Coleção pessoal de LuizaGrochvicz
Aos Que Dizem "Amar"
Eles dizem que a fé os une,
mas o amor que pregam nunca me alcança.
Fizeram da igreja um lar, e da exclusão um hábito.
O que antes era família, agora é apenas um círculo fechado,
onde só entra quem ora com a mesma voz,
quem se curva aos mesmos mandamentos,
quem finge a mesma perfeição.
Todos os convites são selados com aleluias,
menos os que deveriam vir com afeto.
Me excluem das fotos, dos risos, dos planos,
mas convidam desconhecidos que falam a mesma língua celestial.
Sou parente no sangue, mas estrangeira na mesa.
Eles dizem que se importam,
mas nos olham como se fôssemos mancha,
como se nossa ausência fosse melhor do que a presença verdadeira.
Quando algo dá errado, não hesitam —
apontam: “é por não seguir o caminho certo”.
Como se a dor fosse merecida. Como se Deus os tivesse feito juízes.
Minha vida virou um disfarce.
Me chamam de vez em quando —
mas só se eu vestir a máscara,
se esconder minha verdade,
se fingir que aceito calada o riso falso e o silêncio cruel.
Falam de perdão, mas não sabem acolher.
Falam de Cristo, mas não sabem amar.
Preferem um estranho fiel do que um parente imperfeito.
E assim me trocaram, me afastaram, me apagaram.
Nas fotos, estou ausente.
Nos grupos, sou excluida.
Nos encontros, sou evitada.
Mas o que mais dói
é que fingem bondade com as mãos que me ferem,
e no fundo dos olhos, vejo:
se um dia pudessem me matar com a frieza,
fariam isso sorrindo, em nome do amor.
Às vezes, não se encontra amor recíproco porque se insiste nas pessoas erradas — como quem aperta uma tecla no piano achando ser a certa, mas a melodia não mente: soa falso o que não combina."
Substituível
Não importa o sangue,
nem o nome em comum,
nem as memórias que, um dia,
foram infância sob o mesmo sol.
Importa a roupa certa,
as palavras decoradas,
o sorriso ensaiado diante do altar.
Eles não disfarçam,
não fingem sequer o laço.
Trocariam o sangue por uma oração
e o abraço por um “amém”.
Um desconhecido basta.
Desde que curve a cabeça,
desde que repita a crença,
desde que não questione.
Sou descartável porque penso,
sou invisível porque não ajo igual,
sou esquecida porque não finjo fé.
E eles preferem os novos fiéis —
recém-chegados e inquestionáveis —
aos que cresceram ao lado
mas escolheram um caminho diferente.
Talvez nunca tenha sido sobre amor.
Talvez sempre tenha sido sobre controle.
E eu, que não sigo a trilha deles,
viro sombra,
viro erro,
viro ausência desejada.
E ainda sorriem,
como se o abandono fosse justiça,
como se amar quem é igual
os tornasse melhores.
Mas se um dia faltarem todos,
ainda lembrarão de mim?
Ou continuarão chamando de “família”
aqueles que só conhecem
a máscara que eles mesmos exigem?
"Mercado da Fé"
Eles pregam amor, mas apontam com o dedo,
sorriem com os lábios, mas ferem em segredo.
Na roda dos justos, só senta quem pensa igual,
quem anda na linha, quem segue o ritual.
Um evangelho de fariseus,
onde cada um escolhe os seus.
E quem não cabe no molde exato,
vira motivo de riso barato.
“Falta Deus”, sussurram entre pratos e orações,
mas nunca perguntam das minhas aflições.
Debocham do que não entendem, rejeitam o que é diferente,
com um zelo que machuca, um orgulho que é doente.
Se inflamam na bolha do sistema,
onde tudo que escapa vira problema.
Não aceitam a dúvida, não suportam o pensar,
preferem repetir a fé que aprenderam a decorar.
Mas eu creio, sim — na luz que não exclui,
na verdade que não se vende, na paz que constrói.
Minha fé é silêncio, é abraço, é chão,
não vive de aparências, vive de compaixão.
Eu sou aquela fora da grade,
que não troca a alma por vaidade.
E mesmo sem ser aceita em seus altares,
sei que há beleza em ser quem não se disfarça,
mesmo que doa, mesmo que canse.
Pois não há nada mais santo
do que amar sem condições,
do que ouvir sem julgar,
do que viver sem precisar se moldar.
Bolhas Sagradas
Eles dizem que seguem a luz, mas esquecem de olhar nos olhos de quem está na sombra.
Vivem debaixo de um teto que chamam de fé, mas que mais parece um muro alto, cheio de espinhos — onde só entra quem fala igual, se veste igual, acredita igual.
E eu? Eu fico do lado de fora. Porque não repito seus refrões, não me prostro diante de suas certezas engessadas, não aceito um céu vendido por parcelas de culpa.
Nas reuniões de família, os olhares não são apenas julgadores, são quase inquisidores.
Se eu falo de silêncio, de arte, de dúvida, de filosofia… vem o riso velado, o deboche disfarçado de piedade.
“É fase”, dizem uns.
“Falta Deus”, dizem outros.
Mas ninguém se pergunta onde estava o amor que tanto pregam quando me deixaram sozinha com minhas perguntas.
Eles escolheram os seus. Os que se encaixam, os que seguem a cartilha.
Um evangelho de fariseus, onde a salvação virou senha de grupo e o perdão é privilégio de quem pensa igual.
E se inflamam... oh, como se inflamam! Na bolha do sistema, alimentam-se uns dos outros, confirmando certezas enquanto se afastam da compaixão.
Chamam isso de fé, mas soa mais como exclusão sagrada.
Falam de Cristo, mas caminham como Caifás.
E eu, do lado de cá, não deixo de crer.
Mas minha fé é outra: é aquela que ouve o silêncio, que acolhe a dúvida, que abraça o diferente.
Minha fé não me manda apontar dedos, mas estender mãos.
E talvez, um dia, eles entendam: que ser verdadeiro dói mais do que ser aceito, mas liberta.
Porque não existe santidade alguma em isolar o outro.
E a verdade que liberta nunca viveu trancada em bolhas de arrogância.
"Prisão Silenciosa"
Estou aprisionada, mas não por grades visíveis, e sim por paredes invisíveis que se erguem dentro de mim. Cada pensamento é um grito abafado, cada palavra, uma tentativa frustrada de escapar, de ser ouvida. Dentro de mim, há um mundo inteiro, um universo de sentimentos, ideias e reflexões que ninguém vê. Eles estão presos em mim, e eu estou presa neles.
Quero gritar, quero falar tudo o que tenho guardado, mas a voz se esvai antes que eu consiga libertá-la. As palavras se perdem no ar, como se houvesse uma barreira invisível que as impede de atravessar. Ninguém escuta. Ninguém se importa. Cada frase que quero dizer se transforma em silêncio, uma prisão mental onde sou a única prisioneira.
Eu observo o mundo, mas estou distante dele. Vejo pessoas falando, vivendo, e sinto que há algo em mim que não se encaixa. Não sou uma parte desse mundo, mas também não consigo me libertar dele. Tento conversar, tento me conectar, mas as palavras que me escapam são vazias, não transmitem o que verdadeiramente sinto. O que quero dizer nunca chega a ser dito. O que quero expressar fica preso, aprisionado, como se fosse uma chama que arde sem nunca poder se manifestar em fogo.
E então, escrevo. Escrevo porque, talvez, ali esteja a única fuga possível. Cada frase que nasce de minha mente é um pequeno grito silencioso que não posso mais engolir. Cada palavra que se forma no papel é uma tentativa de libertação, um lampejo de algo que não posso mais reter. E, no entanto, ao escrever, me pergunto: quem lerá? Quem ouvirá essas palavras soltas, esses fragmentos de mim que coloco no papel, mas que ainda parecem tão distantes? Será que alguém se importa? Será que alguém vai perceber que ali está o único grito que ainda posso fazer?
É doloroso, essa sensação de estar invisível, de viver presa numa prisão mental onde a liberdade é apenas uma ilusão. Mas as palavras, essas que escrevo, são minha única forma de existir plenamente. Talvez ninguém leia, talvez ninguém entenda, mas, ainda assim, escrevo. Pois, se pelo menos eu mesma me ouvir, talvez isso seja o suficiente para me manter viva dentro de mim.
E assim sigo, entre as sombras da minha mente, tentando dar forma ao que não posso falar. Cada frase é uma liberdade temporária, um pequeno espaço onde a minha voz se faz ouvir, mesmo que, no final, ninguém escute.
"Silêncio e Ser"
Em cada palavra, um vazio, Que se preenche com o eco da dúvida. Na página em branco, o grito do ser, Que não se vê, mas se sente, se antecipa.
Serás? Pergunto, e me perco, Entre o que sou e o que ainda serei. E cada silência sussurra mais alto, Do que as palavras jamais ousaram dizer.
Caminho em sombras e luzes tênues, Como quem busca a verdade na escuridão. Mas a verdade, ah, ela é escorregadia, Reflexo de um espelho quebrado, fragmentado.
E, assim, escrevo. Sem certezas, sem fim, Como quem mergulha em águas turvas, Onde o que se encontra não é resposta, Mas o respirar da alma que busca se encontrar.
Serás, talvez, um som perdido, Ou o silenciar do mundo que se escuta. E no vazio da palavra, o ser, Ainda é mais do que pode ser dito.
O maior dilema da vida é descobrir quem somos de verdade… sem nos perder tentando ser o que o mundo espera.
“‘Manda quem pode, obedece quem tem juízo"— talvez o juízo verdadeiro esteja em quem ousa questionar.
O que você diria que é seu bem mais precioso? Para mim, é afamília. Nada no mundo tem mais valor do que os abraços que me mantêm de pé.
Penso logo reflito, reflito logo respondo, respondo logo encontro, encontro logo perco, perco logo procuro, procuro logo reflito.
Looping.....
Uma sabia uma vez me disse que a sua alegria é a tristeza de muitos ela só não falou que essas pessoas eram "amigos" e familiares.
"Eu, em pedaços que ninguém entende"
não há inteiro em mim.
sou feita de partes que não se falam,
de pensamentos que dormem antes de nascer.
há fé, sim —
mas ela vive num canto escuro
e às vezes esquece o próprio nome.
às vezes eu falo com Deus,
ou com o silêncio,
ou com ninguém.
quem responde, nunca sei.
não quero sentido.
quero só continuar sendo,
mesmo quando ser
me pesa mais que viver.
sou poema que se nega a rimar,
sou lágrima sem nome no meio da tarde.
se me entenderes,
me perderei.
me guarde como se guarda o vento:
sem tentar fechar a mão.
Sou boa em muitas coisas, mas nunca o suficiente para ser lembrada por nenhuma. E talvez, no fundo, isso seja o que mais dói.