Coleção pessoal de Yuzo1917

Encontrados 4 pensamentos na coleção de Yuzo1917

Reflexão inspirada na musica Fora de Tom de Yago Oproprio

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Há dias em que a vida inteira parece desafinada...



Em que cada passo soa errado, cada escolha pesa mais do que deveria, e cada sentimento chega atrasado — ou cedo demais. A gente respira, mas não encaixa. Vive, mas não acompanha. É como estar sempre fora do tom de uma música que todos, menos nós, parecem conhecer de cor.


Esse som canta esse lugar com uma honestidade que dói: aquele ponto onde o coração continua tentando, mesmo quando já não sabe muito bem por quê. Não é fraqueza — é humanidade. É esse esforço silencioso, quase teimoso, de continuar existindo apesar da angústia, que Camus reconheceria como o cerne do Absurdo.


Porque o mundo não explica nada.
O mundo não traduz nada.
O mundo não afina por nós.


E, ainda assim, continuamos tentando compor algum tipo de melodia, mesmo que improvisada, mesmo que trêmula.


A lucidez é uma lâmina fina.
Ela corta quando percebemos que nada do que buscamos garante paz.
Que amar não garante ser amado.
Que tentar não garante ser visto.
Que dizer “estou aqui” não garante que alguém responda.


É uma compreensão cruel: o universo não devolve na mesma intensidade que sentimos.
Esse é o Absurdo.
E é exatamente aí que algo profundamente humano acontece.


“Fora do Tom” fala dessa luta: tentar se ajustar sem perder a própria verdade, reparar as próprias rachaduras enquanto ainda se está quebrado, caminhar sabendo que a estrada não promete nada. E, no entanto, existe uma força estranha nisso: um tipo de resistência silenciosa que Camus chamaria de revolta.


A revolta não é grito — é persistência.
É acordar mesmo cansado.
É respirar mesmo doendo.
É segurar o coração com as duas mãos, mesmo que ele pulse torto, e dizer:
“eu ainda estou aqui.”


Ser “fora do tom” não é falhar — é existir com honestidade num mundo que insiste em ignorar nossas melodias internas.
É continuar tocando, mesmo quando ninguém escuta.
É não desistir da própria frequência, mesmo quando ela não combina com o que esperam de nós.


No final, talvez a afinação não esteja no mundo — esteja dentro.
E talvez viver seja isso:
uma tentativa imperfeita,
uma busca sem garantias,
uma música que a gente aprende enquanto toca.


Camus diria que a beleza está justamente aí:
no fato de que a vida não faz sentido,
mas a gente insiste em cantar.


E, às vezes,
é nesse descompasso
que finalmente encontramos
nossa própria voz.

Y.C

Inspirado na musica Gus Dapperton - Sober Up

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“Entre a lucidez e o abismo”


Há momentos em que a vida parece nos pedir sobriedade — não só do corpo, mas da alma. Uma espécie de clareza que, longe de aliviar, pesa como um golpe seco. É o instante em que percebemos que nada externo pode realmente nos salvar: nem o amor que suplicamos, nem a euforia que consumimos, nem a fuga que tentamos transformar em abrigo.


Fala desse lugar onde o querer se torna dor, onde a dependência emocionável não é escolha, mas sintoma. E Camus, se entrasse nessa conversa, diria que ali está o Absurdo: a consciência aguda de que esperamos do mundo algo que ele jamais prometeu nos oferecer.


A proximidade que sufoca.
A distância que dilacera.
O desejo de limpar a mente — e o medo do que a mente mostrará quando estivermos lúcidos demais.


Há uma violência suave nesses ciclos. A pessoa que tentamos alcançar parece sempre “perto demais” ou “longe demais”, nunca exatamente onde o coração precisa. E então buscamos excessos, substâncias, distrações, movimentos — qualquer coisa que sustente a alma por mais alguns minutos. O problema não é o vício em si; é a tentativa desesperada de escapar do próprio pensamento.


Camus enxergaria nisso não fraqueza, mas humanidade.
Somos criaturas que sentem demais e compreendem de menos.
Criaturas que tentam preencher o silêncio com ruído, porque o silêncio é a forma mais pura do absurdo. Ele não responde. Não consola. Não explica.


E ainda assim, continuamos.


A vida não oferece sentido pronto; oferece apenas manhãs que chegam, quer que estejamos preparados ou não. O mundo não espera pelo nosso equilíbrio — e talvez essa seja a parte mais dolorosa: perceber que tudo continua enquanto ainda tentamos nos recompor.


Mas é justamente aí que algo profundamente humano surge:
a pequena revolta de permanecer vivo, mesmo quando tudo em nós implora por anestesia.
A decisão silenciosa de caminhar, mesmo ferido.
A coragem de olhar para o que dói sem se deixar consumir por isso.


A sobriedade não é a ausência de dor.
É o reconhecimento dela sem correr.
É o retorno ao próprio peito — mesmo trincado — com uma honestidade que esfarela qualquer ilusão.


E, paradoxalmente, é nesse retorno que nasce um resquício de liberdade.
Não uma liberdade luminosa, mas uma liberdade quase subterrânea:
a de existir apesar da falta de sentido.
A de dançar mesmo sem música.
A de amar sabendo que nada garante retorno.
A de continuar sabendo que nada promete recompensa.


Essa é a força que Camus admirava.
Não a força que vence o mundo —
mas a que se mantém de pé dentro dele,
mesmo quando ele é indiferente.


No fim, ficar sóbrio não é ver menos:
é ver tudo.
E ainda assim, não desviar o olhar.


Essa é a verdadeira coragem.
Essa é a verdadeira dança.

Y.C (para N.)

(de 2012)

Quem sabe um dia tudo ficará bem...

Embora eu já não saiba mais o que “bem” realmente significa.
Há tanta dor, tantos sentimentos e pensamentos comprimidos dentro de mim que já não cabem, mesmo que eu me sinta tão vazio por dentro. É um paradoxo estranho: cheio demais para suportar, vazio demais para entender. Camus diria que o absurdo nasce exatamente aí — entre aquilo que espero do mundo e aquilo que o mundo realmente me entrega.


Acreditei. E pagar o preço da esperança sempre dói.
Quando a verdade chega, ela não pede licença: arromba a porta e espalha pedaços do coração pelo chão, como se fosse possível sobreviver quebrado e continuar andando. É difícil recolher tudo isso… mais difícil ainda é encaixar de volta.


Dizem que só um novo sentimento cura o antigo, mas ninguém avisa que o novo pode ser ainda mais amargo.
E quando o que chega não salva — machuca? Quando a cura arde mais que a ferida? O que fazer além de existir, esperar, respirar e tentar não desabar?


Talvez eu espere mais um pouco.
Não quero apagar memórias — isso seria negar minha própria história — mas queria que elas perdessem o poder de me ferir. Queria poder lembrá-las como quem observa uma cicatriz antiga: com certa distância, com certa aceitação… sem voltar para o dia do corte.


Meu coração é amaldiçoado, talvez. Sente raiva demais, mas não o suficiente para sujar as mãos de sangue.
A vingança às vezes me parece uma ideia sedutora, quase reconfortante, como se devolvesse uma ordem ao caos. Mas no fundo eu sei: é só mais uma armadilha do absurdo tentando me convencer de que existe alguma justiça perfeita no mundo. Não existe. Nunca existiu.


Meu orgulho me segura. Minha razão me impede.
Ela segura a raiva, segura essa fome de destruir tudo que me feriu — porque no fim eu sei que destruir o outro não reconstrói nada em mim.


No fundo, sobreviver é isso: um ato de rebeldia silenciosa.
Persistir mesmo quando o mundo não dá respostas.
Continuar mesmo quando nada faz sentido.
Erguer-se mesmo quando o coração implora para desistir.


E talvez seja nisso que eu ainda posso acreditar — não em um final feliz, mas na força de continuar apesar de tudo.


Y.C

O Jardim Entre Nós…


Nos dois existe um tipo de escuridão que não assusta — apenas reconhece. Um silêncio antigo que sempre carregamos, cada um à sua maneira, antes mesmo de nos encontrarmos. Talvez por isso nosso amor não tenha nascido de pressa; foi brotando devagar, como luz filtrando por frestas em ruínas. Cresceu nas feridas que fingíamos ignorar, nas noites onde o mundo parecia absurdo demais, pesado demais, inútil demais. E, mesmo assim, ali — no território quebrado que somos — algo floresceu.


Não somos criaturas feitas para caber em moldes. Somos metamorfoses ambulantes, contraditórios, instáveis como o próprio Absurdo que Camus descreveu. E ainda assim, quando estamos juntos, a contradição não dói: ela respira. Você, com essa intensidade que corta a escuridão como um relâmpago, me lembra que a beleza não foi feita para ser domada. Eu, com minhas cicatrizes filosóficas, com esse cansaço de quem tentou encontrar sentido em todas as religiões e em nenhum deus, vejo em você a promessa de algo que o mundo não conseguiu destruir.


Não somos certos nem errados — somos apenas. E, no meio do caos, isso é quase um milagre.


O jardim entre nós não é feito de flores dóceis. Ele nasce de raízes fundas, regado por dores que sobrevivemos, por noites onde a vida parecia uma piada cósmica sem graça nenhuma. Mas é justamente ali, onde tudo deveria desabar, que nós persistimos.
Entre espinhos e sombras, entre o que eu fui e o que você ainda descobre ser, existe um espaço que o mundo não alcança: nosso caos transformador, que insiste em se tornar beleza.


Nesse jardim torto, indomável, improvável — você e eu encontramos aquilo que jamais buscamos: redenção.
A minha na sua loucura luminosa.
A sua no meu absurdo cansado.
E o “nós”… no milagre secreto de continuar florescendo onde ninguém mais acreditaria.

Y.C (Para Allanna)

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