Coleção pessoal de schmorantz

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Dia Comum

Se esvai o dia comum
nada especial aconteceu
tenho as mesmas cicatrizes,
sobrou um sorriso cansado,
um distante abraço,
uma alma junto à minha.

O dia irá amanhecer,
o sol haverá de inundar a vida
para dizer que ainda não morri,
que sou como a maré,
sempre voltando e voltando.

Acorda-me um rufar de asas no telhado,
a intraduzivel conversa das pombas,
quando arrulham aos pares nas manhãs,
tecendo o tempo, os dias e as horas.

Entra o dia pela janela sem persiana,
preciso aprender alguma canção,
quebrar o silêncio e não adormecer,
é este perene cotidiano,
que me traz de volta pela mão...

Melancolia

Melancolia estranha visita,
que afunda os pensamentos,
deixando o tonto o silêncio,
bailando à sorte um momento.

Melancolia vem não sei de onde,
como a chuva que cai na rua,
solidão imensa que molha o chão,
que embala as noites sem lua.

Melancolia, tristeza preguiçosa.
como lagartixas na varanda,
paradas, suspiram e esperam,
como sombras sem esperança.

Sinto o gosto do singelo cansaço,
da solitária escrita, da monotonia,
da fragilidade triste que não dói,
que no coração poeta faz moradia.

Melancolia ridícula dentro de mim,
é saudade do que não existe,
é a melancolia da chuva...

Chuva na tarde

Tarde mormacenta, nuvens escuras,
a terra docemente implora a chuva fina,
a tarde quer chorar seu silêncio.

Chuva para lavar as ruas vazias,
tirar a poeira dos olhos como o pranto
que vai molhando os sonhos da alma.

Os pingos dançam nas folhas, fazendo piruetas,
ondulando, salpicando brilhos de nostalgia,
balançam as folhas numa envergonhada alegria.

Trêmulas as folhas se agitam e voam,
ressoam os pingos como música nas calçadas,
sossega-me a alma o perfume da terra molhada.

Chuva que penetra mansamente o cio da terra,
espraiando-se em um compasso sincopado,
cantarolando sozinha um poema inesperado.

Fim de Verão

Chegam as primeiras chuvas anunciando
o fim de um tempo escaldante de verão.
Distanciam-se os dias de luar e cio,
fica o canto, a vibração, a nostalgia,
fragmentos de risos, sonhos e ilusão.

A praia sem a obrigação de ser verão,
serenamente perde-se na linha do horizonte.
Os dias continuarão mornos e ensolarados.
E ao fim da tarde o sol fará sua despedida
em coloridos raios até morrer atrás do monte.

Um vento errante há de vagar sobre a praia,
anunciando teatralmente o fim da estação,
soprando emoções quebradas na areia,
como a despedida dos amores de verão.

Termina temporada, termina o verão,
Recolhe-se a rede, o guarda sol, a esteira,
Recolhem-se as sereias e musas do mar,
Fim de viagem, morre a estação derradeira...

Rumo ao Mar...

Sol desperto no céu espelha-se na água
da lagoa e do mar, pontilhando de dourado
pequenas gotas bailarinas suspensas no mar.

Calor do sol, brisa suave no rosto,
segue o barco balançando a destino do mar,
transporta sonhos de um lado para outro,
onda branca e inquieta que não pára,
a encantar-se com a beleza de suas margens.

Doçura impetuosa das marés a subir no entardecer,
gotas cintilantes desafiando as fortaleza das pedras,
enquanto os barcos crepitam nas ondas azuis,
ida e volta, chegada e partida de pequenos cais.

Corre a água cristalina a buscar o seu destino,
palavras são veleiros que viajam nesta onda,
vão partindo com o vento como quem canta,
canto da ave, canto da pureza do mar.

Segue o barco neste mar entre montanhas,
cortando as ondas que soluçam baixinho,
canção do mar, plena de magia e poesia,
que nesta hora até os pássaros silencia.

Água, sal e vida, hora da despedida,
segue o barco a sua rota, ficamos aqui no cais,
de tantas belezas avistadas fica um quase poema,
vago como a luz que reinventa o azul do mar,
no verde-mar-poema que ficou na margem.

A poesia virou confete

É na areia que está o meu carnaval,
é no mar que estão as serpentinas,
brancas ondas a quebrar na praia.
Aqui encontro a magia da poesia,
vestindo fantasia que a luz do sol irradia.

No meu carnaval não tem máscaras!
Tem rostos, tem corpos bronzeados
desfilando naturais alegorias na praia,
que vem do mar, que vem da areia
desfilando como netunos e sereias.

É a palavra que brinca na praia,
no balanço das ondas faz o samba enredo,
o carro abre alas é um navio pirata
assaltando um coração enfeitado
por poesia que na areia virou confete.

Agora é Carnaval

Agora tudo que se vê
são corações pulsando como bateria.
Vem para misturar o juízo,
para disfarçar a solidão
no bloco da eterna esperança.
Fantasias e ilusões,
onde estrelas são confetes
e o carnaval também se faz poesia.
Vem o carnaval escondendo a tristeza
atrás de máscaras coloridas,
fascinio alucinante de liberdade,
que rompe os laços e
num passe de magia transforma
gente comum em reis e rainhas.
Olhando de longe as alegorias
o mundo agora é uma fantasia, e
Em meio à explosão do ritmo,
do perfume, suor e alegria,
desfila agora o bloco das letras,
tamborilando esta patética poesia.

Seres Anônimos

Por aqui, nesta ilha,
circulam estes seres anônimos,
heróis da sua própria história,
poetas de sonhos, cada qual com sua expressão,
afinados nas suas inquietudes.
Seres olhados como espetáculo de um teatro
mambembe a beira das praias,
rostos estranhos, desconhecidos
em fantasias coloridas que passam
para lá e para cá, alheios ao que acontece.
Seres anônimos transeuntes,
expressões cansadas de uma silenciosa marcha.
Que fazem surgir submersos pensamentos.
A alma inquieta busca por seu poema
com trunfos reservados à gente comum,
estes seres calados, incógnitos,
que sequer se sabem anônimos
retratados em desconhecidos versos...

Cada dia

O tempo se esfumaça
na janela em que se espreita a vida.
O alaranjado entardecer traz nostalgia
como se a vida também desaparecesse
com o sol ao final de cada dia.
Não se vive uma história sem amor
Não se faz um caminho sem coragem
Não se passa os dias em branco.
Há em cada dia uma chegada e uma partida,
coisas que estão além do bem e além do mal.
Cada dia tem sua dose de ironia e de amor
sua dose de rotina e sua dose de humor,
mas quando chega ao final morrem com ele
tudo que se passou, morremos nós.
Ficam as lembranças do que marcou,
o resto fica num labirinto de imagens,
engavetados na memória, sem uso...
Cada dia amanhece e anoitece à mesma hora,
cada um com seu destino ou desatino,
entre um e outro há o tempo que não volta.
O tempo parece brincar entre acasos e ocasos,
dias compridos, coisas novas e coisas velhas.
Depois desarruma tudo e vai embora...

Brincar de rimar

Eu quero qualquer coisa mágica,
qualquer coisa azul,
qualquer forma de ser feliz.
Não quero acordar cedo,
quero prolongar o sonho mesmo
que a história seja trágica.
Não quero sonhos falsos,
Não quero destino já traçado,
Não quero uma vida básica.
Não quero restos ou pedaços
Não quero olhar o relógio,
Não quero um tempo sádico.
Quero valer um mar azul
uma estrela na varinha de condão
um poema de efeito mágico,
que seja fácil, que seja simples,
nem litúrgico, nem letárgico,
mas que fale ao coração...

Verão na Ilha

Sobre a ilha um ardido verão,
lassidão dos corpos largados nas marés,
sol que toca na alma da terra,
longos sóis, longos dias na ilha da magia.
É verão, suor sem matéria, cheiro da maresia,
o sol pintando de vermelho os corpos na areia.
É preciso entrar no mar, mergulhar nos pensamentos,
neste mar descompassado, imprevisível, amoroso
que cerca a ilha num verão que devora.
O mar azul em pedaços e brancas espumas
acelera as velas que deslizam, desenhadas no céu.
Dourados corpos passeiam no intenso calor
pintando o quadro da ilha verão,
tela cheia de cor, calor, paixão
Cor do verão que a tarde mormacenta devassa,
e este poema distraído mal traça.

Grão de areia
Entre milhões de palavras
como um grão de areia
está um invisível poema.
Um poema que nunca se escreveu.
Um poema feito grão de areia,
talvez parte de uma construção,
talvez não...
Pequeno grão de areia
em silêncio na beira do mar,
que vai sendo soprado
para um destino incerto,
talvez o mar, talvez o deserto.
Palavras que ao vento se vão
como um pequeno grão a rolar na praia,
procurando a concha da sua vida.
Não tenho pressa, sou como este grão
também sigo a rolar na areia
até renascer na praia ou encontrar o
poema da minha vida...

Notívaga

Sou notívaga, perambulo nas madrugadas
como as corujas, empertigadas, em cima dos muros.
Ouço os sons da madrugada, os que estão fora e
os que tenho dentro de mim.
Silêncios quebrados por sons de pássaros noturnos,
pessoas que passam, chave na fechadura, criança que chora.
Cortam a madrugada o choro dos amores mal resolvidos,
Os sonhos ainda não vividos, o som de risos perdidos na memória.
A madrugada está cheia de sons, música transcendental, natural
que não precisa de cordas ou teclas, vem no assobio do vento
ou nos acordes dos pingos de chuva na velha calha.
Não sei que hora o relógio marca, sei que estou acordada,
que o poema não deixa de ser uma oração silenciosa,
será que Deus ouve melhor nessa hora?
Resta depois esta vontade de chorar diante da beleza,
Resta esta súbita saudade de tudo e de nada,
até que os sons se esmaeçam enternecidos no sono
que finalmente chega...

Nos caminhos da Ilha

Da janela vejo ruas sem nome
casas coloridas abrigadas em montanhas,
da janela sinto a brisa e cheiro dos eucaliptos,
o cheiro das ruas sem nome
onde vento balança verdes folhas
e nascem flores em pedras.
Estas ruas tem silêncios mágicos
como poemas ainda imaginados,
acabam no pé da montanha
mas seguem a caminho do mar...
Ruas de casas pequeninas e pequenos jardins.
Ruas sem nomes, sem números
que da janela vejo encantada
enquanto as flores crescem
agarradas às saliências das duras pedras.
O verão pinta o quadro
e eu aqui, vejo
pela janela emoldurado...

Depois da Chuva
Depois da chuva vem o céu de prata
a iluminar os caminhos molhados,
a imagem poeticamente cinza dos
pássaros esvoaçando em galhos nús,
e as nuvens se arrastando com o vento.

Depois da chuva, brota a poesia
das calçadas molhadas,da terra lavada,
do capim cheiroso de beira de estrada,
Empresta um sonho perfeito,
planta sementes de poesia.

A chuva que atravessa a paisagem
deixa cair amarras e passa por mim,
abre as secretas janelas para ler
os mudos poemas tamborilando
nas calçadas.

Poema para um Quase Verão

Nas noites de um quase verão
entre as nuvens de uma chuva fina,
de asas abertas sombras e vultos se movem
entre os zumbidos que ecoam na noite...
São murmúrios escondidos,
são caricias do vento na verde ramagem.

Chuva, nuvens, estrelas
lua que brinca de esconde-esconde,
brinca comigo, com meus pensamentos.
Vem vento, vai vento... devagar
desprende as palavras deste poema à toa.

Brinca comigo, com minha alma
leva para fora os sons rasteiros das tristezas,
desperta a brasa destes mornos versos,
vai nas ondas deste mar,
desenterra os sonhos náufragos lá do fundo,
e deixa-os voar nas asas de uma gaivota,
plainando entre o mar e o céu
em uma rubra noite de verão...

Hoje

Hoje sou este azul,
sou entardecer, silêncio e magia,
sou do mar a imensidão,
sou da brisa a serenidade,
sou perfume, sou pecado,
sou vida e paixão,
sou luz de luar beijando o mar...

Hoje sou esta natureza,
sou vento que desenha nuvens,
sou a noite e seus pássaros,
voando nas asas do vento...
Sou mulher cheirando a flor,
alguém a quem chamam de poeta,
mas sei que poetisa não sou,
sou mulher desta natureza,
meus versos são apenas sentimentos
que dançam nas ondas do mar...

O vento passa nas tardes mornas,
Sinto seu abraço,
Sinto que vive e canta dentro de mim.
Sinto o sopro do vento, o cheiro do mar,
O ilimitado do céu vazio,
Ar que penetra suave e reascende uma
Chama cósmica em meu coração.
Abençoada seja esta natureza silenciosa.
Há uma parte de mim que se ausenta
E parte com o vento,
Todos os dias um pouco,
Enquanto o poente no céu se estende
Numa saborosa melancolia...
Mas agora volto...
Volto à minha vida,
Hora de seguir caminho,
Natureza e vida ainda sorriem para mim...

Sem pretensão poética

A noite é um quadro adormecido,
Com a lua lendo a alma da gente.
Estes pensamentos dançantes,
Que penetram na noite
Enquanto morrem as estrelas.
Serenos silêncios da madrugada,
Coração deambulando saudades.

Amo a noite calada,
O som dos pios noturnos,
Os soluços da natureza e
O roçar das folhas nos telhados.
Vejo meu amor nas sombras da noite,
Quando vaga, viajante na noite fundida,
Desfaço a distância e me lanço ao vento,
Com o coração aberto à vida...

Sementes

Silêncio ecoando na inquietude,
Minha alma procura o equilíbrio
Entre sentimentos de ontem e hoje.
Sentimentos imperfeitos,
Como imperfeita eu sou...
A poesia vem em fragmentos,
Como sementes desconhecidas,
Vividas, sonhadas, escondidas.
Sementes serenas como as lágrimas
Que a noite verte
Ainda que estrelas lhe façam companhia.
Sozinha aqui a pensar,
Não encontro rimas para a poesia,
Assim, só em fragmentos, lanço
Minhas sementes na noite que
Se encolhe dormente na fria madrugada.
Estou infinita e limitada,
Quero minha poesia inteira e
Todos os meus sonhos de volta...