A cada dia que se passava menos o... Carolina Pires

A cada dia que se passava menos o relógio alegrava-me com seus blefes supersticiosos dizendo que alguém pensava em mim, o que eu achava curioso, pois era de grande costume ver os ponteiros sempre colaborando com meu ingênuo poder de acreditar com muita fé que números iguais, lado a lado, no visor do dono do tempo, pudessem de verdade fazer um alguém parar um minuto do seu dia e pensar em mim e no que vivemos juntos. Eu sabia que era ele, alguma coisa me dizia isso e meu coração acelerava repentinamente.
Clarice Lispector é realmente a dona da razão. Incrível como seus escritos nos calham em mãos dizendo a coisa certa na hora mais precisa, sempre. É como se ela calculasse o que nos poderia acontecer em míseros fragmentos de segundo e que isso fosse para nos aprontar e fortalecer para o que estava a fim de advir de pior nos momentos mais importunos. As últimas palavras dela que li há uma semana avisaram-me e eu não quis acreditar. Tola. “Eu tenho um amor em minhas mãos que me escapa entre os dedos querendo que eu o recupere”. “O definível está me cansando um pouco.” E era isso, tudo estava altamente definível e não é bem assim que as coisas têm que ser. O amor tem que ser inesperado, admiravelmente abrasador, há tempos o que sentíamos não andava mais assim. Tinha como presumir cada passo, nada mais espantava e por capricho empurrávamos a relação juntos com a barriga somente por estarmos acomodados com o namoro. Frio, cavo, porém namoro.
Quando começou não havia como crer que aquilo perduraria mais do que o nosso primeiro beijo, mas as coisas foram caminhando, passo a passo, e acabou durando até demais. Demais porque eu o amava mais do que podia, vivia por ele e a cada dia olvidava que dentro disso tudo tinha certo mim que mais e mais eu deixava de lado. Não era mais saudável. Juntos passamos momentos maravilhosos, delirantes, inesquecíveis e aprendemos, crescemos. Eu não sabia que ele era capaz de fazer tanto por mim, e fez. O carinho que hoje, cá, tenho por ele não tem como regular, a importância, o respeito é grande demais e a ele só tenho a agradecer. Por mim ele fez uma coisa que há muito tempo eu tentava fazer e me sentia incapaz de. Não podia ter deixado isso ir tão longe, não fazia mais bem nem a mim, muito menos a ele que calado agüentou todas as minhas reclamações e fez com que existissem momentos magníficos ao seu lado que me fizessem esquecer de todos os problemas. Problemas tais que às vezes nem existiam, eu apenas criava para ter um pouco mais de zelo, pois com as brigas eu via o quão ele se importava em só fazer isso crescer, eu me sentia bem fazendo-o sofrer, inconscientemente. Acabou e dessa vez eu sei que não tem mais volta, o que é uma pena, pois eu podia ter feito melhor, eu sei disso.
Ele deve saber que eu o amei e o amo muito, que não vivi nada de tão absorvente e duradouro antes disso. Ter conhecido sua família, ter me apegado tanto a todos eles foi um dos passos mais importantes que demos, pelo menos pra mim. Fez parecer mais palpável, que aquilo tudo não era somente mais uma de minhas quimeras irrefreáveis. E eu ainda me recordo da primeira vez que ouvi eu te amos saírem por meio de seus lábios. Fico feliz por saber que mesmo após o fim eu consegui fazer ele me amar assim como eu o amava muito antes de compartilharmos suores, isso pra mim, de início, parecia-me impraticável. Ele foi e é a razão de muitas coisas que hoje me rodeiam. Ele despertou em mim uma vontade incontrolável de escrever, ele foi a grande causa do nascimento do meu blog. - Obrigada. – Ele me fez sonhar, planejar e me fez acreditar em cada vírgula que dão vida às minhas palavras avulsas.
Não há como resumir esse todo muito que vivemos. Não importa a quantidade de páginas e de vocábulos teatrais. Nada nunca delineará cada minuto ao lado desse grande homem que fez de mim mulher. Essa é apenas uma forma de evidenciar o meu orgulho por ter vivido isso, pra dizer o quão ele ainda me é importante e que eu não vou querer me manter longe dele, jamais. A amizade me seria muito formidável, ainda mais vinda de uma pessoa que tanto me instruiu.
Após chorar mil lágrimas desesperadas, e ouvir o derradeiro “não vou voltar atrás” vindo do telefone, eu engoli o pranto, vesti minha armadura e fiz de mim mulher forte. Cheguei ao quarto e me desfiz de cada folha, pétala, flor seca, tampa de garrafa, tudo que ele me entregava nos dias que passávamos juntos e que eu guardava em uma caixa com muito carinho obrigando-me a manter aquilo vivo até darmos o nosso último adeus. E se foi. Deletei mensagens, apaguei fotos, fiz de um tudo, mas ainda sinto um vazio. Acabou, pois era triste amanhecer sozinha sabendo que ele ainda estava anoitecendo. Nunca andamos ao mesmo compasso. – Infelizmente - O que me inquieta é que após tudo isso eu consegui adormecer, coisa que antes eu não faria. Dormi, e dormi muito bem. Parece que foi porque eu me senti mais leve em saber que agora ele está alforriado, livre para mais pra frente, quem sabe, encontrar uma outra flor que desabroche no mesmo tempo que ele. Foi bom enquanto durou e hoje eu posso dizer que por mais que durante essa história de amor tenhamos passado por muitas brigas e desalinhos, ele foi o melhor erro de toda minha vida.