Colocamos as malas no quarto do hotel e... Paulo Coelho

Colocamos as malas no quarto do hotel e descemos para caminhar até ao local da conferência. Chegamos cedo e sentamo-nos num café.
- Quero te dar uma coisa - disse ele enquanto me entregava um saco vermelho.
Abri na mesma hora. Dentro uma medalha velha e enferrujada - com a Nossa Senhora das Graças de um lado e o Sagrado Coração de Jesus do outro.
- Era sua - disse ele, ao ver a minha cara de surpresa.
Meu coração começou de novo a dar sinais de alarme.
- Um dia - era um Outono como este agora, e nós devíamos ter dez anos - sentei com você na praça do grande carvalho.
"Eu ia dizer algo, algo que ensaiara durante semanas a fio. Assim que comecei, você me disse que havia perdido a sua medalha na ermida de São Satúrio e me pediu para ir lá procurá-la."
Eu me lembrava. Ah Deus, eu me lembrava.
- Consegui encontrá-la. Mas quando voltei à praça, já não tinha coragem para dizer o que havia ensaiado. - continuou.
"Então prometi a mim mesmo que, só tornaria a lhe entregar a medalha quando pudesse completar a frase que comecei a dizer naquele dia há quase vinte anos. Durante muito tempo tentei esquecer essa frase, mas a frase continuou presente. Não posso viver mais com ela."
Ele parou o café, acendeu um cigarro e ficou um longo tempo a olhando o teto. Depois virou-se para mim.
- A frase é muito simples - disse.
"Eu te amo."

Paulo Coelho

Nota: Na Margem do Rio Piedra Eu Sentei e Chorei, 40