Coleção pessoal de heldicemachado

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PSICANÁLISE, MENSAGENS E DINÂMICAS

A Análise quer fazer surgir uma mensagem. Qual seria? Existem três tipos de mensagens que uma pessoa pode nos transmitir. A primeira consiste na projeção que fazemos dela. Refere-se a impressão inicial que alguém nos remete enquanto pessoa. Não a conhecemos, contudo realizamos uma construção de sua imagem pautada em nossas referências psíquicas. A segunda consiste na projeção que fazemos dela, sendo esta confirmada ou não pelo objeto em questão. Aqui o objeto (pessoa) de nossa projeção pode ou não confirmar a imagem que foi tecida psiquicamente por nós a ela. A terceira, a que o Analista procura fazer surgir na Análise, é a projeção vinda do inconsciente que ela faz de si própria sem a nossa projeção consciente. É a sua mensagem mais íntima. A mensagem que sempre transmitiu por seus sintomas. Nesse sentido, cabe ao Analista identificar, inicialmente, qual a dinâmica pela qual o paciente se apresenta na sessão.
Vou dá um exemplo de duas dinâmicas que podem se apresentar em uma sessão. Uma delas pode ser aquele que fala sem falar. E o outro é aquele que fala pela escuta. A primeira delas é aquela pessoa que possui uma tonalidade com as palavras. Basta que escutemos que a fala emana sem muitas dificuldades. Porém está fala é uma fala que nada e ao mesmo tempo tudo fala do sujeito. É uma fala que precisa ser decodificada. Uma fala que tem como função calar o estranho residente de si mesmo, ao mesmo tempo que é a única forma que tem de comunicar esse estranho. É uma fala que emudece o inconsciente. Porém é por meio dessa fala que nada fala que o sujeito grita. Ou seja, é uma fala que têm dois sentidos. Cabe a nós compreendermos essa dinâmica no decorrer da história que se dará nas sessões. A segunda dinâmica é a fala pela escuta. São os pacientes que se colocam na posição de escutadores do outro. Escutadores do outro para não deixar a fala surgir e fluir em si. Podemos dizer que é uma forma de defesa. Ou uma forma de dizer o quanto precisa dessa escuta que oferece ao outro. É o paciente que produz um silêncio ao Analista. Um paciente que prefere escutar ao ser escutado. Há nele um sigilo que precisa ser vencido. Como? Ao Analista requer mostrar o seu lugar de Analista, aquele que não está ali para medir ou competir com o paciente quem escuta mais quem, afinal em uma Análise não existe dois Analisandos ou dois Analistas. Neste sentido, cabe ao Analista investigar via escuta ativa quais foram os fatores que fizeram esse paciente escolher a escuta como meio de calar e ao mesmo tempo falar de si por essa escuta. O que a escuta procura esconder? O que a escuta quer falar? Em que momentos essa escuta acontece? Já houve momentos em que a escuta não apareceu? Quais foram esses momentos? Como foram esses momentos? Com quem? Como foram essas situações em que havia fala e não escuta? O que é sentido quando há fala e não escuta? Enfim, são algumas questões que poderiam ser implementadas, evidentemente de uma perspectiva hipotética. Todavia cada caso é um caso. Cada história é uma história. Cada dinâmica é uma dinâmica. E, claro, cada Análise é uma Análise. A nós, Analistas, faz-se sempre imprescindível conhecer e nos reconhecer em nosso lugar de Analistas do Inconsciente. Para fechar, deixo com vocês esse poema:

DOR EM ANÁLISE
A DOR tem várias facetas
Tem aquele arDOR
Que não sabemos de onde vem
Porém pode ser encantaDOR
E também sofreDOR
Esse não saber o que se tem
É assustaDOR
O que pode acontecer
Quando existe o escutaDOR
Para ajudar a compreender
É como um cuidaDOR
Que se faz ausente, presente e continente.
Fazendo papel de caçaDOR
Nesse todo Inconsciente.

AMOR PELO AMOR (ENSAIOS DE AFETOS, PARTE III)
Amar é tornar e tornar-se pelo, para e com o amor. O amor é o ato de criar e criar-se. Torno-me aquilo que amo e amo aquilo que me torno. Se meu amor ama a eternidade, fará-se eterno. E eu o amarei por isso. Se meu amor ama a paciência, fará-se paciente. E eu o amarei por isso. Se meu amor ama a coragem, fará-se corajoso. E eu o amarei por isso. Se meu amor ama, amor simplesmente sempre será. Certamente o amor de que falo aqui é um amor que transcende eu, funda-se em mim e para além de mim. Define-se por mim como indefinivelmente incapturável em sua plenitude pelas mágicas artes das palavras. E esse amor que ama não se pretende egoísta, jamais! Esse amor que ama valoriza a liberdade na sua mais magnanimidade de ação. Esse amor funda-se no mais puro respeito que existe. Esse amor que ama valoriza mais que tudo a nossa capacidade de escolher. Escolher o quê? Escolher acreditar ou não acreditar nesse amor. Escolher ser ou não ser esse amor. Escolher se permitir amar ou não se permitir amar esse amor. Escolher amar ou não amar. Você é totalmente livre para escolher. Escolher permanecer mesmo sem mais motivos que possam dizer o que porque ficar. Por quê? Porque esse amor se justifica por si mesmo. Esse amor funda-se por si mesmo e por si mesmo se basta. Ele é daqueles que transcende a razão e o corpo. Ele se faz assim, sempre se fez. Acredito que esse amor seja o maior milagre da existência entre humanos. Não é um amor objetivo e nem subjetivo. Seria intersubjetivo? Também não. Seria “trans-subjetivo!”. Todos deveriam ter a oportunidade de senti-lo, nem que fosse por um breve milésimo instante. Na verdade ele se realiza em um instante. Ao mesmo tempo em que ele é tempo ele supera o tempo. Ao mesmo tempo em que ele é espaço, está para além dele. Acredito que esse amor tenha surgido da nossa condição de seres miseráveis. Como assim miseráveis? De não sabermos por que estamos aqui. De não sabermos por que existe algo ao invés do nada, se é que não é nada mesmo que existe no fim das contas. De não sabermos para onde vamos. De não sabermos se existe sentido para tudo isso depois dessa vida. Se existe ou não outra vida. Então esse amor nos ensinou a olhar para esse outro de uma forma a dizer: Sei que somos miseráveis, sei que você sabe também que não sabemos muita coisa sobre nós e não sei se algum dia vamos saber, mas diante disto eu escolho na minha mais plena liberdade procurar saber se existe algum saber diante dessa constante pergunta chamada existência. E por quê? Porque só poderia saber que não sei porque existe um outro para quem posso dizer que não sei, mesmo sabendo que este outro também não sabe aquilo que quero saber. E nem precisa saber. E diante dessa miséria, esse amor o torna completo. Talvez esse amor seja o único capaz de superar a morte. A morte que procura arrancar todos os sonhos de uma forma avassaladora. Suspeito que esse amor venha daí, mas é apenas uma hipótese.

Ah! Sexualidade
O que falar de ti?
És polimorfa
Polissêmica
Policromada
Politizada?
Quantos polos tu tens?

Ah! Sexualidade.
Que vai para além dos genes
Seja XX, XY
Ou XXY
Ela se expressa
Na pressa do prazer
Ou na lentidão que se preze
O que ela quer?
Quer!
Quer ser imperiosa
Busca signos, símbolos, imagens, sons
Busca corpos, cores, odores
Amores....

Ah! Sexualidade
Tu tens medida?
Qual é o teu ponto de partida?
Tu és um alarido de fluxos
Cheias de teias e veias que aludem
A vitalidade da vida


Ah! Sexualidade
O que tu queres?
Quero explodir!
Para poder ir
E por que não vais?
Porque me sinto acorrentada
Amordaçada pelas amarras arrumadas
Que me arruínam a performance

Ah! Sexualidade
O que tu sentes?
Sinto pathos
Dos atos que não posso ser
Dos saltos que não posso dar
Será que eles não entendem que eu só quero amar?

Ah! Sexualidade
Por que sofres tanto?
Meu corpo pulsa de dor
Por que não entender o mal que sou.
E será que ès toda ruim?
Não será você a mais bela de todas as formas?
Por não se enformar nas normas alheias?

Ah! Sexualidade
Grite! Até a voz sumir
Corra! Até as pernas doerem
Cale! Até o som surgir
Chore! Até não haver mais lágrimas
Desespere-se! Até a esperança voltar
Viva! Até onde você conseguir

Ah! Sexualidade
O que percebes?
Que posso ser tudo!
Que posso ser nada!
Descobri que que me redescubro
E que não preciso me cobrir do que não sou
Porque nada sobra das dobras que não dou

Ah! Sexualidade
E se não conseguires?
O quê?
Aflorar no ensejo do desejo
No fugaz perene lampejo
O teu entusiasmo
Então só me resta ir embora
Nada longo
Sem demora
Para onde o ar não existe
Na qual a luz se apagou
Onde as trevas se impõem
Na inexistência do amor
Prefiro entrever
Nesse estreito caminho
O pathos final
O ponto letal
O encontro fatal
Com a morte, afinal.