Poemas de Shakespeare o Menestrel
Peço a paz e o silêncio
A paz dos frutos
e a música
de suas sementes
abertas ao vento.
Peço a paz
e meus pulsos
traçam na chuva
um rosto e um pão.
Peço a paz
silenciosamente
a paz, a madrugada
em cada ovo aberto
aos passos leves da morte.
A paz peço, a paz apenas
o repouso da luta no barro das mãos
uma língua sensível ao sabor do vinho
a paz clara, a paz quotidiana
dos actos que nos cobrem
de lama e sol.
Peço a paz e o silêncio.
E a chuva fria cai, cai longamente,
Cheia de perfume das folhas lustrosas,
Cheia de éter, vaporosa,
Cheia de céu...
E a chuva fria cai,
cai docemente.
MARIA DE NAZARETH,
Não me desampare teu amparo,
não me falte a tua piedade,
não me esqueça a tua memória.
Se tu, Senhora, me deixas,
quem me sustentará?
Se tu me esqueces,
quem se lembrará de mim?
Se tu, que és Estrela do Mar
e guia dos desencaminhados,
não me iluminar, onde irei parar?
Não me deixes tentar pelo inimigo,
e se me tentar, não me deixe cair,
e se cair, ajuda me a levantar.
Quem te invocou, Senhora,
que não tenha sido ouvido?
Quem te pediu que não tenha atendido?
É preciso entender que o homem
é um ser em construção.
Esse processo de construção
é lento enquanto a morte é rápida.
Em resumo, as realizações do Salvador, resultantes de seu
ato de tornar-se homem, são de tal tipo e número, que se
alguém deseja enumerá-las, poderia ser comparado ao homem
que olha fixamente para a expansão do mar e tenta contar
todas as suas ondas.
Se estais condenados a ver o triunfo do mal, nunca
o aplaudais; nunca digais do mal ‘isso é bom’;
nunca digais da decadência ‘isso é progresso’;
nunca digais da noite ‘isso é luz’; nunca
digais da morte ‘isso é vida’.
Sorte
Existem 2 trilhões de galáxias e, até este momento, foram descobertos cerca de 150 planetas, pertencendo 8 nosso sistema Solar. Já em nosso planeta, há 6 continentes, 193 países e por volta de 7 bilhões de pessoas. Em aproximadamente 4,54 bilhões de anos de história eu nasci na mesma época, galáxia, planeta, continente e país que você, qual a probabilidade? Meu amor por ti não caberia no Aglomerado de Virgem.
Liberdade
Eu aprendi a viver com a dor da tua ausência, como um sapato apertado, calcei um par de culpa e segui adiante, hoje me livro deste aperto, não poderia deixar passar o dia mais feliz da minha vida sem uma marca, pegadas, descalço de espírito escrevo esse texto.
Eu me faço de surdo para não ouvir meu coração gritar teu nome.
Eu me faço de cego para não te ver quando fecho os olhos.
E assim sigo, fingindo te esquecer.
Viver é uma tortura,
Sem ti, só me resta a saudade. Saudade de ti ao meu lado,
Estou só, acompanhado apenas de minhas loucuras,
Meu coração já não suporta essa dor guardada em silêncio,
As lembranças póstumas do teu amor me deixam às escuras.
Na excitação do Carnaval, em meio à folia,
Me pergunto o propósito das máscaras, com ironia,
Todos se fantasiam com máscaras de alegria,
Mas pode um copo cheio afogar uma alma vazia?
O Eremita
Com lentes tingidas de um brilho sombrio,
Meus olhos, embotados de dor e lágrimas,
Veem o que outros não percebem, no silêncio confinado.
Com olhos que ultrapassam o véu da realidade,
Sou um estranho em minha terra, sem lugar para pertencer,
Amei com a quietude de estrelas esquecidas,
Sonhei com a vastidão de galáxias perdidas,
Mas meu coração é um relicário de esperanças defuntas,
Um navio sem ancoradouro, perdido em um oceano de solitária penúria.
Sou um homem que, em suas próprias marés, se consome e se afoga
E, nas profundezas da mente, se perdeu.
Marginal
Às margens profundas do meu ser, vagueio como um rio agitado sem leito. As palavras, como pesadas pedras, afundam no abissal silêncio impenetrável.
As pobres almas que toquei, como folhas secas outonais, desprendem-se e voam para longe. Desaparecem na bruma do cruel tempo.
Ó rio, sem rumo, sem destino, és espelho da minha própria existência.
Rio sou. E fluí.
Leva-me para além.
Que eu seja a folha seca que flutua em tuas correntezas, que se despede, e que o tempo, implacável, me leve para a outra margem.
Impermanência
Quão alegres são as chegadas, loquazes,
E os prazeres que consigo trazem,
O espírito se incendeia, dança,
Quão tristes são as partidas, silentes,
E os prazeres que consigo levam,
O espírito se dilacera, despedaça.
Ah, estou farto, meu tolo coração, tantas vezes ridículo, deseja pelo dia
Em que os encontros superarão as despedidas. Como uma pessoa a quem lhe impõe a ter a sua desgraça.
Epiderme
Dentro de mim habita o verdadeiro terror,
Onde os monstros se escondem sob a pele,
Revelando a verdade que nos abate,
Não se iludam, aqueles que confiam em nós!
Não há cama que os oculte, pois não se escondem debaixo dela,
Mas por baixo dos lençóis e os seres, onde não há certezas,
Não creio em mim, com certeza, sou um monstro, não mártir, nem herói.
Mediocramente humano, foi minha vida, escravo do que nunca serei
A capacidade humana, essa sempre me aterrorizou mais que fantasmas.
Consagro a nós o desprezo, tudo isso seja o que for que sejas
Aqueles que confiam, não se enganem.
(Des)encaixes
Sou uma peça defeituosa neste quebra-cabeça da vida, tão fragmentado. Não tenho um lugar de encaixe, não. Estou desconectado das outras peças. Talvez eu deva cortar os meus excessos, minhas ásperas arestas que me impedem de encaixar-me neste tão cruel jogo.
Estou vencido, talvez tenha desistido ou mesmo nunca tenha tentado coisa alguma. Devo despir-me das ilusões, das expectativas vãs, para poder encontrar uma peça que possa me completar. Devemos lutar para conquistar o nosso espaço, mas tudo isso me pesa.
A pele que visto é errada; rasguei-me e de mim nada restou. Esta é a razão do meu sofrimento e das coisas fugidias. Quem me dera pudesse resolver este grande desafio, montar este estúpido jogo e dar-me por satisfeito.
Às vezes a vida é traiçoeira, e o destino parece um enigma insolúvel. Mas para mim, a vida nunca foi senão uma acompanhante de sentir. Compreendi finalmente que a sua beleza está na futileza. Aproveitar a vida, deixe-me ser azarado no jogo; tenho tido azar na sorte, mas a minha sorte está no amor, ah, e como eu amei.
Parassonia
Estou cansado, é claro,
Porque, a esta altura, a gente tem que estar cansado.
De que estou cansado, não sei:
De nada me serviria sabê-lo,
Pois o cansaço fica na mesma.
Estou cansado de pensar, a toda hora, há tantos anos, desde a minha mocidade.
A minha cabeça já não mais encontra repouso, noite após noite, o sono me escapa, como se temesse adentrar neste caos que é a minha mente.
Quando finalmente o apanho, sonâmbulo, eu converso com as paredes.
E mesmo quando acordado, eu converso comigo mesmo, tenho o hábito de conversar sozinho.
Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto.
Eu penso demais, e a minha cabeça pesa toneladas.
Lembro de coisas que gostaria de ter esquecido e imagino coisas que gostaria que não tivessem acontecido.
Deus, com sua ironia, me amaldiçoou com o pensamento, e me fez inquieto, inquisitivo.
Há um certo prazer até no cansaço que isto me dá,
Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.
Às vezes, uma tristeza tão penetrante
Invade e arrebata minha alma,
Levando-a para um lugar desconhecido,
Onde me perco e não me encontro,
Onde não existem portas nem janelas,
Apenas uma estrada longa rumo ao mistério da vida.
Inseguro, volto minha atenção para trás,
Com os olhos sobre os ombros,
E o peso das minhas decisões sobre as costas,
Tropeço nas minhas incertezas.
Rendido, me entrego ao chão,
Derramo-me sobre a cama e inicio um novo dia nessa velha rotina.
Sublime
Fiz grandes e nobres propósitos, mas sou tão pequeno,
Sim, tão pequeno e insignificante.
Observo as grandes cidades de concreto e aço,
Entre arranha-céus que roçam o céu,
Vejo pessoas cruzando as ruas, e os carros.
Há vielas estreitas, onde cada pequeno passo
Descobre o encanto revelado pelo tempo,
Que talvez se perca nesta vida vulgar,
Mas permanece gravado em grafites vulgares.
Vida vulgar, vulgar, como um mendigo verdadeiro.
Vou ao campo e vejo os animais, e as crianças,
Nos vastos jardins, entre rosas delicadas e lírios em flor,
O perfume suave que enche o ar, e o vento que acha meu cabelo.
Cada pétala, um juramento de amor...
Assim saibamos valorizar o simples, o modesto, o singelo.
Descobrir o sublime no cotidiano, no ordinário,
Na essência real das coisas,
Encontrar a beleza que transcende o mundano,
A verdade mais metafísica.
Por trás de cada nascer e pôr do sol dourando o céu,
Onde há pequenos planetas distantes,
Sob os verdes tapetes e vastos campos,
E na imensidão divina, onde o céu se alarga no firmamento.
Sempre há pequenos milagres a perceber,
Em cada gesto simples, um mundo descoberto,
Na plenitude do ser e do existir,
Onde a grandeza habita nas igrejas e casas, e nas mentes,
Onde podemos vislumbrar o infinito num beco e ouvir a voz de Deus num viaduto.
Mas sou, e serei sempre, o que não soube, fiz de mim sublime, humano.
Eu sinto uma profunda dor silenciosa...
Gosto do som da música, do percurso
da minha casa até o trabalho;
estou sempre ouvindo música.
Em casa e no trabalho, ouço o barulho
dos carros, dos comboios e de toda a gente.
Chego em casa, ligo a televisão e ouço o noticiário:
outra vítima do silêncio se atirou
nos ruidosos trilhos do trem.
No trabalho, ouço o rádio, que toca uma música ridícula, e
minh'alma sofrida dança desolada.
Gosto do som da chuva, lágrimas do céu;
até os homens choram, silenciosamente.
E o choro da terra é abafado
pelos nossos gritos ambiciosos;
ouço o barulho das fábricas, corro para o campo,
e a chuva, tempestuosamente,
em seu suave cair, encharca meu coração ressecado.
Gosto do canto dos pássaros;
da minha cama me levanto,
e nela me deito, ouvindo os tordos ao amanhecer
e os urutaus ao anoitecer que, calmamente,
levam distante meu espírito atormentado.
Gosto de deitar-me e dormir
com o barulho do ventilador;
porque gosto de barulho,
assim silencio os gritos sussurrados
em minha cabeça. E eu, que tenho sido tão quieto,
se os ouço e me falam, descanso resignado.