Coleção pessoal de Urutal
Desculpe, senhores, por me intrometer na conversa de vocês. Mas o amigo aqui falou uma coisa que me chamou atenção: "precisamos mudar começando de baixo." E o outro senhor não concordou, e realmente ele tem todo o direito de não concordar, afinal é por isso que estamos aqui discutindo. Mas eu estava lendo um artigo muito interessante...
— Desde quando o índio sabe ler?
(Todos riem)
— Hahaha, o senhor está certo, eu não me senti ofendido com seu comentário, afinal de contas, faz parte do jogo. Mas somente uma mente fraca tem medo de ouvir um argumento forte. Será que o senhor é capaz de ouvir o que eu tenho a dizer?
Silêncio constrangedor.
— Muito obrigado. Como eu estava dizendo aos amigos, li um artigo muito interessante que falava a respeito de um pequeno gesto que mudou a vida de muitas e muitas pessoas. Peço perdão aos amigos e colegas por não saber dizer o nome dessa pessoa ou do país onde vivia, mas sei que se referem a um estudante de medicina na Europa que, ao chegar em uma universidade, percebeu um dado que o intrigou muito. Ora, enquanto a taxa de mortalidade entre as mulheres que entravam em trabalho de parto cujo procedimento era operado pelos médicos era muito alta, a taxa do mesmo procedimento realizada pelos alunos era muito baixa. Esse estudante de medicina ficou intrigado com isso e resolveu pesquisar a fundo. Ele percebeu um simples gesto que mudou tudo por completo: os alunos, diferente dos médicos, lavavam as mãos antes de tocar nas mulheres e, por conta disso, a taxa de mortalidade entre as pacientes atendidas pelos alunos era menor. Ao levar essa observação ao reitor, ele foi desacreditado, mas não desanimou, voltou ao seu país, fundou seu hospital e reduziu a taxa de mortalidade em trabalho de parto de 80 para apenas 10. Ou seja, antes, entrar em trabalho de parto era quase uma sentença de morte; agora, de 100 mulheres que entram em trabalho de parto, 90 sobrevivem. Isso nos ensina a importância dos pequenos gestos, e é por isso que eu concordo com o colega que disse que temos que começar por baixo.
De Deus muito eu duvidei,
Sabendo que me observava.
Aqui embaixo eu blasfemava,
Esperando o pior.
Ô coisa que eu sinto dó,
E que me aperta o coração!
Eu era réis desgarrada,
Bicho brabo, vaca emprenhada,
Eu era macho redomão.
Eu era fraco de cabeça,
Não é que hoje eu não seja,
É que antes eu fui mais.
Eu achava que eu era
Muito mais do que eu era,
Muito mais, muito mais.
Eu me enxergava como um ouro,
Eu era o prêmio, o tesouro
Que ninguém nunca iria achar.
Eu era o tesouro escondido,
Eu era o elo perdido,
O leite, mel, o xangri-lá.
Pobre de minha mãe,
Pobre de minha esposa,
Pobre dos meus amigos,
Pobre dos meus irmãos.
Me viam eu me iludindo,
E me olhavam sempre rindo
Para proteger meu coração.
Sempre pensei, mais de mim mesmo,
Sempre me levei muito a sério.
Hoje aceito que erro,
Hoje sei que só sou normal.
Mas vale prezar os meus
E viver para sempre em suas mentes,
Do que dez minutos num jornal.
Nasci Pobre e Desletrado
Nasci pobre e desletrado,
mas por meio do Estado
ganhei escrita, ganhei leitura.
Resolvi fazer poesia,
mas a mancha não saía,
minha fala era burra!
Resolvi pedir perdão
e, por meio da União,
no ensino médio me formei.
Resolvi fazer poesia
e, mesmo com maestria,
do jeito simples não me livrei!
Repreensão de todo jeito,
sem tato e com despeito,
eu cansei de escutar.
Resolvi fazer poesia.
Para mim mesmo repetia:
"Ninguém mais vai me malhar."
Analisei a minha obra,
refleti por uma hora
e cheguei à conclusão:
Eu resolvi fazer poesia.
Quem gostava dela, lia.
Quem não gostava, lia em vão!
"Um povo ignorante, sem instrução e numeroso acreditará cegamente em você, mas quando eles descobrirem a verdade a raiva também será cega."
- Summer Bittencourt
Carta para o Futuro
Olá, pessoa do futuro.
Tomara que você seja tão fascinada pelo passado como eu sou... Se você se pergunta se aqui no passado nós somos parecidos com vocês, essa é uma ótima pergunta. A resposta é: provavelmente não. Mas esse "não" é relativo. Não temos essas facilidades que vocês têm e, na verdade, ainda não sentimos falta delas.
Mas a vida continua relativamente igual. Eu tenho mãe e amigos. Tenho uma esposa, muito bonita, por sinal. Eu me levanto cedo para trabalhar, como imagino que você deve fazer também. Ao meio-dia, almoço em um restaurante: como arroz e feijão, carne de gado ou frango, maionese, vinagrete e tomo uma Pepsi (um tipo de bebida gaseificada, com muito açúcar). Chego em casa, ligo o computador e fico horas programando apps ou trabalhando com segurança da informação.
Nossa vida tem alegrias comuns aos homens, como piadas, comida, amigos, música e prazeres. Nós também temos problemas: roubos, doenças, mortes.
Estamos passando por um período muito terrível. Pessoas entram em escolas e matam crianças para ganharem notoriedade. Elas querem ser lembradas como "Fulano de tal, o assassino da escola". Outra onda de morte está sendo por envenenamento de comidas. Teve um caso com um bolo com arsênio aqui no Sul, depois um caso com chumbinho no Nordeste, e outros dois em São Paulo.
O presidente atual é o Lula (Brasil) e o Trump (EUA). Já não nos parecemos em nada com o que éramos há 500 anos atrás, quando os portugueses chegaram em nossas terras.
Espero que aí no futuro você esteja bem. Não fique pensando tanto no passado; as paixões que você teria aqui pode muito bem vivê-las no seu tempo.
Summer Bittencourt
22 de Julho de 2025
Terça-Feira
(Carta escrita em Canoas-RS)
Poema da Tarde
Sou pertinaz em falar das tardes.
Ora, o que há de mais ocioso? A noite?
Pobre noite... dama
que corre de mão em mão.
O efervescer ardente é denso
aos meus olhos molhados de suor.
E a tarde vai... voa como
meus funestos versos fracos.
Tarde! Pra quê serve a tarde?
Extenso descanso dos glutãos,
carrasca dos sertões...
Dona insana do meu labor.
Luta Interna
Quantas vezes eu tentei lutar contra?
Muito lutei sem saber.
Hoje luto por um espaço,
não perto, mas dentro de você.
Vivemos a vida de outros
e esquecemos de viver a nossa.
E o que somos por dentro se perde,
não luta e se acomoda.
Canto para esvaziar
o que dentro de mim transborda.
Se fico em silêncio, a madeira racha
e estouram as cordas.
Para quê tentar lutar contra quem somos,
contra o pranto, contra a dor?
Nos esquecemos que sempre perdemos
ao lutar contra o amor.
