Ruth Rocha Amor

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FAROLEIRO

Eu faço versos como quem
Num farol, um plantonista,
Vê o céu muito além
E perto de mim uma vista.

Se vestem meus versos de espumas,
Uma nudez quase mostrada,
E os barcos que olho enfumam
Suas velas na alvorada.

Quanto mais claro vejo o amor,
Quanto mais densa a letra escoa.
Amor tem de ser motivo, uma dor.

Quanto mais turvo olha-me o vazio,
Mas me transformo em amor,
Meus poemas são desvarios.

Inserida por naenorocha

EU E DEUS

Se me lembro alguma coisa pedi a Deus,
Que me deu a boca e antes de abri-la prometeu,
Que quem pedir mais leva, os cofos
Que se teceu.

Se me anina esta proximidade dele,
Muito mais me santifica pisar seus mesmos rastros,
E quando só, penso está sozinho, deste.
Eu me aceno, na pressa de Deus.

E o que me anima é o mesmo acima.
Autoriza o sonho, relaxa com a rima,
Deixa-me à vontade, para ser saudade.

Para ser da terra, o passo que eu escolher
Se quero viver, terei de morrer.
É só valer a vossa vontade.

Inserida por naenorocha

Falar com Deus é muito simples. Consiste em ficarmos diante dEle, apenas O contemplando, pois tudo o que queremos falar Ele já sabe no silêncio e na mesma calma Ele se fará ser ouvido, entendido por ti.

Inserida por naenorocha

O SILÊNCIO

O momento esperado, o silêncio das ondas.
O sobressalto que o mar não tem mais para agora
Enseja com a minha coragem e minha própria tormenta
De navega-lo, remando o meu amor
Singrando, faltando-me a visão do porto.
Ainda não me digas
Se pernoito ou sigo
Deixa-me ver teus olhos na manhã
A minha pressa são a claridade nova
A tua boca falando por mim
E o mar não me diz nada assim
Do modo impenetrável
Como via a minha alma
Que já se alenta e se acalma, e se detém
Fintando a tua face docemente
Do que já virou fagulhas
O mar é só um refletor
Uma lembrança mais perto
De todas as manhãs que vão chegando
De todos os sins que de tua boca
Correm no vento e vão se espalhando
Pingando este céu de águas
Molhando os meus olhos de esperança.

Inserida por naenorocha

O POETA

Como não! Ser hoje mesmo
Me agarro nesta caneta
Para um poema dançar
É porque há muitos anos
Você levantava os olhos
Olhou com força pra mim
Depois levantou os braços
Me abraçou tão carinhosa.
Como não... se nem um dia
Pude esquecer-te quimera
Se a função sair batuta
Deveremos a você.
Se assente aqui, faz favor
Neste luar destinado
Às pessoas de destaque
No lugar de honra mesmo.

Inserida por naenorocha

TEMPO

O tempo tece a roupa que vestimos
É o destino suas mãos habilidosas,
Que em tudo muda os feitios, as aparências.
E o acabamento, a amarração firme
Dos pontos atravessados, ponto a ponto.
É este denominado assim porque,
Não é sujeito e também sujeito a nada
Mas tudo rege elevado da gente
E de cada um sente tirar, sente faltar.
Não é preciso um tratado de filosofia
Pra se chegar à conclusão efusiva
Que uma tesoura corta uma lágrimas
E que uma agulha segura a mão
De acalmar, de diminuir a enxurrada
O tempo urde, enquanto o tear manipula
E a catapulta armada investe-nos
À vontade é atravessar desertos,
Sobrevoar mares, ir mais que o tempo
Dele se iludir, e se enganar de novo.
Caçadas dentro de mim, já risquei fósforos
Iluminado o teu olhar me aquieta
Quando me diz é por ali a estrada,
Sinto-me desmotivado, me sinto imortal.
Se o tempo esconde os presságios bons
Os alentos das dores, que não nos põe na mão,
As duas feridas, de uma ferida a outra
Quatro chagas dissipando-se nos dois lados.
O tempo impune, não sei o quê,
Aprendi chamá-lo com este nome falso
Mas que existe e na passagem rouca
Pensa-se tudo, se corre da estrada.

Inserida por naenorocha

PEDIDO

Uma coisa peço a Deus, e peço incessantemente,
Ser na minha velhice o mesmo moço que sou
Não com o mesmo viço, os olhos no mesmo brilho,
Não com a desenvoltura física,
Com as mãos pesadas de agora,
Com os mesmos cabelos na mesma cor,
Não com a mesma voz altiva,
O andar desenvolto, com os mesmos anos que conto,
Tampouco que o tempo pare para que eu permaneça só,
Com o mesmo olhar malicioso,
Com as ambições que alimento,
Não quero ser o velho renitente contra os feitos da vida,
Não ser jovem ardente, de sonhos imediatos, meus,
Nem desejar que o mundo me veja como um prodígio,
Alguém que rompeu as leis e permanece,
Incólume às intempéries do tempo.
O que peço a Deus e já faço inconscientemente,
É ser capaz das mesmas boas ações,
Dos sonhos, do bem querer, da alegria
Que sinto com a alegria dos outros,
É ser este mesmo moço formoso,
Preparado pra declinar.

Inserida por naenorocha

LINDEZA

A vida é bonita
E é luminosa a rosa no seu cheiro e sua cor.
A borboleta é estrema
É de uma boniteza a mata
No dia entardecedor.
É lindo o amor demonstrado, puro
Como são belos os olhos que o constata perto.
É pulcro o nascer de cada estrela
E é esplendoroso quando chove serenoso.

É bonita a naturalidade de uma mulher
O que se põe num pedestal sob sua medida
E é linda a ave cantando na copa da árvore.
Como são lindos os africanos na sua cor noturna
Envolta de vestes vestes estampadas
da mesma beleza ver-se o ocidental sobre seus saltos altos.

É de encher os olhos uma criança nascendo
É de merejar os olhos o rosto da mãe, preparada para amar.
É notável o verde de quem os olhos se enchem da mesma cor
A relva naturalmente exalada verde
E é abissal a beleza dos animais quietos pastando.

É bonita a consistência da força de Deus,
Como são lindos os seus anjos benfazejos.
É bonito se olhar a fundo, que em tudo tem beleza
E a lindeza está em se olhar e ver tudo bonito.

E bonito tudo
Como é lindo o nada em seu momento
Porque dele tudo é originado.
É bonito o cheio
E o vazio explícito, depósito de algo bom
É bonita a pureza com que falam os homens, dizendo a verdade,.
E é linda a verdae esclarecedora do homem íntegro.

É bonito o terço
É linda a ladainha
E é lindo o sermão do padre versando Deus.

Inserida por naenorocha

MEU PEDRO

Meu filho

Pedro, naturalmente tu nascestes lindo
Principalmente
Os teus olhinhos rindo
Pedro, tu ris quando choras.

São tuas a fauna e a flora brasileira
Deus te deixou este legado inteiro.
Da mata em canto os pássaros trigueiros.

Ele espera agora que inventes a paz
Ninguém mais sabe, e os que tentaram jazem.
Mas tens de sobra, amor, vontade, faz.

Está escrito que seria mesmo tu este menino
Que criaria os versos e as rimas
Tocar as alma com este cavaquinho
Feitos por mim, bom só um sonhador.

Inserida por naenorocha

CHEGADA

Apeio do caminhão de paixões e sonhos
Possivelmente conduzido por Deus.
Senti uma tristeza cobrindo os telhados
As cigarras tecendo a tarde murada
O trovão quietou as cordas do piano.
Aparece repentinamente o arco-íris
Pacto aleatório entre Deus e os homens
Sem a confirmação da benzedura divina
Paira sobre os apenados, mendigos, marginais
Sobre os desenganados tristonhos..
De todos os cantos de mim
Rebenta um dedo terribilíssimo a me apontar
Porque sem os notar não faço conta
Das sobras terminais do mundo.
O céu agora se transfigura, em branco puro.
Céu pintado, que escorria tinta.
Céu sempre futuro e desesperançoso
E como são necessários
Estes sofrimentos de planos desiguais.
E do que mesmo eu me lembre?
Só destes puxados caranguejos da vida.

Naeno

Inserida por naenorocha

INFÂNCIA

Quando eu era menino
A vida era minha namorada.
E foi o tempo da melhor amada.
A vida também era menina,
E brincávamos de viver,
Desfazíamos tudo
Só para acomodar de novo.
Tínhamos tempo para tudo,
Até que a vida e eu fomos mudando
Eu me esticando
E ela se encurtando.
E por desavença, numa dessas brincadeiras,
Bati nela com uma cadeira,
E desencadeou-se um desencanto.
Duas caras de espanto.
Do meu lado, eu a desfazia,
Do seu, ela me agoniava
Com seus achaques de pura raiva.
E nunca mais nos demos bem,
Embora nos abracemos todos os dias,
Não passam de normalidades,
Um fala e o outro responde.
De mim, não há um amor que volta,
Dela recebo beijos à toa,
Acho que nos esquecemos, um do outro.

Inserida por naenorocha

FAZ TEMPO

Tanto tempo faz,
Tempo já demais
E este tempo jaz
No meu coração.
Tempo que eu nem conto,
E este contraponto,
Dado em minha vida,
Sem mostrar saídas,
Tempo que me assusto
Dava tanto assunto,
E eu nem sei ligar,
Uma coisa a outra.
Se a vida é autora,
Desse meu penar,
Se a vida tem
A ver com esse desfecho,
O preço é muito mais,
Do que avalio e penso,
O tempo não se ausenta,
E eu larguei de contar.
Contar as desventuras,
Minhas amarguras,
Vou te suportar.

Inserida por naenorocha

UMA TENTATIVA

Revolva-se o bom do tempo,
Todo silêncio.
Estanque-se os batimentos dos corações,
As pancadas das águas no fim do mar,
Silencie a abelha em sua arquitetura
Doce, doce.
Clareia e o mundo guisa, e faz barulho.
Quando não se emudece com o teu grito.
Tempo, para o silêncio,
Ou dá uma trégua
Da comoção de se estar vivo.
Vivo e só.
Morto e vivo, uma contracena,
Mentiras reveladas ao vento. Deus,
Feridas sem o vermelho rubro,
Tampa que não cobre a extinta morada.
De vertentes escorra, repúdio –
Tal como acostumaram a morte.

Inserida por naenorocha

VINTE E QUATRO HORAS

Ontem as vinte e duas horas e quarenta minutos
Horário oficial de Brasília
Eu estava ardendo em febre, suando.
E na tiragem dos meus uis, contados
Uns vinte e tantos mil, falei, quietei
Aos teus ouvidos.
E de febril, de puro amor, o meu remédio
Tomei por tantas horas, em tantos goles
Que me embriaguei. Caí sobre o teu corpo
E amando-te voluptuoso, transpirei
E a febre não passava, passavam as horas
Já pela madrugada, ainda eu te amava.
E pela manhã, à hora da voz do Brasil
Eu te amava.
Em meu delírio, uma poldra branca
De crinas alvas e esvoaçantes
Carregava-me sobre seu dorso.
E eu galopei vinte e quatro horas
Sobre um leito de areia fina.

E nas esquinas por onde andei
Espantava-me o medo, de cair
Por tua cabeça,
Quando te inclinavas a me beijar
Fazendo. Aproximadamente
Um tempo impreciso e gigantesco
Sem que o espólio se passasse.
Eu na tua crina seguro,
E tu em meus flancos grudada.
Amar faz a gente ganhar a medida do tempo,
E se tem ciência dos espaços
E não se perde o tempo, se acha,
Mesmo que estando no silêncio mais escuro,
Como eram as grutas por onde passamos,
E vimos dentro animais atônitos,
Encontrávamos-nos,
Permitíamos-nos
Como os ponteiros dos relógios,
Ora encima, ora embaixo,
Ora não se distingue o prazer do bom,
Quão bom é o prazer das horas.

Inserida por naenorocha

FULGOR

Inquestionavelmente tu
Rosa sobre as outras rosas,
Que sol e vento beijam primeiro
Que à minha boca bate certeira
E os meus olhos, ainda longe,
Avistam-te fulgurosamente
Desta beleza soberba.
Quando te abocanho
Não vejo espinhos
Mas eles já estão mordendo a minha carne.
Trabalho de nada, coisa feita à toa,
De saborear teus lábios
Jamais me cansaria,
Que assim a vida fica boa.
Fico mais, como quem ficasse
Rente a esta imagem linda,
Cativo teu.
De tocá-la enlevam-se minhas mãos
E te colho, lançando dentro de mim
Uma profusão de amor.

Inserida por naenorocha

DETALHE

Era o brilho do teu olhar entre as pessoas
a buscar-me sorridente em cada canto
e a festa esverdeada do encontro.
Detalhe:
Era a piscada alegre
no outro canto da sala cheia
convidando... insinuando aproximar...
Detalhe:
Era teu rosto preocupado
por uma dor ou na tristeza que eu tivesse
era teu sorriso orgulhoso
pela nota dez que fiz no teste.
Detalhe
A tua mão pousada em minha perna na estrada
E a tua voz "boa viagem pra nós",
Acompanhada do beijo que trazia.
Detalhe:
O teu prazer vazado e descarado
Somente por estar na minha companhia.
Detalhe:
O teu abraço no meu erro
E a frase de cumplicidade:
“Tudo bem! Na próxima a gente acerta!”.
Detalhe:
Para mim, não são detalhes
São pequenos feixes de luz
Compondo e enfeitando a nossa história
Pirilampos brilhando na paisagem
Mostrando a vida que deixaste...
Detalhe de eternidade na passagem.

Inserida por naenorocha

VISIONÁRIOS

O teu coração ateu
Dissertava com as mesmas coisas
E a mesma disposição geográfica, o céu.
A dura paixão de Deus,
Hostilidade de sua eternidade
Já neste plano, o mundo igual:
Ódio Americano marcado
Nas teimosias, do teu coração
Latino-americano, África-sem-valor.

Restrito, do plano compreensivo,
Relutou sem se dar conta, o abismo
Que por ele todo tu andarias
Até ao mínimo que te coube
Enquanto os aludidos das capitais
Sabem mais do homem que tu?
Sabes que não.

Nada, de nascimento
Fé, trabalho e sonho
Do teu quinhão difícil
Contrário à morte, lutador.

Da visão tida, de Deus
Dissestes a todos, uma vez
Será sempre, sempre sem fim
A obra inacabável,
A visão turva, ali, do futuro.
Não, nunca será verdade
A forma como nos permitem
De saber do infindável.

Contrastante dessa possessão
Eu te daria o bom descanso
A ti que comes teus próprios sonhos
Na altura desse outro mundo
Que realiza o homem novo
Em partes mais fundas, agora
Com a desocupação do fosso.

Inserida por naenorocha

UM DEUS QUE VIRÁ

Eu pressinto um Deus oculto
Que se vê em todas os pontos mirados.
- Não é o Deus dos vencedores,
O Deus que anda à frente dos exércitos.
Nem o Deus dos caminheiros
Suspenso por uma nuvem densa
Armado de espadas, vidas, amores
Não se investe conta as montanhas
Não tem destaque nos altares.
Entre os paramentos e folheados
Nem no meio dos potentados, engano
Nem nas bênçãos do clero.
É um Deus quase invisível
Que nasce nas minas quentes
Das explorações particualres
Nasce na fome faminta
Nasce da falta de água
E da inversão de vinho em água
Nasce da profunda revolta
Do medo contido nas voltas
Na roda do cargo puxando
Trigo, mandioca, arroz, feijão
Que são dos outros, para eles
Nasce da fé tripudiada.
Ofuscada, mal definida.

É um Deus dos proletários
Atentos, em voz de guerra,
Filhos de outros sofríveis,
Tombados nas guerras civis.
É um Deus dos estudantes
Sem dinheiro para os cadernos
É um Deus dos aprisionados
Em cárceres, em seu poder de vida
Que na quietude cultivam
A linda flor da esperança
É um Deus de homens-libélulas
Com fome, inacabados,
Morando em brechas escuras
Do deserto do nordeste.
É um Deus das expectativas
De padres inconformados
Que não comungam as espadas
Nem incensam os detratores
É um Deus que vem a ser
Feito só de coração
No lastro de terra movediça.

Inserida por naenorocha

TEMPO TEMPO

O tempo continua sua contagem e ninguém sabe,
A que alturas já está, em seu dedilhar acertado,
Se o que me resta ainda sonhar, me cabe
O querer mudar em mim a sorte, que delicado.

Eu ignoro desde quando fazes tuas contas
Mas consciente de que a cada dia aponta,
Essas mudanças que me fazem afrontas,
Pois recontar nos dedos, sabe-se dele pronto.

Ah tempo das discórdias resolvidas, mas
Ah tempo das feridas inda hoje abertas,
Ah tempo destemperado, frágil fugaz,
Considera meus ais, nas tuas contas certas.

Tempo em que posição estais agora, finda,
Em mim o tormento de querer saber de ti,
Mostra-me o teu rosto e verei ainda,
No crepúsculo um vulto a se espargir.

Conta-me de ti, que tudo de nós já sabes,
Acertas tuas contas, o que levastes a mais,
Ou o que deixastes menos, do que a ti cabes
Deixa-me quieto, passa, são só meus ais.

Inserida por naenorocha

TÁXI DE ESTRELAS

Eu encontrei a chave do universo
E às vezes penso
Que tudo é sacramentado.
Eu encontrei você
A chave do meu verso
No motor de um velho carro envenenado.
E ainda sou capaz de achar
Que seus olhos são brilhantes lapidados.

Eu busquei o seu élan de luz
Nos shoppings, galerias
E nas bocas mais secretas da cidade.
Minha fera de pelúcia
Minha lágrima de gim
Meu ritual.

Seja meu mapa astral
Seja bem vinda.
Eu quero mesmo é voar com você
Num táxi de estrelas
Sob o céu, sobre mim.

Inserida por naenorocha