Mesmo depois de tudo, eu ainda te desejo... Amanda Seguezzi

Mesmo depois de tudo, eu ainda te desejo um arco-íris de todo mal que guardo. E me calo por todas as vezes que te bato com uma flor com medo de sentir o teu sofrimento dentre a maciez das pétalas. E não diga que nunca decorei os teus detalhes, pois os descubro em mim, ocultos pelos meus poros, tatuados em forma de poesia. Tinha o controle dos meus pensamentos quando não te avistava no horizonte das minhas vontades, o que raramente me persuadia.
Você me transformou num refém de mim mesma, sem objeções. Nas noites à toa num banco de praça, descobria você na minha cura para o tédio e até lhe encaixava na minha pasta velha de tristezas bonitas. Lembrava que o infinito era logo ali, quando eu te abraçava e ria do combustível que era o fogo dos teus olhos nos meus. Seus olhos. Eram eles cor de terra e os mais bonitos da cidade. Eram os meus olhos. Os seus olhos eram versos rimados, um poema que me vislumbrava ao ler. Eu estava ali o tempo todo, apenas mais um trançado de estrofes vagas que existia numa linha na palma da tua mão. Não me importava. Porque eu amava o imperfeito e as cores que te traziam pra mais perto, mesmo quando você fazia procurar demais por desculpas que eu nem sabia que existiam.
Ao fim, você foi embora como um cometa, um daqueles feixes luminosos que não ancoram no céu. Encontrava-me então perdida em tudo que você me disse, uma linha reta de palavras desenroladas. Aí talvez, por alguma distração, torço para que eu seja reescrita numa dessas ruas de quase-amores e suspiros inquietos. Aí talvez eu tenha sorte. Ou, quem sabe, eu nunca a embale de novo por constatar, pela milésima vez, que você também era a minha sorte, assim como a minha guerra perdida. Para as texturas que só enxergava em ti, o tempo me presenteou com as lembranças de hábitos tão teus. Este era o problema, o tempo não atrasava a minha melancolia, não retardada as minhas aflições, a escassez da tua acidez. O tempo não chorava, não contava a ti que na terça-feira passada eu não dormi por tua causa.
Foi em você, moço, que encontrei minha primeira tempestade, e ainda sinto o gosto das ondas dançando com as marés que não me tiravam do lugar. E mesmo distante, me sucumbindo, lá no horizonte, me desarmando com a indiferença. Mesmo assim, me pergunto sobre qual é a estrela que preciso pra conquistar você. Falho nas constatações, na união do existente, convencendo-me entre um ou dois soluços de quê não vai adiantar de nada multiplicar as coisas.
Trapaceei no jogo do amor e acabei perdendo os bônus de uma forma não muito bonita. Quis abraçar um mundo denso num mar de nuvens ilusórias, um inferno que não era meu. Bordo este conto em notas desafinadas enquanto o visto de maneira sutil. Pouso os olhos suavemente num ponto fixo enquanto tento encontrar meus erros numa escolha que não decidia apenas o meu rumo. Minhas palavras flutuavam até onde estavas como se soubessem exatamente para quem foram declamadas. E no intervalo de dois cigarros e quatro puxadas de ar, eu lhe tinha nas mãos, controlando as pontas dos meus dedos. Tranquei a respiração até o último ponto só pra não te perder pro suspiro de novo.
Eu vou te eternizar em literatura já que o eterno do nosso amor não durou uma primavera. Vou transformá-lo em estrofes só para não esquecer de ler a poesia e lembrar do encanto do teu riso.


Esse é o mal do poeta – pensei, vê vitrais em espelhos trincados.