Decadência insurgente Está aí?... J. Eliseu

Decadência insurgente

Está aí?
Preciso que me alimente hoje
Enxugue minhas lágrimas
Despoje suas bençãos inúteis
Meras empatias
Que apagam o mundo
Reconstroem com meu perfil ao riso.

Sou poeta, mas não sou eu.
Sustentei ideologias em cabides imaginários
Pendurados sob o céu que criei
E sob o céu que reinei,
A meu egoísmo e miséria.

Já não durmo como dormem os anjos,
Nem como dormem os demônios, nem os homens
Nem as mulheres, nem as crianças, nem os morcegos
E nem mesmo as criaturas soturnas que perambulam noite
Em uma peregrinação incerta em busca do pecado.
Não durmo, pois é infinita a dor do saber:
Amanhã acordo de novo, e tenho de reconhecer.

Nem mais sonho, meu subjetivo vive!
É meu ideal, o correto que vive em meu corpo
Minha alma está aprisionada em fogo infernal
Dilacerada pelos ricochetes de culpa e verdade.
Onde estão os remédios?

Esse caminho me guia ao fundo da insanidade.
Na vida, dizem ter altos, baixos e médios
Mas só o que vejo é a guerra por uma irmandade.

Que me faça dormir, que me faça acordar então!
E me faça ver também, que não fui largado de mão!

Pois esse é o meu crítico óbvio e vital,
E preciso que tu digas a mim
Não acredito em minhas próprias palavras
Não posso, a mim não cabe
Como soubestes? Como saberei?

O divino cuja máscara criei, é o juiz da vez
E me julgará em sono e em desperto,
Em pesadelo celeste ou sonho esperto, político.

Hoje serei ovelha!
Hoje serei lobo!
Hoje estarei enterrando a verdade em lodo,
E meu sangue podre, escorrido pelo esgoto.

O mundo podia ser de chocolate
De fato podia, mas não é
Nós que os ensopamos com a massa doce,
Molhadas à sujeira escravista,
A exploração de almas ainda esperançadas
Almas não perdidas, não semelhantes a minha
Que vem de outro mundo, e tenta voltar pra lá todo dia
Mas está acorrentada em areia escaldante,
Do deserto mais seco do universo.
Se tens imagem de algo livre, é o inverso

Repetirei então que a liberdade é outra prisão
Condecorada de arco íris e telefonemas ilimitados
A atores mascarados ausentes e inexistentes.
Nem sinto, agora
Nem nunca senti,
Mas cada vez piora
Essa desventura assombrosa de conhecer a mim

Ver que minha poesia é presa a liberdade
E vale tão pouco quanto capim
Protagonizando uma peça
Fingindo ser um dourado alecrim.
Então de cena em cena me recuo agonizando,
Seguindo em direção ao inédito fim.