Ruth Rocha Amor
Alforria
Medo
senhor de escravos,
o dono da casa grande
grande coisa seria
se a mesa virasse
e a gente tivesse
o poder que te cala
pra mandar na hora
e sem demora
você medo pra senzala.
Vento Sul
E toda a grama
E flor de jardim
E pedra
Borboleta,
Cor do som
Zunido bom
E o ônibus
Nem veio
Será porque foi
vento que acelerou?
Sal que nada
Sol assim
E mar, olhada
Tom de sono
E o estômago
Embrulhou,
Tem, mas
Acabou.
Vivas ao desacelera
Observo com imensa admiração os calmos das calçadas. De passos mansos e pernas harmônicas. Parecem até serem donos do tempo, do tempo deles.
Hoje não há situação mais luxuosa e cobiçada do que andar devagar. E não está, tal fato, relacionado somente ao tempo. Muitos de nós desaprendemos a andar sem correr.
Aproveitar o caminho sem franzir a testa e olhar o relógio.
Ir até lá, apenas, sem temer o atraso.
Além de controlarmos mal o nosso relativo tempo, sofremos dessa doença moderna e silenciosa: pressa.
O maior sintoma se mostra quando já tendo terminado nossos compromissos, voltando de algum lugar, ainda assim caminhamos rápido. Como se fosse bonito, como se fôssemos máquinas. A vocês desacelerados mesmo em meio ao caos cotidiano; toda a minha admiração.
Quem lamenta a falta de oportunidades, desconhece que pequenas portas podem levá-los a grandes aposentos
As pessoas só podem te ensinar até certo ponto, depois disso você precisa ir atrás, transcender o seu conhecimento
CANTIGA DE GALO
Ê, vida, eu ainda gosto muito de ti.
Tanto e mais que de mim, que sou
Remendos sem necessidades
Porque com a mesma roupa
Que me destes eu vou.
Não minto a ti quando digo: amo
Mas não quero repetir eternizado
E passar o tempo pensando em ti.
Estes pensamentos em, só, em mim
Por que a qualquer direção
Eu me ocupo de ti, roçando
As tuas mãos, esclarecidas
Esquecido de ti nos afazeres.
Eu sou eu porque és vida.
Por ti caminho e corto desvios
Nas estradas de ainda
Das quais nada conheço
Que penso carregado
Como estará a vinda
Se algum passo parti
Ou se outros deixei plainados.
Vida, vida, me prendestes um dia
Por um cordão de em mim
Atado, tive dias assim
Conduzido, puxado por ti
E nos meus movimentos
Nos que penso verdadeiro
E nos que bobeei quando podia te alcançar.
Fostes tu vida, com tua didática
E ainda não queres ser
Uma chispa maravilhosa.
VISÃO
Não passa um dia a cantilena dos versos.
E todas as flores do mundo passam de mãos
O valor do amor e do seu verso
Acompanham-nos até o declive da finura clara.
Embriagados de amor lá do futuro, o medo
Que aplaca as estruturas
Dos coliseus, acaso de outrora.
Como é suscetível o amor
Se há a timidez por anseio de agora
As estações da escada até o nevoento
Vão mudando de tamanho e cores.
Quando se faz do coração um lindo invento
Com a demonstração de sentimentos bons.
A matinal procura, escurece e finda.
E o prazer pelo amor retoma o seu brilho
Conluiado com o que não se tinha falado
Mas que aparece como uma paz
E tudo fixo no movimento das retinas.
CONFESSO
Tornar-me-ei em outra pessoa
Em tudo igual a quem já sou
Mas é por apego a isto que não tive,
E aversão que sei é de mim que sou, vou
Experimentar os mesmos frios
De todas as madrugadas passadas
E os meus sóis me solidificarão nas estradas
Por onde já passei disperso
No mesmo passo sem um amor.
E se acaso algo eu queira mudar
Só acertarei fazer-me, ser como agora
A epiderme indolente, e pelos meus olhos
Destilarei espirros e chamas de nuvens
Mirando o mais distante horizonte.
São vermelhos os meus indutores
E a minha saudade vinculada a ti
Foi chapiscada de um verde, engano
Uma cor que não olhei e não sei o nome.
Quando Deus dá, dá o começo
Como uma aranha que ata o ponto
Inicial de sua teia tenebrosa
Da forma dita, existe esse ponto
Pelo qual nos adolescemos, nós.
E seus começos, no nosso choro inicial
E aí já paramos a ver o lenço
E contar amarguras e dores, como foi.
Este não é o amor que penso
Talvez me agradem os audaciosos, sinceros
Coisas novas começadas comigo, em mim.
A MOÇA E A RELVA
A moça canta e sua tristeza enfeia
Preenche o momento e os arrabaldes
De sua candura inebriada
E ausenta-se da forma como estava
Apanhando uma cesta de rosas
E o tempo de sua alegria
É o mesmo tempo das rosas.
Um andamento que não se prepara
E anda sequentemente por todas as estações.
Sabe a linda moça que do seu retorno
Das nuvens onde se alojou.
Lá reconheceram a sua voz
E as músicas que cantava.
Por ser repetitivo o tempo
Contado à maneira como se quer
A moça linda dá-lhe o andamento
De quando volta para a casa
Atestada de flores, no movimento
Diferente quando emergiu a altura de cima
O céu e cada estrela que lhe saudaram.
Névoa rara, rogação de paz
Concórdia no seu amor andarilho
Que todos os dias vai às campinas
Nos tarjes quase sempre iguais
Que não é porque é pobre, não tem
É que lhe caem muito bem
Lhe embelezando mais
Os seus vestidos dos varais.
