Coleção pessoal de barbaramelucci

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E ele disse, um dia, como se fosse surpresa: eu não sei lidar com esse valor todo. Ela riu internamente com a ternura que se ri de uma criança que não sabe segurar o lápis. Era assim com tudo o dele. Era assim porque era amor, e o que o amor dá é a paciência de ensinar a segurar o lápis. Ou de esperar que se aprenda sozinho. Mas foi que começou a doer. Porque ela não era forte o suficiente pra se manter adulta e inabalável ao longo de toda a estrada. Porque ela também tinha lápis. De cor.

A todos que um dia fizeram uma escolha errada: eu vos entendo. Eu entendo o que é desejar viver tudo de novo só pra dar um passo diferente. Eu entendo o que é olhar uma foto de alguém e se sentir a pessoa mais idiota do mundo por ter jogado fora a chance de apreciar aquele rosto pra sempre. Entendo o que é ver algo e lembrar de alguém mesmo que anos depois. Eu entendo o que é a falta que nunca deixa de existir, a saudade que nunca vai ser preenchida, a risada que nunca mais vai se saber o gosto de causar. Eu sei o que é ter culpa. Ou ainda não ter, mas sentir. Eu entendo o que é sentir culpa e ódio por todos os fatos que nasceram de uma escolha. Eu sei o peso que é andar todos os dias sabendo que se podia estar de mãos dadas com a pessoa que ninguém substitui e ninguém se compara. Eu entendo o que é ler uma carta de amor e não conseguir acreditar que um dia se teve o amor de uma pessoa que hoje só oferece distância. Eu sei -e sei que sempre vou saber- o que é passar a vida sabendo que se está no lugar errado por causa de uma escolha cega e impulsiva. Eu vos entendo, e eu sinto muito. Por mim, por vocês, por tudo o que eu nunca terei e que vocês nunca terão, pelo que nunca seremos. Mas eu sei que meu sentimento de nada adianta. Nada de nada adianta. A vida segue. Como sempre, oferecendo tudo pra que seja feita uma boa escolha; assim que a escolha errada já foi consumada.

Você me cansa. A verdade é essa: em meio a tanto amor, há um enorme cansaço. E não um cansaço bom, não um cansaço que se tem ao se exaurir em fazer algo pelo que se acredita, mas um cansaço sem propósito algum. Um cansaço da própria falta de propósito. O cansaço que a gente sente ao chegar no mesmo trabalho que não ama mas está há 50 anos. Não por eu não amar você, mas por eu não saber suportar essa superficialidade na qual você se propõe a ser algo pra mim. Me desculpa dizer, eu sei que isso não é coisa que se diga, mas você me cansa demais. E não o cansaço costumeiro de se surgir, mas um cansaço sufocante. Um cansaço do quanto você é só isso e basta, mesmo sendo tanto. Na realidade, um cansaço do quanto a gente é só isso e basta, mesmo podendo ser tanto. Eu não sei ser só isso. Não basta. E me cansa. Me desculpa ser assim, tão direta, inconveniente e nada poética, mas é que eu estou cansada.

Me desculpe se, repentinamente, você perceber que sumi. Não pense que, se você esperar minha presença em algum momento e se deparar com a ausência, foi por displicência minha. Não se sinta desamparado se eu passar um dia ou todos sem te lembrar que eu existo. Não é por falta de amor e muito menos por querer que você sinta minha falta -você sabe que isso é algo que não faço-, mas porque dar-te-me agora seria uma agressão. Eu, que há pouco reaprendi a ser vida e cor, nos últimos dias tenho sido vazio e fraqueza. Se eu não surgir dizendo qualquer aleatoriedade sobre o que tenho sentido, é porque não quero derramar tons de cinza sobre suas cores ou pesar sobre a sua encantadora leveza. Por mais que grite em mim a vontade etérea de me compartilhar contigo, grita mais alto o amor dizendo que não posso fazê-lo. Me desculpe, então, por esses dias -e quem sabe por quão mais- que precisarei, aos seus olhos, simplesmente não ser, porque me ocuparei de doer longe do seu conhecimento. Me desculpe por eu não poder te pedir desculpas, mas a falta de justificativas te será mais confortável que qualquer pedaço dessa dor.Que você possa seguir criando em muita gente a vida que criou em mim, e eu cuidarei de recriá-la quão rápido eu puder. E então, se ainda a tempo, eu ressurgirei, pra compartilhar contigo a plenitude e a força que surgirão desse vazio e dessa fraqueza. Me desculpe por não ter encontrado solução melhor. Eu nunca quis te dizer; adeus.

Ame, pois o amor deixar-te-á imune. Mas cuide de saber diferenciar o amor de qualquer outra coisa, de coisa que seja doença e não cura. Ame como quem beneficia a si mesmo tendo o outro apenas como ponte, ame como quem sabe que só o amor engrandece, só o amor pacifica, só o amor dá sentido. Cuide de não tornar o amor um erro. Cuide de não tornar o amor coisa alguma. Apenas ame, ame, ame, não espere nada além do amor pois nada há além do amor. Nada há maior que amar. Ame. Amém.

Eram 19. Duas horas a mais. 120 minutos e ela não sabia ter raiva. Nem eram precisas aquelas duas, havia tido horas suficientes pra ter. Como se cada hora de espera tivesse um equivalente em raiva, mas nela não. Nela sim, mas com ele não, pra ele não. E se não sentia raiva, o que sentir? Sentir amor, naquele momento, seria inapropriado demais. Humilhante não podia ser a palavra, pra ela que não sentia-se humilhada por mais que as circunstâncias a forçassem. Era isso o amor? O impecilio da humilhação? A ferrugem no transformador de espera em raiva? Quão desejável podia ser um sentimento que fazia-na ser tão idiota sem o menor esforço? E se não exigia esforço, por que ter raiva? Ela sentia amor ainda sendo tão inapropriado. Na escada vazia, oca e ecoante ela sentia amor e não sabia como, não sabia por que, antes disso não sabia o que fazer dele. Se tivesse raiva quebrava alguma coisa, se sentisse humilhação descia os degraus e ia-se -pra nunca mais voltar-, mas amor? Não há nada a se fazer com amor numa escada oca e ecoante. Ante. Ante. Ante.

Por um momento eu quase quis. Eu quase quis que você fosse diferente
mas então lembrei que não. Que eu não poderia desejar diferente alguém que me faz tão bem sendo, assim, com cada centímetro do que é. Por um momento eu quase quis que você me quisesse, assim, como eu quero você. Mas então me dei conta que não posso querer pra você algo que não vá te fazer se sentir pleno por querer -assim, exatamente como você me faz-. E se eu não posso, paciência, o que eu quero de verdade é que você encontre alguém que possa. Mesmo que isso vá doer meu lado egoísmo, o que eu quero de verdade é sorrir meu lado amor. O lado egoísmo eu mato, sufoco, eu não ouço, só pra ter certeza de nunca desejar que você seja nada diferente do que é. Porque o lado amor te acha indescritivelmente perfeito. Porque é o lado amor que me tira um sorriso toda manhã pensando que a vida faz algum sentido ou tem algum brilho ou me dá algo pelo quê esperar -mesmo que o lado egoísmo diga "não espere"-. Eu espero, sim, mas não se preocupe, contradizendo meus discursos chorões, esperar me faz mais bem que mal. Eu espero que você saiba, já que eu provavelmente nunca vou te dizer, que eu penso em você todo dia antes de dormir. E por mais clichê que isso soe, é um sentimento tão lindo que vale. Vale ser clichê só pra gritar a alegria que é. Todo dia antes de dormir eu por alguns minutos fico ligeiramente inconsciente pelo sono e ligeiramente atordoada pelo amor enquanto te imagino deitado no meu lado como se você fosse estar mesmo ali um dia. E mesmo que não, não importa. Te imaginar ali já me faz feliz, mesmo que numa alegria incompleta, mesmo que numa alegria as vezes sufocante e quase triste.
Eu te amo, e talvez de uma forma diferente do que você escute quando eu digo essa frase. Eu te amo daquela forma que eu te descrevi um dia minha crença do que é amor. Eu te amo da forma mais pura que eu consigo, e te amo tanto que queria um amor mais puro ainda, só pra nunca desejar que você fosse diferente do que é. Só pra desejar que você seja feliz mesmo que muito longe de mim. Só pra matar meu lado egoísmo e me cobrir inteira do outro lado, do que me faz sorrir toda manhã esperando algum sinal de vida seu. Algum sinal de vida minha.