Ana Jácomo

201 - 225 do total de 269 pensamentos de Ana Jácomo

‎Quando eu deixei de olhar tão ansiosamente para o que me faltava e passei a olhar com gentileza para o que eu tinha, descobri que, de verdade, há muito mais a agradecer do que a pedir.

Quem dera eu aprendesse a viver cada dia como se fosse o último. O último pra esquecer tolices. O último para ignorar o que, no fim das contas, não tem a menor importância. O último para rir até o coração dançar. O último para chorar toda dor que não transbordou e virou nódoa no tecido da vida. O último para deixar o coração aprontar todas as artes que quiser. O último para ser útil em toda circunstância que me for possível. O último para não deixar o tempo escoar inutilmente entre os dedos das horas.

Ser sensível nesse mundo requer muita coragem. Muita. Todo dia. Esse jeito de ver além dos olhos, de ouvir além dos ouvidos, de sentir a textura do sentimento alheio, tão clara, no próprio coração. Essa sensação, às vezes, de ser estrangeiro e não saber falar o idioma local, de ser meio ET, uma espécie de sobrevivente de uma civilização extinta. Essa intensidade toda em tempo de ternura minguada. Esse amor tão vivido em terra em que a maioria parece se assustar mais com o afeto do que com a indelicadeza. Esse cuidado espontâneo com os outros. Essa vontade tão pura de que ninguém sofra por nada. Esse melindre de ferir por saber, com nitidez, como dói ser ferido. Ser sensível nesse mundo requer muita coragem. Muita. Todo dia.

Ana Jácomo

Nota: A autoria do texto tem vindo a ser erroneamente atribuída a Emmanuel.

Na fé, eu sou capaz de me dizer, com amorosa humildade, que grande parte das vezes eu não sei o que é melhor para mim. Eu não sei, mas Deus sabe. Eu não sei, mas minha alma sabe. Então, faço o que me cabe e entrego, mesmo quando, por força do hábito, eu ainda dê uma piscadinha pra Deus e lhe diga: “Tomara que as nossas vontades coincidam”. Faço o que me cabe e confio que aquilo que acontecer, seja lá o que for, com certeza será o melhor, mesmo que algumas vezes, de cara, eu não consiga entender.

Dizemos amar, mas estamos só dizendo. Amor tem outro cheiro. Outra natureza. Outra frequência. Outro chamado. É para ser luz pra dois, com todas as sombras de cada um.

Eu sento na beira da praia dos seus olhos, incontáveis vezes, perto ou longe de você, só pra apreciar de novo. Porque o amor é isso também: essa admiração que não cansa de se reinventar a cada onda.

Derradeiro

Um dia alguém me contou que quando era criança chorava
quando ouvia ou lia a palavra derradeiro.
Acolhi com ouvido de poesia. E sorri, dentro,
com ternura por essas singularidades lindas de cada um.
Mas sorri muito mais porque adulta,
diante de cada experiência derradeira que a vida desembrulha,
geralmente choro também.
Às vezes, à beça, por outros tantos instantes derradeiros.

Memória de choro é vasta.

‎"...Se a história não me agrada, preciso aprender a reescrevê-la até que se torne parecida com a ideia que passa pelo meu coração. O roteiro só muda quando eu assumo a minha responsabilidade por ele e me trabalho para ser capaz de modificá-lo."

Tomara que apesar dos apesares todos, a gente continue tendo valentia suficiente para não abrir mão de se sentir feliz. As coisas vão dar certo. Vai ter amor, vai ter fé, vai ter paz – se não tiver, a gente inventa.

Abençoadas sejam as surpresas risonhas do caminho. As belezas que se mostram sem fazer suspense. As afeições compartilhadas sem esforço.

Abençoadas sejam as surpresas risonhas do caminho.

Cheguei à janela e olhei para o céu, um movimento que faço várias vezes até sentir o meu dia concluído e esperar a vinda do novo. Entendi, de repente, porque gosto tanto da noite, desde sempre: pelo silêncio dela. Eu sei que o silêncio pode ser ameaçador. Sei que muitas vezes põe pra tocar, no volume mais alto, músicas que nossos sentimentos cantam e que falam de coisas que a gente nem sempre quer ouvir. Mas o silêncio é também alimento. O silêncio é também descanso.

Amor verdadeiro
É fácil amar o outro na mesa do bar, quando o papo é leve, o riso é farto e o chopp gelado.
É fácil amar o outro nas férias, no churrasco, nas festas ou quando se vê de vez em quando.
Difícil é amar quando o outro desaba, quando não acredita em mais nada e entende tudo errado. Quando paralisa, perde o charme, o prazo, a identidade e a coerência. Nessas horas que se vê o verdadeiro amor, aquele que quer o bem acima de tudo. É esse o amor que dura para sempre, na verdade, esse é o único tipo que pode ser chamado de amor.

Ana Jácomo

Nota: Trecho de um texto de Ana Jácomo, muitas vezes atribuído erroneamente a Pedro Bial.

Avaliando o cansaço

Chega uma hora, uma bendita hora, em que acontece algo que, embora não aparente de imediato, pode ser a melhor notícia da temporada, a mais promissora, desde que não nos estreite os olhos, nem congele o coração: a gente se cansa.
De algumas coisas. De um monte delas. Das ilusões.
De se apertar pra caber em autoimagens que, na maioria das vezes, não têm nada a ver com a gente. Cansa de ficar à mercê da felicidade que parece acontecer só de fora pra dentro.
Nem todo cansaço é ruim.
Há cansaço que destranca. Há cansaço que liberta. Há cansaço que é quase descanso, um pouquinho só dali. Há cansaço que é lume, depois de tanto suposto incansável breu. Há cansaço que cria espaço para harmonizarmos nossos passos com o caminho da nossa alma outra vez, o ego momentaneamente vencido. Há cansaço que sorri para as nossas dores, conhecedor da mágica capaz de fazê-las afrouxar: soltar.
Nem todo cansaço é ruim.
Há cansaço que cria intervalos preciosos, férteis de transformação. Há cansaço que nos torna mais parecidos com nós mesmos, de novo ou pela primeira vez, e mais próximos do lugar em nós onde pulsa o que nunca se cansa. Há cansaço que nos leva ao instante, em que, exaustos, reverenciamos a vida e dizemos para ela mais ou menos assim:
- Entrego o meu cansaço, farta de perceber que, por mais que eu tente, não tenho controle com relação a tudo àquilo que, de verdade, importa. Eu me rendo à sua sabedoria, que me habita, embora tantas vezes eu esqueça. Por favor, me ensina a simplesmente fluir com você. Por favor, me ensina a simplesmente fazer florir as sementes que você me confia. Por favor, me ensina a simplesmente ser.
De preferência, sem muito cansaço.

A gente precisa é de um olhar fresco, que não envelhece, apesar de tudo o que já viu. É de um amor que não enruga, apesar das memórias todas na pele da alma. A gente precisa é deixar de ser sobrevivente para, finalmente, viver.

“Algumas pessoas se destacam para nós. Não há argumento capaz de nos fazer entender exatamente como isso acontece (...) A doçura de que é feito o olhar que lhes dirigimos. (...) Não importa quando as encontramos no nosso caminho. Parece que estão na nossa vida desde sempre e que mesmo depois dela permanecerão conosco.”

Desejo que encontre maneiras para se fazer feliz no intervalo entre o instante em que cada dia acorda e o instante em que ele se deita pra dormir, porque a verdade é que a gente não sabe se tem outro dia. Que quanto mais passar a sua alma a limpo, mais descubra, mais desnude, mais partilhe, com medo cada vez menor, a beleza que desde sempre você é.

Sei de cor que viver é trabalhoso e que, de vez em quando, parece que o trabalho aumenta mais. Que nessas horas, às vezes a gente sente uma vontade enorme de correr, embora não exista lugar algum para onde possamos ir sem nos levarmos. Estamos o tempo inteiro com nós mesmos e essa é daquelas verdades que não mudam de cara, por mais que o tempo passe e tudo mude. Sei de cor que não importa as diferenças de cenário, de roteiro, de elenco, de trilha sonora, de efeitos especiais, todas as histórias têm algo em comum: o desafio e a graça do aprendizado do amor. É, sobretudo, para aprendermos a amar que estamos aqui. Às vezes, eu esqueço; você também, imagino. Mas a vida, não demora, vem nos lembrar de novo.

Desejo que tudo o que mais lhe importa floresça. Que cada florescimento seja tão risonho e amoroso que atraia os pássaros com o seu canto, as borboletas com as suas cores, o toque do sol com seu calor mais terno, e a chuva que derrama de nuvens infladas de paz. Desejo que, mais vezes, além de molhar só os pés, você possa entrar na praia da poesia da vida com o coração inteiro e brincar com a ideia que cada onda diz.

Conta pra mim de onde a gente se conhece.
De onde vem essa repentina admiração tão perene.
De onde vem o sentimento de que nossas almas dialogavam muito antes dos nossos olhos se tocarem.
Conta por que tudo o que é precioso no seu mundo me parece que já era também no meu.
De onde vem esse bem-querer assim tão fácil, assim tão fluido, assim tão puro.
Conta de onde vem essa certeza de que, de alguma maneira, a minha vida e a sua seguirão próximas, como eu sinto que nunca deixaram de estar.

Vida...
Entrego-te o meu cansaço, farta de perceber que, por mais que eu tente, não tenho controle com relação a tudo aquilo que, de verdade, importa. Eu me rendo à sua sabedoria, que me habita, embora tantas vezes eu esqueça. Por favor, me ensina a simplesmente fluir com você. Por favor, me ensina a simplesmente fazer florir as sementes que você me confia. Por favor, me ensina a simplesmente ser. De preferência, sem muito cansaço.

Conta pra mim de onde a gente se Conhece.
De onde vem a Sensação de que
Você sempre esteve Aqui.

[...]Não sei exatamente em que momento comecei a despertar. Só sei que comecei a lembrar de onde é o céu e a perceber que o inferno é onde a gente mora quando tudo é sono. Comecei a sair dos meus desertos. E a olhar, ainda que timidamente, para todas as miragens, sem tanto desprezo, entendendo que havia um motivo para que elas estivessem exatamente onde as coloquei. Nenhum livro, nenhum sábio, nada poderia me ensinar o que cada uma me trouxe e o que, com o passar do tempo, continuo aprendendo com elas. Dizem que só é possível entendermos alguns pedaços da vida olhando para eles em retrospectiva. Acho que é verdade[...]

“Tem gente que tem cheiro de passarinho quando canta. De sol quando acorda. De flor quando ri. Ao lado delas, a gente se sente no balanço de uma rede que dança gostoso numa tarde grande, sem relógio e sem agenda. Ao lado delas, a gente se sente comendo pipoca na praça. Lambuzando o queixo de sorvete. Melando os dedos com algodão doce da cor mais doce que tem pra escolher. O tempo é outro. E a vida fica com a cara que ela tem de verdade, mas que a gente desaprende de ver.”

"Como acontece com as
pessoas, as plantas vicejam,
crescem com alegria mais notória,
florescem mais rapidamente, quando recebem
a atenção cuidadosa do amor, esse adubo
natural pra toda espécie de vida.
Economizá-lo, portanto, é um
desperdício dos grandes.
Talvez, o maior."