria adquirida em toda existência; é onde se é capaz de ver o sentido real da vida e, agora, a felicidade de estar nos braços do Pai.

(Bia Pardini)

⁠Acorda, poeta!

Está voltando a claridade
um novo amanhecer
traz a oportunidade
de recuperar o prazer.

O sol traz dias quentes
e abrem novas portas
fecham velhas feridas
antes de sua partida

Venha ver o que sente
no ciclo, volta da noite
sonhos, brilhos, silêncios
tempo de viver intenso.

Sonha, poeta...

veja o que vem de dentro
separe do joio, o trigo
da flor, o espinho
do pranto, o riso...

(Bia Pardini)