Jorge Antosko
Fim da Feira
As tendas velhas que se recolhem,
esvaziam-se as cestas de frutas.
Tudo se tolhe em toalhas e trapos;
postes emanam luzes fajutas.
Fregueses regressam com suas compras,
saltimbancos cessam as cambalhotas.
Vendedores, cismados, se apressam -
contam dinheiro, nota por nota.
Era o fim da feira na cidade,
a praça retoma o seu espaço,
ao passo em que a feirinha se evade
junta ao Sol, que cai no fim da tarde.
Ode ao Vidro
O vidro que estilhaça
estraçalha-se em pedaços,
estirando-se em migalhas,
espalhando-se no espaço.
Extraindo-se de si,
entrega-se à sua quebra,
segrega-se aqui e ali —
porque caco não tem regra.
As simples luzes de astros tristes
Barcos aportam a mastros ristes
Já outros partem em velas mestras
Buscando terras que inexistem
Divagam em ondas vagarosas
Em vezo evadem suas garrafas
Entonam rezas poderosas
Deflagram então sua desgraça
Perpétua é a ideia de ser livre
Porque promessas não bastaram
Da proa à popa à prosa e verso
De tão imersos se afogaram
Noite em Astana
Na noite chuvosa, clamo
Pela tua presença.
A saudade é imensa -
Maior que a própria distância.
Aqui, neste continente,
No extremo Oriente,
Enxergo o teu retrato
E a desejo, com ânsia,
Entre os fusos horários,
Que me infundem a lembrança;
Eu me afundo no choro,
E longe, você descansa.
Soneto da Carta ao Araújo
No teu quarto quieto, lotado de sonhos
Que tu vivencias, na mais sóbria graça,
Te digo, meu amigo: o tempo passa
Enquanto vivemos dias enfadonhos.
Depois de nós, tudo seguirá o mesmo,
Assim como já eram as coisas antes,
Hão de haver boêmios e delirantes
Para ocuparem os bares, a esmo.
Mas sonhador como tu, não haverá igual:
Seja nesta, ou em qualquer galáxia,
És para sempre, excêntrico e único.
E me é consolo, saber que ao final
Serás tu a árvore asclepidácea
A enfeitar meu esquecido túmulo.
Soneto do Amor Maior
Ao meu amor maior, que me guia,
Trago-lhe, aos prantos, minhas angústias.
Só tu és quem ouve as minhas súplicas -
Quero viver em tua alegria.
Vem de ti a luz que me irradia,
Que finda as cóleras, tão múltiplas.
Mesmo que venhas às horas últimas,
Preenches o vazio de todo um dia.
E quando as tristezas triunfarem
Sendo a solidão absoluta,
Hei de me tranquilizar, sabendo:
Elas não tardarão a cessarem;
Cada lágrima será enxuta
Quando ao teu lado eu estiver vivendo.