A Pele que Somos Rafique Anusse Negro... Rafique Anusse

A Pele que Somos

Rafique Anusse

Negro chama negro de escuro,
como se a noite fosse vergonha,
como se o sol não tivesse beijado
a pele que o mundo insiste em negar.

Mulata vira troféu de esquina,
filhos claros viram promessa,
e o coração escuro é deixado
num canto, como sombra esquecida.

Mas quem foi que disse
que a lua é mais bela que o céu profundo?
Quem foi que ensinou
que o branco é luz e o negro ausência?

O auto-racismo é ferida aberta,
não sangra para fora, mas consome por dentro.
É língua que fere sem saber,
é olhar que rejeita o espelho,
é sonho que procura clarear
o que já nasceu inteiro.

E eu pergunto:
até quando a cor será fronteira?
até quando o amor será medido
na escala invisível da pele?

Porque ser negro é mais que cor:
é raiz, é memória,
é tambor que resiste,
é noite que guarda estrelas.