Texto sobre Medo de Mario Quintana
(...)
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo...
Quando se vê, já é 6ª feira...
Quando se vê, passaram 60 anos!
(...)
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio
seguia sempre em frente...
e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.
A morte é que está morta
Ela é aquela Princesa Adormecida
no seu claro jazigo de cristal.
Aquela a quem, um dia - enfim - despertarás...
E o que esperavas ser teu suspiro final
é o teu primeiro beijo nupcial!
- Mas como é que eu te receava tanto
(no teu encantamento lhe dirás)
e como podes ser assim - tão bela?!
Nas tantas buscas, em que me perdi,
vejo que cada amor tinha um pouco de ti...
E ela, sorrindo, compassiva e calma:
- E tu, por que é que me chamavas Morte?
Eu sou, apenas, tua Alma...
Poema transitório
Eu que na Era da fumaça: - trenzinho
Vagaroso com vagarosas paradas
Em cada estaçãozinha pobre
Para comprar
Pastéis
Pés-de-moleque
Sonhos
- principalmente sonhos!
porque as moças da cidade vinham
olhar o trem passar:
eles suspirando maravilhosas viagens
e a gente com um desejo súbito
de ficar ali morando sempre...
Nisto, o apito da locomotiva
e o trem se afastando
e o trem arquejando
é preciso partir
é preciso chegar
é preciso partir é preciso chegar...
Ah, como esta vida é urgente!
... no entanto
eu gostava era mesmo de partir...
e - até hoje – quando acaso embarco
para alguma parte
acomodo-me no meu lugar
fecho os olhos e sonho:
viajar, viajar
mas para parte nenhuma...
viajar indefinidamente...
como uma nave espacial perdida entre as estrelas.
De Gramática e de Linguagem
E havia uma gramática que dizia assim:
"Substantivo (concreto) é tudo quanto indica
Pessoa, animal ou cousa: João, sabiá, caneta".
Eu gosto das cousas. As cousas sim !...
As pessoas atrapalham. Estão em toda parte. Multiplicam-se em excesso.
As cousas são quietas. Bastam-se. Não se metem com ninguém.
Uma pedra. Um armário. Um ovo, nem sempre,
Ovo pode estar choco: é inquietante...)
As cousas vivem metidas com as suas cousas.
E não exigem nada.
Apenas que não as tirem do lugar onde estão.
E João pode neste mesmo instante vir bater à nossa porta.
Para quê? Não importa: João vem!
E há de estar triste ou alegre, reticente ou falastrão,
Amigo ou adverso...João só será definitivo
Quando esticar a canela. Morre, João...
Mas o bom mesmo, são os adjetivos,
Os puros adjetivos isentos de qualquer objeto.
Verde. Macio. Áspero. Rente. Escuro. luminoso.
Sonoro. Lento. Eu sonho
Com uma linguagem composta unicamente de adjetivos
Como decerto é a linguagem das plantas e dos animais.
Ainda mais:
Eu sonho com um poema
Cujas palavras sumarentas escorram
Como a polpa de um fruto maduro em tua boca,
Um poema que te mate de amor
Antes mesmo que tu saibas o misterioso sentido:
Basta provares o seu gosto...
O vento vinha ventando
Pelas cortinas de tule.
As mãos da menina morta
Estão varadas de luz.
No colo, juntos, refulgem
Coração, âncora e cruz,
Nunca a água foi tão pura...
Quem a teria abençoado?
Nunca o pão de cada dia
Teve um gosto mais sagrado.
E o vento vinha ventando
Pelas cortinas de tule...
Menos um lugar na mesa
Mais um nome na oração.
Da que consigo levara.
Cruz, âncora e coração
(E o vento vinha ventando...)
Daquela de cujas penas
Só os anjos saberão !
O lampião
A janelinha de acetilene do lampião da esquina tinha uma luz que não era a do dia nem a da noite... a mesma luz que banhava as pessoas, animais e coisas que a gente via em sonhos... aquela mesma luz que deveria enluarar, mais tarde, as janelas altas do outro mundo...
( in: Sapato Florido, 1948.)
Pessoa muito respeitada, amigável, generosa
e fácil de lidar. Mas quando o assunto é o
seu dinheiro, seu tempo ou suas preocupações,
nada ou ninguém é mais importante. Isso
demonstra que deve aprender muito ainda
sobre o crescimento da alma. Mas
controlando esse egoísmo e usando mais
de diplomacia ao tratar com as pessoas,
conseguirá avançar muito no seu caminho.
Dorme, ruazinha...
É tudo escuro...
E os meus passos, quem é que pode ouvi-los?
Dorme o teu sono sossegado e puro,
Com teus lampiões, com teus jardins tranquilos.
Dorme...
Não há ladrões, eu te asseguro...
Nem guardas para acaso persegui-los...
Na noite alta, como sobre um muro,
As estrelinhas cantam como grilos...
O vento está dormindo na calçada,
O vento enovelou-se como um cão...
Dorme, ruazinha...
Não há nada...
Só os meus passos...
Mas tão leves são
Que até parecem, pela madrugada,
Os da minha futura assombração...
HAVIA
Havia naquele tempo tanta coisa,
Tanta coisa que subiria depois como um balão azul
Quando eu precisasse de um pretexto urgente para não me matar...
Havia
A que passava cuidadosamente os meus poemas a ferro
(e nisso eu vejo agora a maior poesia deles...)
Havia a que sabia fingir que me escutava,
Que parecia beber até, com seus grandes olhos,
Os meus solilóquios
(eram tão chatos que só podiam ser solilóquios mesmo...)
E havia, entre todas,
A Eleita,
A que cortava as unhas da minha mão direita
(agora tenho que recorrer a profissionais...)
E havia, entre as demais,
A que ficou não sei onde esquecida...
MARIO QUINTANA In: Baú de Espantos
Criticam tudo, e quero dizer mesmo tudo, sobre mim: o meu comportamento, a minha personalidade, as minhas maneiras; cada centímetro de mim, da cabeça aos pés, dos pés à cabeça, é objeto de mexericos e debates. São-me constantemente lançadas palavras duras e gritos, embora eu não esteja habituada a isso. Segundo as autoridades definidas, eu devia sorrir e aguentar.
Quem faz intrigas sobre a vida alheia quer ter algo de sua autoria, uma obra que se alastre e cresça, que se torne pública e que seja muito comentada. Algo que lhe dê continuidade. É por isso que fofocar é uma tentação. Porque nos dá, por poucos minutos, a sensação de ser portador de uma informação valiosa que está sendo gentilmente dividida com os outros. Na verdade, está-se exercitando uma pequena maldade, não prevista no Código Penal. Fofocas podem provocar lesões emocionais. Por mais inocente ou absurda, sempre deixa um rastro de desconfiança. Onde há fumaça há fogo, acreditam todos, o que transforma toda fofoca numa verdade em potencial. Não há fofoca que compense. Se for mesmo verdade, é uma bala perdida. Se for mentira, é um tiro pelas costas.
Um homem jamais pode entender o tipo de solidão que uma mulher experimenta. Um homem se deita sobre o útero da mulher apenas para se fortalecer, ele se nutre desta fusão, se ergue e vai ao mundo, a seu trabalho, a sua batalha, sua arte. Ele não é solitário. Ele é ocupado. A memória de nadar no líquido aminótico lhe dá energia, completude. A mulher pode ser ocupada também, mas ela se sente vazia. Sensualidade para ela não é apenas uma onda de prazer em que ela se banhou, uma carga elétrica de prazer no contato com outra. Quando o homem se deita sobre o útero dela, ela é preenchida, cada ato de amor, ter o homem dentro dela, um ato de nascer e renascer, carregar uma criança e carregar um homem. Toda vez que o homem deita em seu útero se renova no desejo de agir, de ser. Mas para uma mulher, o climax não é o nascimento, mas o momento em que o homem descansa dentro dela.
Como me sinto? Como se colocassem dois olhos sobre uma mesa e dissessem a mim, a mim que sou cego: isso é aquilo que vê, essa é a matéria que vê. Toco os dois olhos sobre a mesa, lisos, tépidos ainda, arrancaram há pouco, gelatinosos, mas não vejo o ver. É assim o que sinto tentando materializar na narrativa a convulsão do meu espírito, e desbocado e cruel, manchado de tintas, essas pardas escuras do não saber dizer, tento amputado conhecer o passo, cego conhecer a luz, ausente de braços tento te abraçar.
As pessoas com mais idade já têm opiniões formadas sobre todas as coisas e já não vacilam, não hesitam perante as dificuldades da sua vida. A nós, os jovens, custa-nos manter-nos firmes nos nossos pareceres por vivermos numa época em que mostra pelo seu lado mais horroroso, em que se duvida da verdade, do direito, de Deus.
E repito: andei pensando coisas sobre amor, essa palavra sagrada. O que mais me deteve, do que pensei, era assim: a perda do amor é igual à perda da morte. Só que dói mais. Quando morre alguém que você ama, você se dói inteiro - mas a morte é inevitável, portanto normal. Quando você perde alguém que você ama, e esse amor - essa pessoa - continua viva, há então uma morte anormal. O NUNCA MAIS de não ter quem se ama torna-se tão irremediável quanto não ter NUNCA MAIS quem morreu. E dói mais fundo - porque se poderia ter, já que está vivo. Mas não se tem, nem se terá.
Eu sou quase uma psicóloga para as pessoas. Dou minha opinião sobre o que acho que elas deveriam fazer, dou conselhos, sugestões. Mas com você eu não consigo. Talvez porque tudo o que eu queira te falar é “me abraça, vem pro meu lado, fica comigo porque eu nunca teria coragem de te machucar”.
Certezas
Não quero alguém que morra de amor por mim...
Só preciso de alguém que viva por mim, que queira estar junto de mim, me abraçando.
Não exijo que esse alguém me ame como eu o amo, quero apenas que me ame, não me importando com que intensidade.
Não tenho a pretensão de que todas as pessoas que gosto, gostem de mim...
Nem que eu faça a falta que elas me fazem, o importante pra mim é saber que eu, em algum momento, fui insubstituível...
E que esse momento será inesquecível...
Só quero que meu sentimento seja valorizado.
Quero sempre poder ter um sorriso estampando em meu rosto, mesmo quando a situação não for muito alegre...
E que esse meu sorriso consiga transmitir paz para os que estiverem ao meu redor.
Quero poder fechar meus olhos e imaginar alguém... e poder ter a absoluta certeza de que esse alguém também pensa em mim quando fecha os olhos, que faço falta quando não estou por perto.
Queria ter a certeza de que apesar de minhas renúncias e loucuras, alguém me valoriza pelo que sou, não pelo que tenho...
Que me veja como um ser humano completo, que abusa demais dos bons sentimentos que a vida lhe proporciona, que dê valor ao que realmente importa, que é meu sentimento... e não brinque com ele.
E que esse alguém me peça para que eu nunca mude, para que eu nunca cresça, para que eu seja sempre eu mesmo.
Não quero brigar com o mundo, mas se um dia isso acontecer, quero ter forças suficientes para mostrar a ele que o amor existe...
Que ele é superior ao ódio e ao rancor, e que não existe vitória sem humildade e paz.
Quero poder acreditar que mesmo se hoje eu fracassar, amanhã será outro dia, e se eu não desistir dos meus sonhos e propósitos, talvez obterei êxito e serei plenamente feliz.
Que eu nunca deixe minha esperança ser abalada por palavras pessimistas...
Que a esperança nunca me pareça um NÃO que a gente teima em maquiá-lo de verde e entendê-lo como SIM.
Quero poder ter a liberdade de dizer o que sinto a uma pessoa, de poder dizer a alguém o quanto ele é especial e importante pra mim, sem ter de me preocupar com terceiros... Sem correr o risco de ferir uma ou mais pessoas com esse sentimento.
Quero, um dia, poder dizer às pessoas que nada foi em vão...
Que o amor existe, que vale a pena se doar às amizades, às pessoas, que a vida é bela sim, e que eu sempre dei o melhor de mim... e que valeu a pena.
DEFINIÇÕES
Saudade é quando o momento tenta fugir da lembrança para acontecer de novo e não consegue.
Lembrança é quando, mesmo sem autorização, seu pensamento reapresenta
um capítulo.
Angústia é um nó muito apertado bem no meio do sossego.
Preocupação é uma cola que não deixa o que ainda não aconteceu sair de seu pensamento.
Indecisão é quando você sabe muito bem o que quer, mas acha que devia querer outra coisa.
Certeza é quando a ideia cansa de procurar e para.
Intuição é quando seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.
Pressentimento é quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.
Vergonha é um pano preto que você quer pra se cobrir naquela hora.
Ansiedade é quando sempre faltam muitos minutos para o que quer que seja.
Interesse é um ponto de exclamação ou de interrogação no final do sentimento.
Sentimento é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.
Raiva é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes.
Tristeza é uma mão gigante que aperta seu coração.
Felicidade é um agora que não tem pressa nenhuma.
Amizade é quando você não faz questão de você e se empresta pros outros.
Culpa é quando você cisma que podia ter feito diferente, mas, geralmente, não podia.
Lucidez é um acesso de loucura ao contrário.
Razão é quando o cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.
Vontade é um desejo que cisma que você é a casa dele.
Paixão é quando apesar da palavra "perigo" o desejo chega e entra.
Amor é quando a paixão não tem outro compromisso marcado.
Não... Amor é um exagero... também não.
Um dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um descontrole, uma necessidade, um desapego?
Talvez porque não tenha sentido, talvez porque não tenha explicação,
Esse negócio de amor, não sei explicar.
Nota: Versão adaptada de Link
Soneto de Fidelidade
De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
Sorri quando a dor te torturar
E a saudade atormentar
Os teus dias tristonhos vazios
Sorri quando tudo terminar
Quando nada mais restar
Do teu sonho encantador
Sorri quando o sol perder a luz
E sentires uma cruz
Nos teus ombros cansados doridos
Sorri vai mentindo a sua dor
E ao notar que tu sorris
Todo mundo irá supor
Que és feliz
Nota: Versão brasileira da música "Smile", escrita por João de Barro (Braguinha) e gravada, entre outros, por Djavan. A melodia foi composta por Charles Chaplin em 1936, tendo John Turner e Geoffrey Parsons adicionado posteriormente a letra original.
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