"De todas as coisas que guardo,... Denise Lessa

"De todas as coisas que guardo, cada dia mais dentro de mim, estão os passarinhos, os animais, os amigos, as flores da noite que exalam perfumes de "sensualez" e são chamadas "Damas da noite". Guardo comigo cada gargalhada gostosa, daquelas de doer a barriga.Guardo os porres que já tomei por amor e as ressacas prometidas de nunca mais beber.E tambem as vezes que ví uma estrela cadente e era pra fazer um pedido e eu fiz tres.
Guardo o som das luzes das discoteques, dos olhares na hora da música lenta e do desejo de que chegasse logo um fim de semana pra eu me encontrar de novo com as amigas e a gente falar daqueles garotos que olhávamos de "rabo de olho".
De todas as coisas, guardo o olhar de meu pai, emburrado, com o chinelo na mão, cada vez que eu pegava as uvas verdes da parreira.E eu pegava todas. Imagina quantas chineladas e quantas lágrimas de meu pai por cada chinelada em mim.
E de minha mãe que continua poderosa como mãe, eu escuto dela que eu nunca devo desistir de nada.E não desisto não, mãe!
Coisa boa, quando corações nos falam. E sempre os escuto.
Das chineladas virei mulher bem feita e certa do que quero. Dos sonhos eu tiro as noites bem dormidas.Por que posso sonhar com o que quizer.
Não acredito que as pessoas não tenham nada no coração pra se mirar.
Eu sempre fui manteiga derretida, mas hoje juntei esta manteiga e fiz um bolo. É melhor assim.A gente tem que chorar quando for preciso e não ficar de deboche das arruaças que achamos a vida vai nos trazer.
De todas as coisas, guardo o que perdí e que não posso ter mais: Pessoas, animais, anos, dias....amores!
Mas, digo eu....Daquilo que eu sei, de todas as coisas que eu guardo, com mais certeza, é a minha vontade de ser muito feliz, minha caridade com o próximo, minha vontade de que cada um tenha um pouco mais da vida.
De todas as coisas, eu guardo um amor bonito dentro de mim, cheinho de fantasias a serem vividas na vida real.
Mas, um velho sábio me disse: Não guarde nada, menina! Quem guarda é "Guarda noturno" que apita de noite e guarda apenas a solidão como companhia.
E eu acredito que é isso mesmo: Quem guarda alguma coisa e não a desafia, acaba se perdendo na solidão daquilo que um dia destes quaisquer, seja de chuva ou de sol, verá que não valeu a pena estocar.
Se não tirar do depósito, tudo um dia passa do prazo de validade."