Eu queria por um instante definitivo... Luverly Menezes

Eu queria por um instante definitivo qualquer, ser a soberana artesã do desenhar de uma vida. Queria que esse hoje a àquele futuro mais distante, tivessem as cores, as formas e os cheiros dos meus sonhos.
Seria bom se por uma noite apenas, os fantasmas se fantasiassem de palhaço e sorrissem de si mesmos, experimentando o avesso do susto e rendendo-se à luz de um sorriso.
Quem dera mesmo se o fim existisse apenas para os medos e jamais para as nossas tão breves e raras vertigens de felicidade. O outono perderia a hora no manso sossego do sono e a primavera seria senhora do tempo que regala os olhos e suaviza a alma.
Eu queria que os afetos fossem livres e eternos como penso serem as borboletas. Morrer para em outra forma nascer, faz eterna uma existência. E não há nada mais legítimo à liberdade do que a promessa de um recomeço.
Se eu tivesse que pintar com tinta fresca as mais sublimes emoções, estariam lá estrelas que embalam redes, sereias que durante nossas viagens de sono, nos levam a passear pelos mares de Netuno, lá onde se é possível ver e sentir tudo aquilo que não podemos tocar, a emoção não vista que nos tira o ar. Eu pintaria ninfas que nos guardam em cama de folhas no alto das árvores, onde nada mais nos alcança a não ser as brechas de sol por entre os nimbos. Estariam lá, conchinhas misteriosas, ainda fechadas, com cheiro de algas, trazidas até meus pés pela espuma do mar fiel e cansado.
Eu pintaria com a mais fulgente das cores, um colo de afeto chamado minha mamãe. Braços com o alcance do céu, ternos e fiéis, acalanto de toda uma vida em cada abismo meu. Nem sei se todas as cores, dariam conta de tanta ternura, de tanto zelo, da soberania de um amor valente e incondicional, desses que só se tem um a cada vida.
Estariam lá também os meus sorrisos, os sorrisos de quem amo e de cada um que numa inesquecível passagem por minha vida, me fez sorrir. Os abraços, os mimos, minhas pérolas e afagos de afeto, estariam lá, por certo. E o que diriam todos.... Jamais conheci alguém que gostasse tanto de sorrisos e de abraços. E num cantinho à direita do quadro, com traços tímidos e quase imperceptíveis ao correr dos olhos, eu pintaria o que mais sou. Uma emoção desajeitada, um sonho não prometido, uma crença não corrompida, um sempre, um nunca. Um outono cinza que enevoa as flores, breve e clandestino em muitos, eterno e raro em poucos.
As decepções, os sofreres, as flechas DE TÃO PERTO em meu peito, essas eu não pintaria. Seria tornar-lhes perenes, epitáfio confesso de mim. Em meus traços não haverá pandora. As marcas feitas a ferro em brasa, devem ser vistas e traduzidas apenas por quem as tem em sua carne. A vida se já se encarrega de fazê-las retrato inexorável de nós. Ventanias infames ao amor mais puro, desertos de princípios que chocam, assim como as folhas tortas após a tempestade, é luz apagada dentro da gente, é esperança corrompida que, por fim, te embrutece e te esvazia a alma.
Pelos caminhos de um universo paralelo que tem os contornos de minhas buscas e de meus sonhos, encontro-me e, por vezes, perco-me. Talvez porque eu não seria uma boa artesã, talvez porque a ponte que deixa para trás o que só a ilusão permite viver e sentir, jamais me será possível atravessar.