Coleção pessoal de AmandaBukowski

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Esperamos e esperamos. Todos nós. Não saberia o analista que a espera é uma das coisas que faziam as pessoas ficarem loucas? Esperavam para viver, esperavam para morrer. Esperavam para comprar papel higiênico. Esperavam na fila para pegar dinheiro. E, se não tinham dinheiro, precisavam esperar em filas mais longas. A gente tinha de esperar para dormir e esperar para acordar. Tinha de esperar para se casar e para se divorciar. Esperar para comer e esperar para comer de novo. A gente tinha de esperar na sala de espera do analista com um monte de doidos, e começava a pensar se não estava doido também.

Mulheres: gostava das cores de suas roupas; do jeito delas andarem; da crueldade de certas caras. Vez por outra, via um rosto de beleza quase pura, total e completamente feminina. Elas levavam vantagem sobre a gente: planejavam melhor as coisas, eram mais organizadas. Enquanto os homens viam futebol, tomavam cerveja ou jogavam boliche, elas, as mulheres, pensavam na gente, concentradas, estudiosas, decididas: a nos aceitar, a nos descartar, a nos trocar, a nos matar ou simplesmente a nos abandonar. No fim das contas, pouco importava; seja lá o que decidissem, a gente acabava mesmo na solidão e na loucura.

A verdade é que somos umas monstruosidades. Se pudéssemos nos ver de verdade, saberíamos como somos ridículos com nossos intestinos retorcidos pelos quais deslizam lentamente as fezes... enquanto nos olhamos nos olhos e dizemos: 'Te amo'. Fazemos e produzimos uma porção de porcarias, mas não peidamos perto de uma pessoa. Tudo tem um fio cômico.

A ganância humana não dá tréguas e desconhece limites. A sociedade americana considera o dinheiro um assunto muito mais sério que a própria morte, o que torna dificílimo conseguir alguma coisa a troco de nada. Não se ganha nada de graça neste mundo. Os comunistas que se danem. Na América quando surge algo bom, os ricos metem a mão e tiram de circulação até estragar ou mudar e só então deixam a gente tira uma casquinha. Mas aqui estou eu, malhando e pichando a América por ter corrido comigo. Um lugar onde sempre procuraram acabar com meu couro, cavar minha sepultura.

O enterro de meu pai. Lembro que atravessamos a rua e entramos na casa mortuária. Alguém dizia que meu pai tinha sido um bom homem. Me deu vontade de contar a eles o outro lado. Que ele era um homem ignorante. Cruel. Patriótico. Com fome de dinheiro. Mentiroso. Covarde. Um impostor. Minha mãe só estava há um mês debaixo do chão e ele já estava chupando os peitos e dividindo o papel higiênico com outra mulher. Depois alguém cantou. Nós desfilamos diante do caixão. Talvez eu cuspa nele, pensei.

Nunca fui elegante. Minhas camisas eram todas desbotadas, encolhidas, surradas, e já tinham cinco ou seis anos. Minhas calças, a mesma coisa. Detestava as grandes lojas, detestava os vendedores, eles se faziam de superiores, pareciam conhecer o sentido da vida, tinham uma segurança que me faltava. Meus sapatos eram sempre velhos e estropiados, e eu detestava lojas de sapatos também. Nunca comprava nada de novo, a menos que as minhas coisas já estivessem completamente inutilizadas - automóveis inclusive. Não era questão de economia; é que eu não era tolerava ser um comprador na dependência dos vendedores, aqueles caras tão altivos e superiores. Além disso, eu perdia tempo, um tempo em que eu podia muito bem estar de papo pro ar, bebendo.

Outro dia, fiquei pensando no mundo sem mim.
Há o mundo continuando a fazer o que faz.
E eu não estou lá. Muito estranho. Penso
no caminhão do lixo passando e levando o lixo
e eu não estou lá. Ou o jornal jogado no jardim
e eu não estou lá para pegá-lo. Impossível.
E pior, algum tempo depois de estar morto, vou ser
verdadeiramente descoberto. E todos aqueles
que tinham medo de mim ou me odiavam
vão subitamente me aceitar. Minhas palavras
vão estar em todos os lugares. Vão se formar
clubes e sociedades. Será nojento.
Será feito um filme sobre a minha vida.
Me farão muito mais corajoso e talentoso do que
sou. Muito mais. Será suficiente para fazer
os deuses vomitarem. A raça humana exagera
em tudo: seus heróis, seus inimigos, sua importância.

Fiquei pensando como eram difíceis as separações. Mas, era só mesmo rompendo com uma mulher que se podia encontrar outra. Eu precisava degustar as mulheres pra conhecê-las bem, pra entrar no âmago delas. Homem nenhum precisava de mulher pra se sentir real de verdade, mas era bem legal conhecer algumas. Daí, quando o caso ia mal, o sujeito conhecia pra valer o que era a solidão e a loucura, e assim ficava sabendo o que o esperava quando seu próprio fim chegasse...

Revolução soa muito romântico, vocês sabem, mas não é. É sangue, culhão e loucura; é menininhos mortos que ficam no caminho, menininhos que não entendem porra nenhuma do que está acontecendo. É a sua puta, a sua mulher rasgada na barriga por uma baioneta e depois estuprada no cú enquanto você olha. É homens torturando homens que costumavam rir com as historinhas do Mickey Mouse . Antes de você entrar nesta coisa, decida onde está seu espírito e onde ele estará quando a coisa tiver terminado. Eu não acredito que nenhum homem tem o direito de tirar a vida de outro homem. Mas talvez mereça um pouco de reflexão antes. É claro, a porra é que eles têm tirado as nossas vidas sem disparar um tiro.

Há bastante deslealdade, ódio, violência, absurdo no ser humano comum para suprir qualquer exército em qualquer dia. E o melhor no assassinato são aqueles que pregam contra ele. E o melhor no ódio são aqueles que pregam amor, e o melhor na guerra, são aqueles que pregam a paz. Aqueles que pregam Deus precisam de Deus, aqueles que pregam paz não têm paz, aqueles que pregam amor não têm amor. Cuidado com os pregadores, cuidado com os sabedores. Cuidado com aqueles que estão sempre lendo livros. Cuidado com aqueles que detestam pobreza ou que são orgulhosos dela. Cuidado com aqueles que elogiam fácil, porque eles precisam de elogios de volta. Cuidado com aqueles que censuram fácil, eles têm medo daquilo que não conhecem. Cuidado com aqueles que procuram constantes multidões, eles não são nada sozinhos. Cuidado com o homem comum, com a mulher comum, cuidado com o amor deles. O amor deles é comum, procura o comum, mas há genialidade em seu ódio, há bastante genialidade em seu ódio para matar você, para matar qualquer um. Sem esperar solidão, sem entender solidão eles tentarão destruir qualquer coisa que seja diferente deles mesmos.

Acho que estou acostumado a me sentar num quartinho e fazer com que as palavras tenham algum sentido. Já vejo o suficiente da humanidade nos hipódromos, nos supermercados, nos postos de gasolina, nas estradas, nos cafés etc. Não se pode evitar. Mas tenho vontade de me dar um chute na bunda quando vou a festas, mesmo que a bebida seja de graça. Nunca funciona comigo. Já tenho argila suficiente para brincar. As pessoas me esvaziam. Preciso sair para me reabastecer. Sou o que é melhor para mim, sentado aqui atirado, fumando um baseadinho e vendo as palavras brilharem na tela. Raramente encontro uma pessoa rara ou interessante. É mais que pertubador, é um choque constante. Está me tornando um maldito mal-humorado. Qualquer um pode ser um maldito mal-humorado, e a maioria é.

O mundo inteiro é um saco de merdas se rasgando. Não posso salvá-lo. Sei que nos movemos em direção à miragem, nossas vidas são desperdiçadas, como as de todo mundo. Eu sei que nove décimos de mim já morreram, mas eu guardo o décimo restante como uma arma.

A carne cobre os ossos e colocam uma mente ali dentro e algumas vezes uma alma.
E as mulheres quebram vasos contra as paredes e os homens bebem demais e ninguém encontra o par ideal mas seguem na procura rastejando para dentro e para fora dos leitos.
A carne cobre os ossos e a carne busca muito mais do que mera carne.
De fato, não há qualquer chance: estamos todos presos a um destino singular. Ninguém nunca encontra o par ideal.
As lixeiras da cidade se completam, os ferros-velhos se completam, os hospícios se completam, as sepulturas se completam, nada mais se completa.

Não consigo deixar de pensar nos tempos em quartos solitários, quando as únicas pessoas que batiam à minha porta eram as senhorias cobrando o aluguel atrasado ou o FBI. Vivia com ratos e camundongos e vinho, meu sangue escorria pelas paredes em um mundo que não conseguia compreender e ainda não compreendo. Em vez de levar a vida que eles levavam, eu passava fome. Fugia para dentro de minha própria mente e me escondia. Fechava todas as cortinas e ficava olhando para o teto. Quando saía, era para ir a um bar onde eu mendigava por bebida, andava a esmo, apanhava nos becos de homens bem alimentados e confiantes, de homens idiotas e com vidas confortáveis. Bem, ganhei algumas lutas, mas só porque era louco. Fiquei anos sem mulher, vivia de manteiga de amendoim e pão amanhecido e batatas cozidas. Eu era o idiota, o estúpido, o louco. Queria escrever, mas a máquina de escrever estava sempre penhorada. Então eu desistia e bebia...

Sim, eu odiava ter que me levantar da cama de manhã. Significava que a vida ia recomeçar e depois de se passar a noite inteira a dormir cria-se uma espécie de intimidade especial que fica muito mais dificíl de largar. Sempre fui solitário. Desculpe-me, creio que não regulo bem da cabeça, mas a verdade é que, se não fosse por uma ou outra fodidela, não me faria a mínima diferença se todas as pessoas do mundo morressem. Eu sei que não é uma atitude simpática. Mas ficaria todo refestelado aqui dentro do meu caracol. Afinal de contas, foram as pessoas que me tornaram infeliz.

Não é morrer que é ruim, é estar perdido que é ruim.

Várias vezes pensei em desistir e morrer. Encontrei uma lata vemelha e verde, linda. "PERIGO", dizia na lata, "prejudicial ou fatal se ingerida". Eu era um covarde: pus a lata de volta no lugar.

Eu gostava do lugar, tinha grandes árvores que davam sombra, e desde que algumas pessoas haviam me dito que eu era feio, sempre preferia a sombra ao sol, a escuridão à luz.

Tudo o que era mau atraía-me: gostava de beber, era preguiçoso, não defendia nenhum deus, nenhuma opinião política, nenhuma ideia, nenhum ideal. Eu estava instalado no vazio, na inexistência, e aceitava isso. Tudo isso fazia de mim uma pessoa desinteressante. Mas eu não queria ser interessante, era muito difícil.

Observava as pessoas à distância, como numa peça de teatro. Apenas eles estavam no palco e eu era plateia de um homem só.