Cris Alckimim
Nós somos aquela geração que não vai voltar.
Crescemos com sapatos cheios de pó, joelhos raspados e coração apressado.
não para olhar para uma tela,
mas para terminar o lanche e sair correndo para a rua — onde a única coisa importante era uma bola e alguns amigos.
Nós éramos os que voltávamos da escola a pé.
falando alto ou sonhando em silêncio,
com a mente já no próximo jogo, na próxima aventura,
entre um buraco na areia e um segredo sussurrado atrás de um canto.
Um pau podia ser uma espada.
uma poça virava um mar para conquistar.
Nossos tesouros eram berlindes, cromos, barquinhos de papel.
E o céu, nosso único limite.
Não tínhamos backups, apenas memórias na mente e nos rolos fotográficos.
As fotos eram tocadas, cheiradas, guardadas em gavetas —
junto a cartas escritas à mão,
postais dos avós,
e desenhos coloridos que os pais guardavam como jóias.
Nós chamávamos de "mãe" a quem curava nossas febres.
e "pai" que nos ensinou a andar de bicicleta.
Não era preciso mais.
À noite, sob os cobertores,
conversamos baixinho com o irmão na cama ao lado,
rindo por besteira,
com medo que algum adulto ouvisse e desligue esse pequeno mundo de cumplicidade.
Essa geração está indo, pouco a pouco,
como uma fotografia que perde a cor,
mas ninguém quer jogar fora.
Nós nos afastamos silenciosamente, levando uma mala invisível:
o eco do riso na rua,
o cheiro de pão acabado de fazer,
corridas sem sentido
e aquela liberdade que eu não conhecia notificações.
Nós éramos crianças quando ainda se podia ser.
E talvez essa seja a nossa maior fortuna.